Ministro de Bolsonaro e Lira buscam Gilmar para interlocução com STF após ameaça golpista
No dia seguinte às manifestações com falas golpistas de Jair Bolsonaro no 7 de Setembro, o ministro Ciro Nogueira (Casa Civil) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), entraram em campo para tentar abaixar a temperatura da crise com o STF (Supremo Tribunal Federal).
Líderes do centrão, os dois tiveram uma reunião na tarde desta quarta-feira (8), fora da agenda, com o ministro Gilmar Mendes.
O magistrado tentava costurar uma alternativa jurídica ao impasse do rombo dos precatórios, mas indicou a Lira e Ciro Nogueira que o caso não tem solução.
O Supremo Tribunal Federal aguardava para levar adiante as negociações dos precatórios à espera do fim dos ataques de Bolsonaro à corte, o que não ocorreu.
Segundo interlocutores da dupla, com o presidente do STF, Luiz Fux, a conversa seria mais institucional, mas Gilmar é decano, atua nos bastidores, tem representatividade entre os ministros.
O ministro é ainda presidente da Segunda Turma. Por causa da prevenção dos processos envolvendo a Lava Jato, a Segunda Turma julga a maioria dos casos envolvendo políticos.
Logo após os atos de 7 de Setembro, o ministro e o parlamentar entraram em contato com integrantes do Supremo.
Apesar da tentativa, ministros do STF veem com ceticismo o movimento de Ciro, que se autodenominou "amortecedor" da República.
Dois magistrados de cortes superiores afirmaram à reportagem que o ministro não consegue controlar Bolsonaro.
Enquanto isso, o dia seguinte aos atos foi de silêncio por parte do presidente da República. Jair Bolsonaro teve uma longa reunião com ministros, que durou cerca de três horas, e não fez, publicamente, novos ataques ao Supremo até o início da noite desta quarta (8).
Lira antecipou sua volta para Brasília, chegando ainda no 7 de Setembro, para conversar com políticos e tirar a temperatura da crise na capital. O deputado se encontrou com Ciro Nogueira também.
Em seu discurso, nesta quarta-feira, o presidente da Câmara não citou o aumento pela pressão para o impeachment de Bolsonaro, mas elevou o tom de crítica ao chefe do Executivo e enviou sinais de tentativas de apaziguamento.
"É hora de dar um basta a essa escalada, em um infinito looping negativo", afirmou, dizendo também que "bravatas em redes sociais, vídeos e um eterno palanque deixaram de ser um elemento virtual e passaram a impactar o dia a dia do Brasil de verdade".
À tarde, depois do pronunciamento de Lira, Ciro Nogueira e a ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, estiveram na Câmara para uma conversa com ele. Depois, o chefe da Casa Civil e o presidente da Casa seguiram para o Supremo.
Segundo interlocutores do presidente, Jair Bolsonaro não deve mudar o tom de críticas e ataques ao Judiciário. O saldo geral das manifestações, na avaliação de governistas, foi positivo e acabou empoderando o presidente para manter as críticas.
Também foi visto como positivo, segundo auxiliares de Bolsonaro, o fato de as Forças Armadas terem permanecido silenciosas antes e durante as manifestações.
Diante dos pedidos de intervenção militar, e do que se desenhava como atos de raiz golpista desde a semana anterior, os comandantes das Forças poderiam ter se posicionado, soltado uma nota, como já fizeram antes, defendendo a democracia.
O silêncio, na interpretação deles, foi visto como uma crítica velada à forma como o Supremo tem tomado suas decisões
Auxiliares que antes dos protestos faziam pedidos de moderação agora falam em "contenção" do presidente. Dizem acreditar que Bolsonaro não demonstra mais intenção de pisar no freio nas suas declarações.
Eles afirmam ter a dimensão política do quanto o discurso do presidente pode agravar a crise entre os Poderes e travar ainda mais a pauta no Congresso.
No caso do Auxílio Brasil, por exemplo, veem com ainda maior dificuldade uma aprovação da PEC dos Precatórios. A solução via Judiciário vinha sendo costurada pelo ministro Gilmar Mendes com ajuda de ministros do Tribunal de Contas da União.
Contudo interlocutores do Planalto já haviam sido avisados que, sem trégua nos ataques do presidente, a solução para o rombo dos precatórios dificilmente avançaria.
Essa expectativa, segundo integrantes do Supremo, consolidou-se, e a perspectiva de uma saída via Judiciário é praticamente nula.
Outro tema que deve sofrer os impactos dos protestos do 7 de Setembro é a indicação de André Mendonça para a vaga do STF. Auxiliares de Bolsonaro já veem como praticamente inviável a análise do nome do ex-AGU pelos senadores, mas dizem que o presidente não estuda plano B por ora.
Mendonça aguarda ser sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado desde julho –um recorde para indicações ao Supremo.
A resistência dos senadores não se dá ao nome do advogado propriamente dito. Trata-se de uma forma de retaliação aos ataques do presidente aos outros Poderes, em especial, ao Judiciário.
Em discursos diante de milhares de apoiadores na terça-feira (7) em Brasília e São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro fez ameaças golpistas contra o STF, exortou desobediência a decisões da Justiça e disse que só sairá morto da Presidência da República.
Pela manhã, na Esplanada dos Ministérios, Bolsonaro fez uma ameaça direta ao presidente do Supremo, ministro Luiz Fux.
"Ou o chefe desse Poder [Fux] enquadra o seu [ministro] ou esse Poder pode sofrer aquilo que nós não queremos", disse, referindo-se às recentes decisões de Moraes contra bolsonaristas.
"Nós todos aqui na Praça dos Três Poderes juramos respeitar a nossa Constituição. Quem age fora dela se enquadra ou pede para sair", disse o presidente, em um caminhão de som no gramado em frente ao Congresso.
Bolsonaro chegou a falar ainda em convocar reunião do Conselho da República na manifestação de Brasília. De acordo com o artigo 90 da Constituição de 1988, o colegiado tem a função de se pronunciar sobre estado de sítio, estado de defesa, intervenção federal e questões relativas à estabilidade das instituições democráticas.
Lira, Pacheco e Fux disseram, no mesmo dia, não saber de reunião. Bolsonaro teria anunciado que os três estariam presentes. O presidente do Supremo, inclusive, sequer faz parte dos integrantes do conselho, previstos em lei.
No Planalto, auxiliares disseram que o presidente se confundiu e se referia a reunião de Conselho de Governo, como chamam o encontro entre ministros, o presidente e o vice-presidente.