Entidades empresariais chamam de 'inaceitável' nova versão da reforma no IR
As reclamações do empresariado representam apenas um dos elementos de pressão na reforma no Imposto de Renda
Entidades empresariais chamaram de inaceitável a nova versão do projeto de lei que altera o Imposto de Renda. O texto foi atualizado na terça-feira (3) pelo relator, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA).
O principal alvo da reclamação é o trecho que condiciona o ciclo completo de cortes previstos na tributação de empresas ao aumento real da arrecadação pública ao longo de três anos.
Para entidades como CNI (Confederação Nacional da Indústria), Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas), o texto aumenta a incerteza para a iniciativa privada.
As reclamações do empresariado representam apenas um dos elementos de pressão na reforma no Imposto de Renda, que também é atacada por estados e municípios e que já passou por duas mudanças de versão para reduzir as críticas.
O projeto de lei original foi enviado ao Congresso em 25 de junho e despertou várias reclamações da iniciativa privada. Um segundo texto foi apresentado por Sabino em 13 de julho após reuniões com o ministro Paulo Guedes (Economia) e o formato atraiu ataques de estados e municípios.
Nesta terça-feira, Sabino divulgou uma nova versão e as críticas continuaram. "O texto ainda tem muitos problemas. Em relação à segunda versão do substitutivo, tem até alguns retrocessos", diz Mário Sérgio Telles, gerente de política econômica da CNI.
Telles afirma que o projeto -caso sejam combinadas as alíquotas do IRPJ, da CSLL e da nova tributação de dividendos- já gerava um aumento na carga tributária dos empresários mesmo com a redução prevista na alíquota de IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica).
Agora, diz Telles, há risco de essa conta ficar ainda mais alta já que somente fica garantida uma redução de 7,5 pontos percentuais no IRPJ -prevista para o primeiro ano de vigência das regras. As reduções posteriores (5 pontos, sendo 2,5 no segundo ano e 2,5 no terceiro) só seriam executadas caso haja crescimento da arrecadação pública nos próximos anos, um fator incerto.
"A gente tem um aumento de carga garantido e uma redução condicionada. Do jeito que veio agora, é uma situação inaceitável. Do ponto de vista das empresas, esse arranjo é impraticável. Como alguém vai fazer um investimento se não saber qual será a tributação a que esta sujeito?", afirma.
Ele aproveita para rebater a tese do governo de que a arrecadação está crescendo e do relator, de que o projeto fará a economia se movimentar e gerar mais arrecadação. "O comportamento futuro da arrecadação do Imposto de Renda, só vamos saber no futuro. É uma variável que não está sob controle", diz.
"Eu posso achar que a arrecadação vai subir, mas não tenho certeza. Quem há três anos iria prever o coronavírus, por exemplo?", questiona. "As condições na economia são muito incertas, pode haver uma nova crise e a arrecadação com IR não crescer. É um condicionamento que não faz sentido econômico", diz.
A condicionalidade foi uma tentativa de Sabino de agradar governadores e prefeitos. Estados e municípios têm direito a uma parte da arrecadação com Imposto de Renda e, com os cortes previstos, calculam perder recursos.
Com a condicionalidade, os cortes no IRPJ só seriam feitos se o poder público registrar crescimento real na arrecadação. Mesmo com as novas mudanças, no entanto, estados e municípios continuaram vendo problemas na proposta.
A CNI também critica outros pontos da nova versão, como o fim dos juros sobre capital próprio (os JCP, uma espécie de distribuição de lucros análoga aos dividendos e que hoje pode ser usada pela empresa para abater outros impostos). A versão anterior não extinguia esse instrumento, apenas barrava a dedutibilidade.
A CNI não se opõe à direção do projeto de lei como um todo, mas pede mais tempo para discussão e critica a pressa no debate. "Para que a gente possa aperfeiçoar, é preciso tempo. Esse tipo de reforma precisa de uma discussão mais elaborada. Era importante que fosse discutido com mais calma", diz Telles.
Por outro lado, o debate já produziu algumas mudanças que atendem os interesses da CNI -como a regra que isenta o pagamento de dividendos das chamadas empresas coligadas a seus acionistas.
Uma companhia é coligada a outra quando uma delas tem uma influência significativa sobre a outra empresa (no texto, isso é determinado por uma participação acima de 20%). Antes, a reforma já isentava os dividendos entre empresas do mesmo grupo.
A Fiesp fez reclamações na mesma linha da CNI, ao dizer que o substitutivo apresentado nesta terça aumenta os impostos, a complexidade do pagamento de tributos e cria insegurança sobre quanto as empresas irão recolher.
"Está claro que a única preocupação é com o caixa dos governos, o que é inaceitável. O substitutivo não muda a lógica do sistema, não facilita as condições de pagamento para o setor produtivo e recorre à mesma velha saída de sempre que é obter mais recursos com elevação da carga tributária ao invés de reduzir gastos", afirma a Fiesp, em nota.
A entidade critica também a previsão de cobrança de dividendos sobre atividades exercidas ainda em 2021, antes da lei. Como são uma parcela do lucro registrado em determinado período, os dividendos costumam ser pagos em exercício posterior ao do fechamento dos balanços.
"O Brasil tem o grande desafio de superar os efeitos da pandemia e de retomar o processo de crescimento sustentável, com forte geração de emprego e renda [...]. O substitutivo da reforma do Imposto de Renda apresentado em nada contribui para isso", afirma a Fiesp.
A Abrasca afirmou que proposta "não atingirá os objetivos estabelecidos de neutralidade arrecadatória, incentivo à retomada do desenvolvimento, promoção do investimento, geração de emprego nem de simplificação".
"A indefinição da alíquota do imposto de renda das pessoas jurídicas, que o novo substitutivo vincula à arrecadação futura, é um agravante importante da incerteza que permeia o sistema tributário brasileiro, já considerado caótico e de carga elevada", afirma a entidade.
A Abrasca também critica outros pontos, como a taxação de dividendos relativos a atividades de 2021, a tributação de dividendos pagos a coligadas com menos de 20%, e a eliminação do JCP.