Comissão mista já admite reforma tributária fatiada após intervenção de Lira

Senadores que integram o colegiado avaliam que, mesmo sem ser a forma ideal, a reforma fatiada, como quer o governo, será a única maneira de votar o tema ainda neste ano

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) - Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

A decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de intervir nas discussões da reforma tributária levou integrantes da comissão mista voltada ao tema, afetados pelas mudanças, a já admitirem o fatiamento das mudanças.

Lira comunicou na terça-feira (4) o fim da comissão especial que analisava a PEC (proposta de emenda à Constituição) do deputado Baleia Rossi (MDB-SP). O texto propõe uma fusão ampla de impostos (com tributos federais, o estadual ICMS e o municipal ISS).

Essa proposta, com a PEC 110, do Senado, e o projeto sobre a fusão do PIS e Cofins, enviado pelo governo, formavam a base do relatório elaborado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), lido no mesmo dia.

Além de anunciar o fim do colegiado da Câmara, Lira passou a argumentar que a comissão mista era um arranjo feito em 2020 para dar celeridade ao texto.

Nesta segunda-feira (10), em entrevista à Rádio Bandeirantes, voltou a minimizar a importância do colegiado.

"Regimentalmente, ela não tem validade. Ela não tem efetividade no que analisa, porque não existe na previsão regimental nem da Câmara, nem do Senado, nem do Congresso Nacional."

Diante do discurso do deputado e de sua defesa de uma reforma fatiada e dividida entre Câmara e Senado, integrantes da comissão mista passaram a reconhecer que as mudanças podem ser fracionadas.

Na manhã de quarta-feira (12), o colegiado deve se reunir para definir os rumos do relatório apresentado por Aguinaldo, que recebeu emendas de congressistas nos últimos dias.

"Vamos cumprir nosso papel na comissão mista. O relatório final será lido. Em seguida, a gente vai discutir o procedimento: se começa na Câmara, no Senado, se vai ser fatiada", disse o presidente da comissão, senador Roberto Rocha (PSDB-MA).

Senadores que integram o colegiado avaliam que, mesmo sem ser a forma ideal, a reforma fatiada, como quer o governo, será a única maneira de votar o tema ainda neste ano.

Para Simone Tebet (MDB-MS), o governo não aceitaria uma proposta de fusão ampla de impostos cobrados hoje por União, estados e municípios sem a contrapartida de criar um novo tributo nos moldes da antiga CPMF.

"Torço, claro, para que a reforma tributária seja a mais abrangente possível, mas sou pragmática. Uma reforma ampla exigiria a criação de um fundo constitucional para repor as perdas dos estados e municípios, e o governo não vai aceitar isso sem a criação de um novo imposto", afirmou.

"Nenhum parlamentar vai aprovar uma nova CPMF a um ano da eleição. Vamos acabar tendo que entender o momento e fazer essa reforma fatiada, ampliando-a o máximo que pudermos", disse.

Os integrantes da comissão também disseram acreditar que Câmara e Senado deverão fechar um acordo para dividir a reforma entre as duas Casas.

"Claro que o presidente da Câmara tem o poder de colocar a matéria em tramitação, mas eu acredito que isso vai resultar na necessidade de um diálogo entre o presidente [do Senado] Rodrigo Pacheco [DEM-MG] e o presidente Lira. Eles sabem a importância que isso representa para o país. Isso será resolvido", disse o senador Wellington Fagundes (PL-MT).

Pacheco defende a conclusão dos trabalhos da comissão mista, mas já admitiu a possibilidade de a reforma ser fatiada.

"Se será uma parte na Câmara, uma parte no Senado, se isso será fatiado [...], essa é uma negociação política que será feita entre Câmara dos Deputados e Senado Federal", afirmou Pacheco na quinta-feira (6).

Nesta segunda, Pacheco e Guedes se reuniram. O ministro vinha desde a semana passada buscando uma aproximação com o presidente do Senado com objetivo de fazer andar tanto a reforma tributária como a administrativa.

A equipe econômica aguardava o acerto no Congresso sobre como proceder. As declarações recentes do comando do Congresso apontam agora para uma reforma fatiada em várias frentes.

Mais cedo, Lira negou novamente qualquer disputa com o Senado para decidir por onde o texto começa a tramitar. "Nós temos um compromisso de votar e botar para votação uma reforma tributária possível", defendeu. "Nós não podemos ficar enganchados em CPFs, pai da reforma de um lado, tio da reforma do outro. Nós não temos absolutamente esse compromisso."

O presidente da Câmara afirmou ainda que vai se reunir com Pacheco nesta semana para definir o assunto.

Ele vê a reforma em duas partes principais: consumo e renda. Está em suas previsões a fusão de PIS e Cofins na CBS, mudanças no Imposto de Renda, no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), e o passaporte tributário.

Essas mudanças poderiam ser feitas em grande parte por projetos de lei, fatiados e divididos entre Câmara e Senado. Lira destacou que a reforma fracionada por meio de projetos de lei, como o texto enviado pelo governo com a fusão de PIS e Cofins, tornaria a tramitação mais rápida na Câmara e no Senado.

"Mais uma vez eu digo, não há vaidade alguma [por] onde ela começa. PEC precisa de dois textos iguais nas duas Casas para ter sua aprovação ou sua promulgação feita. Não há paternidade disso."

Segundo ele, pode haver três ou quatro relatores diferentes da reforma tributária.

As declarações de Lira sobre os próximos passos da reforma casam com os planos de Guedes. O ministro vê a reforma tributária em cinco capítulos:
- fusão de PIS e Cofins na nova CBS
- substituição do IPI por imposto seletivo aplicado a itens como cigarros e bebidas
- mudanças no Imposto de Renda (com menos taxação sobre empresas e, em contrapartida, cobrança sobre dividendos e sobre instrumentos financeiros como LCI e LCA)
- "passaporte tributário" para abrir renegociação de dívidas de contribuintes; e criação do imposto digital

O Ministério da Economia tem reiterado que não é contrário a uma proposta que inclua estados e municípios, mas que prefere que as mudanças sejam feitas inicialmente pelos impostos federais, para evitar a inviabilidade das discussões e a exigência de contrapartidas bilionárias da União para os entes subnacionais.