AFEGANISTÃO

Talibã prepara novo governo no Afeganistão

No comando do país desde o dia 15 de agosto, grupo organiza nova administração local

Líder religioso do Talibã discursa a apoiadores - HOSHANG HASHIMI / AFP

O Talibã seguia, nesta sexta-feira (3), preparando a formação de um governo no Afeganistão que será submetido a intenso escrutínio internacional para ver se cumpre as promessas de maior tolerância, especialmente em relação às mulheres.

O anúncio do gabinete era esperado inicialmente após a oração desta tarde, mas não será feito até sábado (4) pelo menos, informou um porta-voz do Talibã à AFP.

O movimento radical islâmico enfrenta o desafio de deixar de ser um grupo insurgente para administrar o poder, poucos dias depois da retirada final das tropas americanas que encerrou duas décadas de guerra. 

A cautela e a desconfiança da comunidade internacional se misturam a sinais de interação com os novos líderes.

As Nações Unidas anunciaram a retomada de seus voos humanitários, que partirão do Paquistão para as cidades de Mazar-i-Sharif (norte) e Kandahar (sul). 

O Catar reconheceu que está trabalhando com as novas autoridades para reabrir o aeroporto de Cabul, infraestrutura fundamental para se levar ajuda humanitária à capital.

Além disso, as empresas Western Union e Moneygram reativaram seus serviços de transferência de dinheiro no país, dos quais muitos destinatários afegãos de remessas de parentes emigrados dependem. 

E, de acordo com um porta-voz do Talibã, o Ministério das Relações Exteriores da China prometeu manter aberta sua embaixada em Cabul e melhorar suas relações.

Os novos líderes afegãos prometeram um regime mais aberto do que aquele que lideraram entre 1996 e 2001, marcado pela aplicação brutal da lei islâmica e pelo tratamento dispensado às mulheres - proibidas de estudar, trabalhar e de sair sem a companhia de um homem.

'Não temos medo' 

A atenção se volta agora para ver se o Talibã consegue formar um governo capaz de dirigir uma economia devastada pela guerra, assim como honrar suas promessas de um governo "inclusivo". 

Há muita especulação sobre sua composição, embora um alto funcionário tenha dito esta semana que dificilmente incluirá mulheres.

Na cidade de Herat, no oeste do país, cerca de 50 mulheres saíram às ruas na quinta-feira (2), em um protesto incomum para reivindicar seu direito ao trabalho e criticar a exclusão das mulheres do novo governo.

"É nosso direito ter educação, trabalho e segurança", gritaram as manifestantes em uníssono. "Não temos medo, estamos unidas", acrescentaram.

"Queremos que o Talibã aceite falar conosco", disse uma das organizadoras do protesto, Basira Taheri, à AFP.

Os direitos das mulheres são apenas um dos múltiplos desafios do novo governo. Em Cabul, muitos cidadãos se preocupam com as dificuldades econômicas do país.

"Com a chegada do Talibã, pode-se dizer que há segurança, mas os negócios estão abaixo de zero", disse à AFP Karim Khan, dono de uma loja de eletrônicos. 

No início desta semana, a Organização das Nações Unidas alertou sobre uma iminente "catástrofe humanitária" no Afeganistão e lançou um apelo para que aqueles que assim desejarem possam deixar o país em segurança.

O ministro das Relações Exteriores do Catar, Mohamed bin Abdelrahman al-Thani, disse ontem que seu governo está negociando com o Talibã para reabrir o aeroporto de Cabul "o mais rápido possível". 

E a Turquia também observou que está estudando com os fundamentalistas e com outros interlocutores a possibilidade de assumir um papel na gestão do aeroporto.