Cinema

Filme pernambucano "King Kong en Asunción" chega aos cinemas

Longa-metragem de Camilo Cavalcante é estrelada pelo ator Andrade Júnior, que faleceu em 2019

Filme "King Kong en Asunción" - Divulgação

Um carro vagueia pela imensidão branca do Salar de Uyuni, na Bolívia, conduzido por um velho matador de aluguel. A travessia no maior deserto de sal do mundo é narrada por uma voz ancestral, que em guarani antecipa: “esta também é uma história de ruínas”. É assim que “King Kong en Asunción”, filme do pernambucano Camilo Cavalcante, apresenta ao espectador a trama de um “homem cindido” em busca de redenção.

Após abocanhar o prêmio de melhor filme no 48º Festival de Cinema de Gramado, no ano passado, o longa-metragem chega nesta quinta-feira (2) às salas de cinema brasileiras. O road movie acompanha o protagonista após a execução do seu último assassinato por encomenda. Atormentado pelos fantasmas das suas vítimas e pelo próprio passado de dor, ele decide largar o ofício mórbido e partir em uma viagem para tentar conhecer a filha que abandonou ainda na barriga da ex-companheira, em busca de alcançar um pouco de afeto nos seus últimos anos de vida.  

O ancião inicia sua trajetória no interior da Bolívia, passando pelo Chaco paraguaio, até chegar a Assunção, capital do Paraguai. Incorporando ficção e documentário em sua linguagem, o filme acaba traçando conexões - ainda que indiretas - entre a geografia apresentada e a personalidade de seu protagonista.
 

“É interessante que a Bolívia e o Paraguai são os dois países da América do Sul que não têm acesso ao mar. Esse isolamento também faz parte da própria personalidade do velho, que se mistura às paisagens, minúsculo na natureza, mostrando o quanto somos pequenos diante da dimensão da vida”, aponta o diretor, em entrevista à Folha de Pernambuco.

Segundo o cineasta, a realização do filme só foi possível graças à cooperação entre profissionais de diferentes países. As longas distâncias percorridas e o baixo orçamento disponível exigiram um trabalho cuidadoso na pré-produção. “Filmar essa obra foi uma aventura humana. Tivemos alguns percalços no caminho, mas no final das contas a logística foi muito bem montada. Foi um verdadeiro intercâmbio entre trabalhadores do audiovisual latino-américano”, relembra.

A ideia de “King Kong en Asunción” nasceu em 2007, quando a participação em um festival de cinema promoveu o encontro de Camilo com Andrade Júnior, ator cearense radicado em Brasília. O impacto da figura que o cineasta descreve como “genuína e engraçada” despertou o interesse de ter o ator como protagonista em uma obra. O resultado, no entanto, não pôde ser contemplado pelo artista, que faleceu em 2019, vítima de um infarto. “Andrade é a força motriz do filme. Agora, com o lançamento, ele rive luminoso na tela a cada exibição”, comenta.

Além do ator, o elenco ainda traz nomes como Fernando Teixeira, Juan Carlos Aduviri, Georgina Genes, Ede Colina e Maycon Douglas. A narração em off que guia todo o longa é da paraguaia Ana Ivanova. Ela interpreta o texto escrito por Natália Borges Polesso em português e, posteriormente, adaptado ao guarani.

“Essa voz onipresente e onisciente pode ser entendida como uma entidade que representa a morte, grande companheira do velho durante toda a sua vida. Ela é quem revela os aspectos dessa trajetória que estão por trás das aparências. Colocar isso em guarani foi importante, porque a gente trouxe a presença de um povo massacrado por uma colonização perversa, excludente e preconceituosa, perpetrada em toda a América Latina”, avalia.