Crítica

Paris Hilton na cozinha é como ver lutador de MMA tocando violino

Programa "Cozinhando com Paris Hilton" estreia nesta quarta-feira (4), na Netflix

Paris Hilton estreia em programa culinário nesta quarta (4), na Netflix - Reprodução/Instagram

Por que inventaram de fazer um programa de culinária com Paris Hilton? Aparentemente, porque ela é a cozinheira menos talentosa do sul da Califórnia, quiçá do Sistema Solar. É como pôr um lutador de MMA para tocar violino. Tentam ganhar o espectador pelo contraste, pela dissonância cognitiva, pelo pasmo.

Poderia funcionar se fosse uma brincadeira de 30 segundos no TikTok. Talvez nem isso. Toda a graça se esgota no absurdo do título "Cozinhando com Paris Hilton". Desafortunadamente, dura excruciantes 25 minutos cada um dos seis episódios da primeira temporada da série da Netflix, que estreia nesta quarta-feira.

A série fracassa como tutorial de receitas –na realidade, nem sequer existe uma tentativa de executar os passos a sério–, afunda como registro da vida dos bilionários e naufraga na comédia que deveria resultar do choque do cúmulo da peruagem com a pia cheia de louça.

 



"Cozinhando" se passa na casa de Paris Hilton em Los Angeles. O início do episódio é gravado em algum mercado, aonde a protagonista vai para comprar ingredientes e ostentar ignorância. Então Hilton recebe convidadas e ajudantes tão cintilantes quanto ela –como a também celebridade "per se" Kim Kardashian e a cantora Demi Lovato.

Cada episódio termina com uma refeição temática -café da manhã, jantar mexicano, lanche vegano, noite italiana, peru festivo e reunião familiar regada a caviar e ouro em lascas.

O arsenal culinário da produção inclui glitter comestível, confeitos multicoloridos, cereais matinais açucarados e moldes para biscoitos que reproduzem logomarcas de grifes da alta-costura. Quando desce ao mundo dos mortais, Hilton não sabe o que é cebolinha e é incapaz de operar um liquidificador.

A maioria dos experimentos na cozinha resulta em desastre parcial ou total. No episódio italiano, o que deveria ser um ravióli cor-de-rosa em formato de coração não progride além da mistura de farinha com ovos e beterraba em pó –a produção, agilmente, saca da geladeira uma massa de cor amarela pálida, comprada pronta.

No mesmo jantar, a tentativa de executar cannoli lilás com poeira de unicórnio perpetra uma gororoba francamente nojenta. A pós-produção só interfere nos descalabros de Hilton e amigas para congelar a ação e salpicar "dicas culinárias" como "ketchup nunca é demais" ou "mais açúcar conserta qualquer receita". Haja sarcasmo.

Hilton não nos surpreende com vocação culinária inaudita, que lástima. Destrói tudo em que mete a mão. É nisso que a Netflix joga todas as fichas para extrair alguma graça e prender a audiência. Não funciona porque Paris Hilton é antipática até a medula. Ela não é desastrada, é desleixada.

A expressão lânguida e a voz à meia-bomba transparecem profundo desinteresse, o mais absoluto desdém. A afetação da moça é tamanha a ponto de fazer Kim Kardashian, rainha das dondocas de reality show, parecer uma pessoa humilde e acessível.

Hilton emporcalha a cozinha porque sabe que alguém vai limpar. Faz qualquer coisa de qualquer jeito porque, no frigir dos ovos, está pouco se lixando. Sua falta de intimidade com a lida doméstica irrita, não faz rir.

Sabemos que não há empatia possível com os nefelibatas de Beverly Hills. Esse estranhamento é a chave do sucesso de programas que devassam a vida das celebridades super-ricas. Ocorre que já vimos esse filme demasiadas vezes.

Desde que Sharon Osbourne resolveu abrir o cotidiano do aparvalhado Ozzy para a MTV, lá se vão duas décadas das aborrecidas vidas dos famosos na TV –isso inclui as próprias Hilton e Kardashian, ambas veteranas de reality shows.

"Cozinhando com Paris Hilton" tenta requentar uma fórmula esgotada com paródia flácida, ironia sonsa e quase nenhuma substância. Não ensina receitas, não traz nada de novo, não surpreende, não é engraçado, não entretém, não faz sentido.

Por que, então, assistir a um programa de culinária com Paris Hilton? Boa pergunta. Eu assisti a trabalho. Você, que precisa pagar para ver, pode se poupar dessa furada.
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Onde: Disponível na Netflix a partir de quarta (4)
Avaliação: Ruim