Aviação

Boeing 777: a "fadiga do metal", uma lei física que pode causar acidentes

Boeing 777 da United Airlines - Daniel Slim/AFP

As autoridades americanas consideram a pista da "fadiga do metal" das pás do motor como elemento para elucidar as causas do incidente de sábado (20) em um voo da United Airlines, que provocou a imobilização parcial da frota mundial dos Boeing 777.   

Quando um material é usado com frequência, esse fenômeno físico pode fazer com que ele se deforme e, posteriormente, seja danificado. 

Falhas em aviões ou trens causadas pela "fadiga do metal" podem ser explicadas por um "defeito de fabricação" ou por um "problema de manutenção", mas sem excluir uma "parte de azar", afirmam os especialistas à AFP. 

Como no caso de um pequeno 'clipe' de metal de escritório, que é mais facilmente quebrado girando-o de forma cíclica e frequente em vez de puxá-lo "com muita força", de acordo com esse mesmo princípio, os materiais que compõem os motores "cansam" e podem quebrar, explica François Hild, diretor de pesquisa em mecânica dos materiais do francês CNRS (Centro Nacional de Pesquisa Científica). 

Nos aviões, as pás das turbinas utilizadas para acelerar a entrada de ar no reator - várias das quais quebraram causando um incêndio em um motor do Boeing 777 - realizam ciclos de movimentos semelhantes: "quando o motor está funcionando, ele sacode, e quando para, se solta", observa Pascal Roche, professor de Propulsão da Escola Nacional de Aviação Civil de Toulouse (ENAC). 

"Ao repetir isso dezenas, centenas ou mesmo milhares de vezes, o material pode quebrar", acrescenta Hild. 

Após outro incidente semelhante no início de 2018, envolvendo este mesmo modelo de motor Pratt & Withney, que usa parte dos Boeing 777, a agência reguladora de aviação americana, a FAA, informou na época que havia solicitado "inspeções iniciais e depois frequentes a cada 6.500" decolagens. 

Também um possível "problema de manutenção" de peças que "não teriam sido alteradas com antecedência" é uma hipótese a ser considerada, alerta Pascal Roche.

Defeito de fabricação 
Precisamente, um defeito de manutenção estava no centro da investigação da pior catástrofe ferroviária depois da Segunda Guerra Mundial na Alemanha.

Em junho de 1998, um acidente de trem de alta velocidade causou 101 mortes em Eschede. A companhia ferroviária nacional alemã não havia substituído uma roda desgastada, cuja falha por causa da fadiga do metal fez com que um vagão descarrilasse. 

Mas a "fadiga do metal" nas lâminas de titânio também pode resultar de um "defeito de fabricação", sugere François Hild. 

"O titânio, por exemplo, é um metal que resiste muito bem à fadiga", mas "um defeito de fabricação, alguma impureza ou uma simples bolha de ar, faz com que as peças sejam mais sensíveis a esse fenômeno", explica. 

Um Airbus A380 sofreu um acidente semelhante em 2017, depois de perder uma parte significativa de um de seus quatro reatores voando sobre a Groenlândia. 

O Bureau Francês de Pesquisa e Análise (BEA) finalmente determinou que a explosão do motor foi causada por uma microfissura resultante da fadiga prematura de uma liga de titânio. 

A causa foi um defeito de fabricação durante o forjamento da peça. 

"Essa liga já era usada desde os anos 1970, havia um elemento de azar", explicou na época um especialista.