Assessor de Ricardo Salles atuou no Ibama em prol de interesse de empresários
A situação envolve uma empresa do interior de São Paulo alvo de sanções ambientais nos últimos anos
O inquérito sobre as suspeitas de irregularidade no Ministério do Meio Ambiente revela mais uma interferência de um dos principais auxiliares de Ricardo Salles no setor de autuação de infrações do Ibama (Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
A situação envolve uma empresa do interior de São Paulo alvo de sanções ambientais nos últimos anos.
Após a ação da Polícia Federal, a Folha mostrou a existência nos autos de uma troca de mensagens de WhatsApp em que o assessor especial Leopoldo Butkiewicz intervém junto ao Ibama em favor de um empreendimento agropecuário de Mato Grosso.
Os diálogos do aplicativo indicam que Butkiewicz também abordou servidores do instituto para tratar da Prema Tecnologia e Comércio, de Rio Claro (SP) e que fabrica dormentes ferroviários e postes, entre outros produtos.
"O Ibama está prejudicando esse proprietário", disse Butkiewicz via WhatsApp, em diálogo em 3 de março. "Como deve estar prejudicando outros em casos similares."
Para a PF, a atuação do assessor especial de Salles foi irregular. Não cabia a ele interferir na área de infrações do Ibama. Butkiewicz participava de grupo de Whats-App de servidores do órgão.
Procurados pela Folha, o ministério e o Ibama afirmaram que o assessor prestará esclarecimentos no inquérito.
Butkiewicz, Salles, o presidente do Ibama, Eduardo Bim, e servidores foram alvo de buscas, apreensões e quebra de sigilos bancário e telefônico em 19 de maio. A Operação Akuanduba foi deflagrada pela PF após autorização dada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
O Ibama tem poder para embargar área se constatar a prática de infrações ambientais. Nos últimos anos, a Prema foi alvo de pelo menos nove autuações. Segundo o inquérito, o caso tratado por Butkiewicz dizia respeito à produção, considerada irregular, de conservantes de madeira sem registro no Ibama.
Em 2016, então secretário do Meio Ambiente de São Paulo, Salles foi a Rio Claro celebrar um TAC (termo de ajustamento de conduta) com o Ministério Público estadual, em caso que envolvia a Prema.
Por WhatsApp, o assessor disse a servidores do Ibama que iria encaminhar um pedido de desembargo e citou o processo relativo à empresa.
Butkiewicz argumentou que havia parecer técnico pelo cancelamento do auto de infração e sugeriu "inserir para julgamento de 1ª instância e baixa de processo". Ele defendeu ainda a mudança de rotinas do Ibama. Apesar da ponderação de um técnico, Wagner Matiota, superintendente do setor de infrações e também investigado, respondeu: "Agilizamos este caso. E vamos conversar sobre melhorias".
Representante da empresa, o advogado Michel Nogueira Melguinha disse à Folha que a companhia foi procurada por Butkiewicz, que por coincidência é natural de Rio Claro.
"Ele fez contato diretamente com a empresa. Falou do programa de conciliação ambiental do Ibama, que temos alguns autos de infração e perguntou do nosso interesse em conciliar. O contato foi nesse sentido. Não vendeu facilidade, nada prometeu nem se valeu do cargo para induzir qualquer ilegalidade", disse Melguinha. O advogado frisou que a Prema não quis a conciliação. Afirmou que uma liminar suspendeu os efeitos do auto de infração e do embargo. Segundo ele, o processo não sofreu alteração após contato com Butkiewicz.
No caso de Mato Grosso, o assessor interveio no setor de autos de infração em favor de produtor rural de laranjas que teve área embargada.
As mensagens que mostram a atuação de Butkiewicz são de 2 de março. Em 26 de março, houve o desembargo. A ação foi em prol de Marco Aurélio Morales Blanco. No grupo de WhatsApp, o assessor afirmou que o produtor tinha intenção de conciliação e que já havia cumprido medidas. Um técnico afirmou que não seria possível a conciliação porque o caso estava na dívida ativa. Butkiewicz insistiu.
A área fica na Fazenda Rancho Blanco, em Querência (MT). A autuação pelo Ibama foi em 2008, mesmo ano do embargo. "Em 2003, obtive licença ambiental para desmatar 985 hectares, mas, por erro dos empreiteiros, esse desmate ocorreu em local diverso e, ainda menor que a autorização", afirmou Blanco à Folha por escrito. Ele disse ter pedido ao governo de Mato Grosso em 2008 a realocação da reserva, o que só teria ocorrido em 2020.
O empresário disse que não conhece nem manteve contato com Butkiewicz e Salles.