Fundão eleitoral

Lira defende fundão e diz que, sem verba pública, campanhas podem ser bancadas por milícia e tráfico

Em entrevista à Globonews, ele lembrou que, com restrição ao financiamento privado, sobraram apenas os recursos públicos para pagar as campanhas eleitorais

O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL) - Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), defendeu, nesta quarta-feira (28), a utilização do fundo eleitoral para bancar as campanhas de 2022, negou que a projeção de valor chegue a R$ 5,7 bilhões e questionou como seria a forma de financiamento da política sem esse tipo de recurso.

Em entrevista à Globonews, ele lembrou que, com restrição ao financiamento privado, sobraram apenas os recursos públicos para pagar as campanhas eleitorais.

"A primeira discussão é essa. Nós temos outra maneira de financiar a política e a democracia no Brasil? Nós temos como manter a democracia sem um sistema claro?", disse.

"De onde virão os financiamentos se por acaso nós não tivermos recursos suficientes? Talvez das milícias? Talvez do tráfico? Talvez das influências das igrejas? De alguns outsiders e personalidades que estão de maneira momentânea ou tangencial participando da política? Essa é a discussão que tem que ser feita", afirmou Lira.



O presidente da Câmara defendeu que nada foi definido ainda sobre o fundo eleitoral e que, na Lei de Diretrizes Orçamentárias, foi incluída, após acordo entre deputados e senadores, uma vinculação de 25% do Orçamento de 2021 e 2022 do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para "realizar com transparência, com fiscalização as eleições de presidente da República, governadores, senadores, deputados federais e estaduais".

Ele lembrou que a eleição será mais ampla do que a de 2020 e criticou "alguns que fazem o discurso fácil" e que "tem o financiamento privado de pessoas físicas, milionárias, que têm um projeto de poder também e que financiam esses grupos".

Lira negou que o valor alcance R$ 5,7 bilhões. "Se nós formos levar à luz da realidade do que foi o Orçamento de 2020, de 2021, da Justiça Eleitoral e fizermos o uso do indexador de 25%, o fundo não passaria de R$ 4,3 bilhões, R$ 4,4 bilhões, nunca de R$ 5,7 bilhões", afirmou.

"Foi feita uma projeção em cima de um possível Orçamento que fosse aprovado para o TSE em 2022 para se chegar a esse número", afirmou.

Segundo ele, os valores só serão precificados na votação do Orçamento, que deve ocorrer em novembro ou dezembro.

As declarações foram dadas em meio ao debate sobre o aumento do fundo eleitoral para até R$ 5,7 bilhões, conforme aprovado pelo Congresso na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2022. O presidente Jair Bolsonaro indicou apoio a um fundo eleitoral em um patamar de R$ 4 bilhões. Justificou dizendo que não pode vetar por completo para não incorrer em crime de responsabilidade.

A Consultoria de Orçamento e Fiscalização da Câmara dos Deputados emitiu um parecer que diz que as duas leis vigentes que tratam do tema determinam, na verdade, que sejam destinados ao menos R$ 800 milhões às campanhas políticas do ano que vem, contradizendo o presidente.

Lira afirmou que o assunto deve ser tratado institucionalmente. "É constitucional o direito de o presidente da República vetar, é constitucional o direito de o Parlamento aprovar, como é constitucional o direito de o Parlamento apreciar vetos."

O presidente da Câmara elogiou a decisão de Bolsonaro de convidar o senador Ciro Nogueira (PP-PI) para o Ministério da Casa Civil e disse que o presidente do PP é um político com vasta experiência no Congresso.

"Tem boa articulação política, tem determinação, tem bom trânsito, faz a boa política que muitas vezes sofre
preconceitos", afirmou.

Na avaliação de Lira, a ida de Ciro Nogueira à Casa Civil vai melhorar a articulação entre os Poderes e trará "mais firmeza nas proposições em que o governo tem que demonstrar unidade".

"A Câmara é independente, ela tem demonstrado isso. Ela tem votado matérias em prol do Brasil. O Senado precisa realmente de uma articulação mais intensa, respeitando também sua independência. E o Ciro tem esses predicados", disse.

Lira foi questionado sobre a adoção do voto impresso no Brasil e afirmou que não pretende entrar "nessa briga de dizer que o sistema não é confiável".

"O sistema é confiável, mas por confiável que seja eu não vejo dificuldade que ele tenha algumas regras de auditagem para que se confirme a realidade das urnas e se afastem as versões", disse. "Se essa versão existe, ela seria esclarecida simplesmente com auditagem mínima nas urnas eleitorais, de uma maneira compreensiva, de uma maneira factível."

Ele falou também sobre as supostas ameaças feitas pelo ministro da Defesa, general Braga Netto, às eleições de 2022 caso o voto impresso não seja implementado no país.

Reportagem do jornal O Estado de S. Paulo publicada no dia 22 afirma que o ministro teria mandado a Lira um recado por meio de um interlocutor de que, sem a aprovação do voto impresso, não haveria eleições em 2022.

Lira disse que não precisava ser claro sobre o episódio porque o próprio Braga Netto desmentiu, em nota, o ocorrido. "Eu não participei dessa conversa, não chegou nada a mim dessa conversa. O que eu só quero afirmar é o seguinte: com relação a esse período de recesso, nós temos fatos, versões que são criadas a todo momento", disse.

Ele afirmou que Bolsonaro, ao convidar Ciro Nogueira para a Casa Civil, "dá uma visão clara de que quer interlocução política". "O fato de ter um senador da República independente da sua sigla partidária na Casa Civil demonstra que o caminho é o diálogo e não há nenhum tipo de risco à democracia."

"E enquanto nós estivermos aqui na presidência da Câmara, nessa posição, que é passageira, nós seremos, estaremos aqui como guardiães da democracia", defendeu. "Não tem possibilidade de ruptura política institucional no Brasil. Nós não somos qualquer país."

Lira falou ainda sobre os mais de 130 pedidos de impeachment contra Bolsonaro e disse que a decisão "não pode ser um ato ditatorial, um ato pessoal do presidente da Câmara".

"O impeachment não pode ser um ato ditatorial, um ato pessoal do presidente da Câmara. Cabe ao presidente da Câmara, como ao que me antecedeu [Rodrigo Maia] e a mim, ter imparcialidade, tranquilidade, porque o impeachment é feito de várias situações. Ninguém faz ele só", disse.

"E essas situações nem políticas, nem econômicas, nem sociais se mostram presentes para que se paute um processo de impeachment para instabilizar momentaneamente uma situação e ela não tenha nenhum tipo de efetividade."