Relembre falas e ações de André Mendonça, indicado ao STF, contra críticos de Bolsonaro
A indicação de Mendonça, que precisa agora do aval do Senado, representa a escolha de um contumaz defensor do presidente
André Mendonça iniciou sua participação no governo Bolsonaro como chefe da Advocacia-Geral da União, foi deslocado para o Ministério da Justiça e, no fim do mês de março deste ano, voltou para a AGU, órgão que faz a defesa judicial do governo.
Desde o início de sua participação na equipe ele demonstrou total alinhamento ao presidente e influenciou na instauração de diversos inquéritos contra críticos de Jair Bolsonaro.
Nesta terça-feira (13), Bolsonaro o indicou para a vaga no STF (Supremo Tribunal Federal) aberta pela aposentadoria de Marco Aurélio Mello.
A indicação de Mendonça, que precisa agora do aval do Senado, representa não apenas a escolha de um contumaz defensor do presidente para a corte, a segunda feita por Bolsonaro.
A escolha dele também é um aceno à base evangélica. Desde 2019, o mandatário prometia indicar um nome "terrivelmente evangélico" para o STF.
Quando tomou posse como ministro da Justiça, em 29 de abril de 2020, o advogado e pastor presbiteriano André Mendonça fez em mais de uma ocasião o que o Bolsonaro havia pedido pouco antes de sua posse: tirou "a cabeça da toca" e se expôs na defesa do governo ou mesmo do chefe.
Quando retornou para a AGU, Mendonça deixou a Justiça criticado por requisitar a abertura de inquéritos na Polícia Federal para apurar crimes, em tese, cometidos contra a honra do presidente por seus críticos.
Em um dos casos mais emblemáticos, o ex-ministro da Justiça requisitou a abertura de um inquérito pela Polícia Federal, com base na Lei de Segurança Nacional, para investigar artigo do colunista da Folha de S.Paulo Hélio Schwartsman.
O texto "Por que torço para que Bolsonaro morra" foi publicado pelo jornal após Bolsonaro anunciar que contraiu o novo coronavírus. Em rede social, Mendonça citou "princípios básicos do Estado de Direito".
Pouco antes, Mendonça já havia solicitado outro inquérito para apurar uma charge reproduzida pelo jornalista Ricardo Noblat, que associava o presidente Bolsonaro ao nazismo, com base na mesma legislação. A imagem, de autoria de Renato Aroeira, foi compartilhada pelo perfil do Blog do Noblat no Twitter.
Em janeiro deste ano, numa de suas colunas na Folha de S.Paulo, o jornalista Ruy Castro afirmou que o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que perdera a eleição para o democrata Joe Biden e estava prestes a deixar o poder, deveria se suicidar, e sugeriu que Bolsonaro fizesse o mesmo.
Mendonça então pediu inquérito para apurar o crime do artigo 122 do Código Penal, incitação ao suicídio e à automutilação e pediu que o jornalista Ricardo Noblat, que compartilhou o artigo no Twitter, também fosse investigado.
Outro caso ocorreu em março de 2021. A Polícia Federal abriu inquérito para investigar o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) sob a suspeita de crime contra a honra do presidente Jair Bolsonaro.
Uma entrevista concedida em novembro pelo político do Ceará na qual ele fez críticas ao chefe do Executivo motivou a apuração, que tramita em Brasília.
O pedido de inquérito chegou à PF por intermédio do então ministro da Justiça, André Mendonça, que recebeu do Palácio do Planalto o documento assinado pelo próprio Bolsonaro.
No caso do professor Tiago Rodrigues, que contratou a instalação de dois outdoors com críticas a Bolsonaro em Palmas (TO), Mendonça pediu que os responsáveis fossem investigados por ofensa à honra do presidente.
Em março deste ano, a procuradora Melina Castro Montoya Flores pediu arquivamento, por considerar as manifestações críticas legítimas.
Os outdoors foram instalados em agosto de 2020 e tinham frases como: "Cabra à toa, não vale um pequi roído. Palmas quer impeachment já", dizia um dos painéis. "Aí meeente! Vaza Bolsonaro, o Tocantins quer paz", era a mensagem principal do outro.
