Coronavirus

Estudos mostram que desigualdade social e Bolsonaro agravaram pandemia no Brasil

As vulnerabilidades socioeconômicas no país e a má condução do Governo Federal durante a pandemia foram destaques de estudo publicado pelas revistas científica The Lancet e Science

Presidente da República Jair Bolsonaro - Marcos Corrêa/PR

Estudo publicado pela revista científica The Lancet afirma que a propagação das infecções e mortes por Covid-19 no Brasil foi primordialmente afetada pela combinação das vulnerabilidades socioeconômicas no país e a resposta errática do governo Jair Bolsonaro (sem partido) à crise.

Outro trabalho científico, da Science, reforça a responsabilidade de Bolsonaro na má condução da pandemia.

"No Brasil, a resposta federal tem sido uma combinação perigosa de inação e irregularidades, incluindo a promoção da cloroquina como tratamento, apesar da falta de evidências", diz a Science.

Segundo a The Lancet, no entanto, o contra-ataque dos governos estaduais contrários às políticas de Bolsonaro foi fundamental para mitigar os efeitos de seu negacionismo e incompetência.

Segundo o trabalho, apesar da "ausência de coordenação geral no Poder Executivo", os estados mais vulneráveis no início da pandemia conseguiram, com o tempo, expandir a capacidade hospitalar e, ao confrontarem o governo Bolsonaro, diminuir a taxa de mortalidade.

Isso foi possível graças à decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), em abril de 2020, de proibir a interferência de Bolsonaro na gestão da crise pelos estados e municípios.

Assim, segundo a The Lancet, "o distanciamento físico permaneceu relativamente maior nos lugares mais vulneráveis". O efeito das medidas restritivas foi crucial, por exemplo, no Nordeste.

Embora com elevada vulnerabilidade socioeconômica e, proporcionalmente, com menos leitos de UTI, muitos estados da região registraram taxa de mortalidade compatível com o Sudeste –mais rico, menos desigual e com mais leitos hospitalares (ver quadro).

Alguns dos estados mais populosos do Nordeste, como Bahia, Ceará, Pernambuco e Maranhão, são governados por políticos de oposição a Bolsonaro, como PT, PSB e PC do B.

Segundo uma das autoras do estudo da The Lancet, a pesquisadora Marcia Castro, da faculdade de Saúde Pública da Universidade Harvard, a vulnerabilidade socioeconômica dos brasileiros foi o fator que apresentou, inicialmente, maior relação com o número de mortes -fato depois mitigado pelo aumento dos leitos e das medidas restritivas de alguns estados.

Isso ocorre sobretudo porque nas regiões mais pobres há prevalência de trabalhadores informais, que não tiveram condições de ficar em casa durante boa parte da pandemia.

Segundo dados da Pnad Covid-19 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, enquanto 28% dos ocupados do país pertencentes à classe A/B puderam mudar o local de trabalho na pandemia, o total não chega a 8% nas classes D e E.

Uma diferença enorme foi encontrada também entre os que têm ensino superior (34% mudaram o local de trabalho) e aqueles que terminaram só o fundamental (6,6%).

Neste cenário, a atuação direta dos governos regionais, com ampliação da capacidade de atendimento e medidas de isolamento, foi fundamental para mitigar o alcance da pandemia e a má gestão do governo Bolsonaro na pandemia.

O estudo da The Lancet destaca vários problemas na gestão Bolsonaro: 1) mudanças na liderança da saúde que geraram instabilidade administrativa; 2) capacidade técnica do Ministério da Saúde aquém do ideal, com apenas 23,1% dos fundos de emergência de R$ 44,2 bilhões autorizados em fevereiro e março gastos até outubro de 2020; 3) o fato de Bolsonaro ter minimizado a gravidade do vírus e estimulado a circulação de pessoas sem máscaras.

Além desse tipo de crítica a Bolsonaro, o outro estudo da Science destaca a "baixa capacidade de testagem" do Brasil na pandemia.

Segundo dados da Pnad Covid-19, até o final do ano passado o Brasil havia testado apenas 13,6% da população C-o que limitou muito a capacidade de identificar e rastrear focos de infecção.

Segundo dados da plataforma Our World In Data, ligada à Universidade de Oxford, o Brasil é um dos países que menos fez testes na comparação por 100 mil habitantes.