"Como confiar em quem tirou seus direitos?'', diz Malala sobre promessas de Taleban
Ativista pela educação de meninas, ela foi vítima de um atentado desse grupo fundamentalista aos 14 anos e aos 17 tornou-se a pessoa mais jovem a ganhar o prêmio Nobel da Paz
Preocupada, exausta, sem dormir direito. Malala Yousafzai disse que está assim desde que o Taleban tomou o poder no Afeganistão, vizinho ao seu país de origem, o Paquistão.
A ativista pela educação de meninas, que foi vítima de um atentado desse grupo fundamentalista aos 14 anos e aos 17 tornou-se a pessoa mais jovem a ganhar o prêmio Nobel da Paz, falou nesta quinta-feira (26) sobre a crise no Afeganistão em um evento virtual promovido pela consultoria financeira brasileira XP.
Ao lado dela, seu pai, Ziauddin Yousafzai, que após o ataque à filha se refugiou com a família no Reino Unido. Logo antes, a ex-secretária de Estado americana Hillary Clinton deu uma palestra na qual também abordou a crise no Afeganistão, entre outras questões.
"Estamos todos preocupados e exaustos com esses conflitos. Se a gente, que está vendo de fora, está assim, imagina os civis que estão no Afeganistão, as mulheres, as crianças. Essa guerra já dura tantos anos que a gente nem sabe mais como tudo começou", afirmou Malala. Ela disse esperar que os talibãs cumpram as promessas que têm feito de que permitirão a educação de meninas e mulheres –diferentemente do que fizeram em seu outro governo, 20 anos atrás–, mas que é difícil acreditar nisso.
"A mensagem não é muito clara. Às vezes eles dizem que as mulheres terão acesso ao trabalho e à educação, mas não se sabe qual é a lei que vão seguir", declarou.
"Eles ficam lá carregando aquelas armas, as pessoas estão presas em casa, preocupadas com o futuro porque viveram isso no passado. Como podem confiar nas mesmas pessoas que tiraram os direitos deles?"
Malala disse que ela e outros ativistas estão tentando atuar na crise afegã e que a prioridade agora é evacuar ativistas locais com segurança. Malala defendeu a abertura de fronteiras e o envolvimento de mais países no abrigo aos refugiados.
"Alguns, como Canadá e Reino Unido, firmaram esse compromisso. Outros estão sendo mais pão-duros e não querem ajudar. Não podemos ser egoístas neste momento, temos que salvar vidas. Não dá pra deixar as coisas acontecerem na nossa cara sem ajudar." E ela instou os governos a agirem o antes possível. "Não acreditamos apenas em promessas, queremos ações acontecendo."
Malala também falou sobre a situação da educação mundial na pandemia –chamando a atenção para a suspensão das aulas de milhões de crianças– e sobre sua saúde após o atentado que sofreu. Nove anos depois, ela continua passando por procedimentos e acaba de se recuperar de uma cirurgia.
"É uma longa jornada. Sempre tem alguma coisa para consertar: cirurgia para o rosto, placa de titânio, tanta coisa teve que ser feita. Mas neste momento não penso mais em mim mesma, que sou abençoada. Vamos pensar em todas as que não têm essas oportunidades de reabilitação, de viver em um local seguro, de estudar. É o momento de pensarmos no mundo no qual vivemos, de apoiarmos uns aos outros, de lutar pela paz."
Em uma palestra logo antes de Malala, Hillary Clinton também disse que no momento a prioridade no Afeganistão é evacuar o maior número de famílias e mulheres em risco. "Temos um grupo de ONGs e ativistas tentando ajudar, e estamos fazendo tudo o possível pra levar essas pessoas. É um processo muito delicado e perigoso", afirmou.
Hillary, que disse estar em contato constante com Malala após os acontecimentos recentes, agradeceu "aos países que estão dispostos a aceitar os afegãos como refugiados". "Temos que lembrar que essas pessoas vão precisar de apoio contínuo no país onde forem viver. E vamos ter que entender como dar apoio a quem ficou no Afeganistão, especialmente às mulheres."