Bolsonaro flerta com 'golpe dentro do golpe', diz Dilma 5 anos após impeachment
A atual crise política no país, sob gestão Jair Bolsonaro, é um desdobramento do processo de impeachment ocorrido em 2016, afirma a ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Nesta terça-feira (31) são completados cinco anos do impedimento que tirou a petista do poder sob acusação de pedaladas fiscais -e com grande mobilização nas ruas em meio à impopularidade de Dilma e à crise econômica.
Em entrevista ao portal da Fundação Perseu Abramo, ela afirma que "o golpe de 2016 é o ato zero do golpe, é o ato inaugural, mas o processo continua". "É o pecado original dessa crise que o país atravessa. É a partir dali que se desenrola todo o processo golpista", diz.
"O que estamos vivendo são as etapas do possível endurecimento do regime político no Brasil. O governo flertando com a possibilidade de um golpe dentro do golpe", afirma a petista.
No segundo processo de impeachment presidencial do Brasil pós redemocratização, o plenário do Senado aprovou o afastamento de Dilma em 31 de agosto, interrompendo um ciclo de 13 anos de gestão PT.
Embora ela tenha sido condenada por crime de responsabilidade, não perdeu direito de exercer funções públicas. Em 2018, disputou uma cadeira de senadora por Minas Gerais e acabou derrotada.
Questionada sobre o tom de ameaça recorrente nas falas de Bolsonaro, Dilma afirmou que o país vive a possibilidade de um segundo golpe, já que ela considera o processo de deposição ao qual foi submetida como ilegítimo.
"É preciso entender o jogo. O golpe ocorreu em 31 de agosto de 2016. O que estamos vivendo agora é a possibilidade de um novo golpe baseado nas formas derivadas da guerra híbrida. Lá atrás, houve um golpe parlamentar, Judiciário e midiático. Mas, sobretudo, um golpe do setor financeiro, do capitalismo financeirizado. Um golpe neoliberal", afirma.
Na entrevista ao portal da Fundação Perseu Abramo, Dilma afirmou que "ali aconteceu uma ruptura violenta contra o status quo da democracia" e que o impeachment permitiu "dois crimes imediatos" contra o país: o teto dos gastos e a destruição da Amazônia.
A ex-presidente disse que o processo de militarização da política é anterior à eleição de Bolsonaro. "Lembra que no governo Temer, deram uma importância grande aos militares, voltando a ter o GSI -entregue ao general Sérgio Etchegoyen-, levando um militar para dirigir o Ministério da Defesa? Isso nunca tinha acontecido. Entregar o Ministério da Defesa a um militar".
Ela cita ainda a intervenção federal no Rio de Janeiro, também ocorrida durante o governo Temer. "É uma marca inequívoca da volta dos militares à política."
A ex-presidente fez ainda um paralelo entre o período de ditadura militar e o impedimento que a tirou do poder.
Segundo ela, como em 1964, "o golpe se recusa a ser chamado de golpe, desde o primeiro momento". Dilma afirma que, durante o processo do impeachment, deputados e senadores entraram com ações no STF para impedir que a petista chamasse "o golpe de golpe".
A ex-presidente criticou ainda a imprensa que, em sua avaliação, nunca tratou o impedimento ocorrido em 2016 como um golpe "nem jamais fez autocrítica".
Outro segmento criticado pela ex-presidente foi o Judiciário, que, segundo ela, só percebeu agora as ameaças à democracia porque "chegou agora neles". "Quando eu disse, há cinco anos, que o golpe não ficaria ali, é porque sabia que haveria um avanço rápido sobre todas as instituições."
Dilma afirma que "o ato seguinte ao golpe do impeachment foi a prisão do Lula", em abril de 2018, para, na visão dela, inviabilizar a possibilidade de o petista se candidatar à Presidência.
"Ora, se o Lula é eleito, o golpe seria interrompido. Mas, não bastou prendê-lo. Afinal, ele não perdeu a popularidade que desfrutava. Ainda era competitivo. E não perdeu a confiança do povo. Daí então, passa-se a um novo ato do golpe: a interdição de Lula do processo eleitoral. Ele é condenado, preso e, finalmente, tiraram-no das eleições de 2018. Não pode falar e nem fazer campanha. O golpe foi se aprofundando."
Lula lidera com folga as pesquisas de intenção de voto para as eleições de 2022 para presidente, seguido pelo atual ocupante do Planalto.
João Doria e Eduardo Leite (que disputam as prévias do PSDB), Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), Sergio Moro (sem partido) e Luiz Henrique Mandetta (DEM) são alguns dos presidenciáveis que brigam para se consolidar como uma terceira opção para o próximo pleito.
Nesta segunda-feira (30), um dos principais destaques da CPI da Covid, o senador Alessandro Vieria (Cidadania-SE) se apresentou como pré-candidato à Presidência da República nas eleições de 2022.
O senador é membro suplente da comissão, mas se tornou peça importante do grupo majoritário que dita os rumos do colegiado, por sua experiência como delegado de polícia.
Além disso, vem ganhando destaque durante os depoimentos por conseguir pressionar os depoentes e conseguir informações importantes para a investigação.
O senador busca se apresentar como mais um nome para a chamada terceira via, em oposição à polarização atual entre Bolsonaro e Lula.
"Considerando as pesquisas de opinião mais recentes, bem como as movimentações de partidos, parlamentares e movimentos de renovação, entendo que o Cidadania estão ficando para trás no processo de construção da terceira via [...]. Isso terá impactos negativos para o partido e para a democracia como um todo, pois acaba fortalecendo a polarização", afirmou o senador.
"Entendo que é necessário um fato novo, com potencial de mobilização que reposicione o Cidadania no cenário nacional, com evidentes impactos nos cenários locais. É neste sentido que estou colocando meu nome à disposição do Cidadania como pré-candidato à Presidência da República", completa.