Com disparada de casos e internações por Covid, Rio volta a abrir leitos de UTI
Casos, internações, atendimentos em unidades de saúde e ocupação de UTIs: todos esses indicadores estão em alta no RJ
Chamado de "epicentro da Covid" pelo prefeito Eduardo Paes (PSD), nesta sexta-feira (13), o Rio de Janeiro acumula uma série de números que indicam uma escalada geral da pandemia do coronavírus, com o avanço da variante delta e o relaxamento das medidas de restrição nas ruas.
Com isso, tanto o estado quanto a capital decidiram agora reabrir leitos exclusivos para a doença. O município tem usado os dados para pedir que o governo Jair Bolsonaro (sem partido) faça o mesmo nos hospitais federais e priorize o envio de vacinas.
"O epicentro da pandemia no Brasil em relação ao aumento de casos é o Rio. O que aconteceu em todos os momentos em que esse epicentro esteve no Maranhão, em Manaus, no Rio Grande do Sul? Se entendeu que tinha que mandar mais doses", pressionou Paes em entrevista coletiva.
Os fluminenses encabeçam uma tendência de piora em todo o país e são a principal preocupação de pesquisadores em saúde pública neste momento –seguidos por outros estados das regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste em geral, que já não estão mais em queda.
Casos, internações, atendimentos em unidades de saúde e ocupação de UTIs: todos esses indicadores estão em alta no RJ, mesmo com o avanço da vacinação, que chegou a parar por dois dias e foi retomada nesta sexta para os que têm 24 anos. Filas de espera por leitos também começam a aparecer de novo.
"Estou bastante preocupado", diz Leonardo Bastos, da Fiocruz. "Estamos com uma combinação muito ruim que é a possível perda de imunidade [dos vacinados], a delta se estabelecendo e os mais jovens relaxando após uma única dose. A efetividade da vacina com uma dose só é muito baixa", alerta.
O estado do Rio tem 64% dos adultos vacinados com ao menos uma dose e 27% totalmente vacinados, ficando em 13º lugar no país e abaixo da média nacional. Já a capital atinge marcas maiores de imunizados, com 84% e 39%, respectivamente.
Uma projeção estadual feita por Bastos de forma inédita, por idade, mostra que agora as hospitalizações por Covid-19 já sobem em quase todas as faixas etárias, o que indica o espalhamento da nova cepa. Na semana passada, essa piora era observada apenas na população com 80 anos ou mais.
A metodologia –que "corrige" o atraso nas notificações no sistema do Ministério da Saúde em dados até o último sábado (7)– também aponta para uma recente alta nas mortes entre os octogenários e nonagenários, e inclusive entre os septuagenários e sexagenários, mas de forma mais leve.
Os números do município indicam que 5% dos idosos acima de 80 anos não tomaram nenhuma vacina, e outros 5% tomaram apenas a primeira dose. Essa ausência também é grande especialmente entre quem tem de 70 a 74 anos. Os óbitos ainda não sobem no geral, mas pararam de cair segundo a projeção.
Bastos destaca o fato de que, assim como São Paulo, o Rio é um "hub" internacional: "Essas cidades têm chances maiores de receber novas variantes por múltiplas entradas", afirma. O último estudo feito pelo governo mostrou que a delta já corresponde a 45% das amostras analisadas na cidade e a 26% no estado.
Outro boletim da Fiocruz, da plataforma InfoGripe, mostrou nesta semana que o Rio é a única unidade da federação com alta sustentada de casos de síndrome respiratória grave (SRAG), tanto a longo prazo (últimas seis semanas) quanto a curto prazo (últimas três semanas), desde meados de julho.
A disparada fez a prefeitura reverter 60 leitos para pacientes com coronavírus recentemente, nos hospitais Ronaldo Gazolla (exclusivo para a doença), Souza Aguiar e Albert Schweitzer. Já o governo estadual decidiu colocar em prática o chamado "Plano de Contingência da Covid-19".
Com isso, voltou atrás na decisão de transformar o Hospital Regional Zilda Arns, em Volta Redonda, em unidade para tratamentos não-Covid. Também planeja a abertura de mais 20 vagas no hospital estadual Dr. Ricardo Cruz (Nova Iguaçu) e um chamamento público para contratação de UTIs.
A porcentagem de leitos de terapia intensiva ocupados é outro indicador que tem subido nas últimas semanas, chegando a 95% na capital e 68% no estado nesta sexta.
"O governo federal especialmente tem muito leito fechado. Então, fica aqui o nosso apelo para que abra mais leitos. Não vamos esperar 'dar ruim' para só aí abrir leitos", discursou Paes. O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, ascentou que a União "está compromissada a fazer isso ao longo desta semana".
Paes manteve as medidas de restrição vigentes, que impedem o funcionamento apenas de casas de show e boates (que na prática abrem com frequência). Comércios, serviços, restaurantes, bares, shoppings e cinemas já estão permitidos sem restrições de horário há meses, incluindo rodas de samba e música ao vivo.
Especialistas concordam que o Rio é o local que inspira mais preocupação no país neste momento, mas destacam que outros locais também devem ser olhados de perto.
"Não é o estado com maior número de novos casos por habitante no país. Além disso, outros estados também já interromperam tendência de queda e se mantêm em valores elevados. Ou seja, requer atenção especial, mas não diminui a importância de redobrar os cuidados nos demais também", ressalta Marcelo Gomes, coordenador do InfoGripe.
O epidemiologista Raphael Guimarães, também da Fiocruz, vê a atitude de Paes de classificar a cidade como epicentro da Covid como uma estratégia política. "Não acho que ele esteja incorreto, mas acho que a fala dele é política, numa tentativa justa de pressionar o governo federal a agilizar a transferência de vacinas para a capital", afirma.