The Weeknd quebra paradigmas em show no Super Bowl
A riqueza pirotécnica parecia justificar os US$ 7 milhões que The Weeknd alardeia ter desembolsado para produzir a apresentação
Foi uma performance histórica, digna de deixar os organizadores do Grammy mais do que envergonhados por terem esnobado The Weeknd na premiação deste ano.
Atração do tradicional intervalo do Super Bowl, a final de futebol americano, o músico canadense levou para o estádio em Tampa, na Flórida, um espetáculo pirotécnico contagiante, digno da qualidade de seu mais recente trabalho de estúdio, o soturno disco "After Hours", lançado no ano passado.
Ao longo de pouco mais de dez minutos, Abel Tesfaye, nome de batismo do cantor de 30 anos, despejou um pot-pourri de suas músicas mais famosas e letras carregadas de referências a noitadas entorpecidas e som de pegada retrô. Teve labirinto de luzes, um coro entre o robótico e o fantasmagórico na arquibancada e um final catártico, com dezenas de dançarinos de rostos enfaixados no meio do campo.
A apresentação, que ocorreu na noite deste domingo (7), estava cercada de mistérios e doses de ineditismo. Por causa do isolamento social, o estádio em que ocorreu o show estava parcialmente ocupado. E já se sabia que The Weeknd não se apresentaria num palco no meio do campo, como é tradicional.
Mas a principal dúvida recaía em torno do tom da apresentação. Maior audiência da televisão americana, o Super Bowl costuma abrigar atrações musicais mais palatáveis à toda família –que o diga o rebuliço que foi quando, em 2004, Justin Timberlake acabou expondo um dos seios de Janet Jackson ao vivo.
The Weeknd não é assim um músico tão família. A letra de seu maior sucesso comercial, "Can't Feel My Face", é sobre um sujeito que diz sentir o rosto anestesiado toda vez que consome cocaína mas que, ainda assim, ama cheirar. Já o disco "After Hours" é uma longa jornada até os confins da noite sob efeito de uma ressaca, que não se sabe se é alcoólica, amorosa ou moral.
Tesfay aportou em Tampa entoando "Starboy", um de seus grandes hits, pinçado do disco homônimo, de 2016. Vestia o indefectível paletó vermelho sobre trajes negros, marca visual de seu "After Hours". Atrás do cantor, o tal coro robótico-fantasmagórico. Em seguida, emendou "The Hills", uma de suas muitas letras sobre o lado B da fama.
"Cant' Feel My Face", a ode cocainômana, foi cantada num estreito labirinto de luzes montado em algum lugar embaixo das arquibancadas. Ali, The Weeknd era atropelado pelos dançarinos que o acompanhariam nos números seguintes, todos eles trajando roupas parecidas com a do cantor e bandagens na cara.
Já de volta ao coro, o canadense entoou "Save Your Tears", um dos carros-chefe desse seu disco mais recente, melancólica balada sobre lágrimas retidas e alguém que vê a pessoa amada se divertindo sem o ex, ainda apegado.
No campo de futebol, sob o céu tomado por fogos de artifício, o cantor ia preparando o terreno para a apoteose que viria com "Blinding Lights", o grande hit de "After Hours". A letra da canção fala de luzes ofuscantes, única companhia de um sonâmbulo que caminha por uma "cidade de pecado", incapaz de dormir sem ter a pessoa que ama.
As tais luzes vieram reproduzidas nas mãos das dezenas de bailarinos reproduzindo uma coreografia caótica, sob os sintetizadores oitentistas da música, no meio do campo –simulacro da multidão que nós todos, quarentenados, tanto ansiamos ver de volta.
A riqueza pirotécnica parecia justificar os US$ 7 milhões que The Weeknd alardeia ter desembolsado para produzir o show.
Antes que a partida tivesse início, o hino americano ficou a cargo do cantor country Eric Church e da cantora de R&B Jazmine Sullivan –um representante da América branca e outra da América negra, num provável recado de união diante de um país que iniciou 2021 esfacelado sob o rescaldo dos anos Trump.
E Amanda Gorman, a poeta de 22 anos que roubou holofotes na posse de Joe Biden, leu um outro poema, "Chorus of the Captains", em homenagem a nomes do cotidiano, como enfermeiros da linha de frente de combate à Covid, que tiveram "impacto numa era de incerteza e necessidade". Os livros dessa jovem autora californiana, aliás, devem sair no Brasil em setembro, pela editora Intrínseca, segundo antecipado pelo jornal O Globo.