Em julho de 2020, o advogado e comentarista de um programa da CNN Marcelo Feller acusou Bolsonaro de responsabilidade pelas mortes na pandemia de Covid-19.
"Não é o Exército que é genocida, é o próprio presidente, politicamente falando", afirmou, em julho do ano passado. "Criminoso, esse sim, o nosso presidente."
André Mendonça pediu uma semana depois que o advogado fosse investigado, sugerindo que fosse enquadrado na Lei de Segurança Nacional.
"Feller [acusou] o senhor Presidente da República de ter cometido assassinato em massa por omissão durante a pandemia do novo coronavírus", escreveu Mendonça.
Mendonça também tomou as dores do chefe do Executivo no caso envolvendo o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Guilherme Boulos.
O psolista foi intimado a depor num inquérito aberto para apurar se cometeu crime contra a segurança nacional ao publicar a seguinte mensagem no Twitter: "Um lembrete para Bolsonaro: a dinastia de Luís XIV terminou na guilhotina..."
André Mendonça pediu abertura de inquérito depois de receber uma representação do deputado José Medeiros (Pode-MT) e sugeriu o enquadramento de Boulos no crime de incitação a atentado contra o presidente. A PF levou um ano para intimar Boulos a depor e acabou desistindo de ouvi-lo.
Outra polêmica envolvendo a atuação de Mendonça ocorreu quando ele entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal pedindo a suspensão de um decreto do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que proíbia a realização de atividades religiosas por causa da pandemia de Covid-19.
O pedido mirou o ato do governador paulista, mas Mendonça também solicitou que a suspensão da restrição valesse para todos os estados.
Em abril deste ano, a Associação das Advogadas e Advogados Públicos para a Democracia (APD) divulgou nota repudiando as falas do Advogado-Geral da União, André Mendonça, no julgamento sobre a liberação de cultos no Supremo Tribunal Federal (STF).
Mendonça citou versículos bíblicos e disse que os cristãos "estão sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião".
Com diversas citações à Bíblia e a Deus, Mendonça afirmou que o julgamento não é um debate entre vida e morte e que vivemos atualmente em uma "sociedade tensa" em que parece ser proibido divergir da posição de outras pessoas.
"Ser cristão, em sua essência, é viver em comunhão em Deus e com o próximo. A Constituição não compactua com a discriminação das manifestações públicas de fé", disse Mendonça.
Ele afirmou ainda que a celebração religiosa deveria ser presencial.
"Não há cristianismo sem vida comunitária, não há cristianismo sem a casa de Deus. É por isso que os verdadeiros cristãos não estão dispostos, jamais, a matar por sua fé, mas estão sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião e culto. Que Deus nos abençoe e tenha piedade de nós", disse Mendonça.
Em março deste ano, o então ministro da Justiça consultou secretarias e órgãos vinculados sobre projetos no sentido de "tipificar como terrorismo as invasões de propriedades rurais e urbanas no território brasileiro", segundo publicou na época a coluna Painel, da Folha de S.Paulo.
Em uma entrevista à Folha de S.Paulo, em dezembro do ano passado, Mendonça também defendeu Bolsonaro das acusações do ex-ministro Sérgio Moro relacionadas a interferência na PF.
"Primeiro que a denúncia era uma denúncia vazia. Todos os elementos do inquérito indicam isso", disse na época.
"Tanto da minha experiência anterior [na AGU] como da minha nesse período à frente do ministério é de total independência na gestão e condução das questões, de modo específico na Polícia Federal. Tanto que há inquéritos e investigações em curso com relação a pessoas que defendem e são alinhadas ao próprio governo".
O ministério da Justiça, quando comandado por Mendonça, chegou a encaminhar ao Congresso Nacional o relatório produzido pelo governo Jair Bolsonaro sobre a atuação de 579 policiais e professores identificados como antifascistas.
O então ministro André Mendonça admitiu a existência do documento em sessão virtual fechada da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso.
"O relatório existe. O que não existe é um dossiê", disse aos congressistas presentes. O documento foi entregue impresso ao senador Nelsinho Trad (PSD-MS), que preside o colegiado.