Música

Aldir Blanc: álbum de inéditas rememora o compositor em toda sua completude

"Aldir Blanc Inédito" traz composições do artista carioca, com interpretação de Bethânia, Chico Buarque e Moacyr Luz, entre outros

Aldir Blanc, poeta, compositor e cronista brasileiro - Fotos Públicas

Das inteirezas que podem condensar a vastidão do universo de Aldir Blanc, um disco de inéditas com letras e melodias deixadas pelo artista carioca – que em maio de 2020 integrou o somatório de milhares que se foram vítimas da Covid-19 no País – fincaria seu legado memorável.

E assim se fez com “Aldir Blanc Inédito”, álbum lançado pela Biscoito Fino e com nomes como Maria Bethânia, João Bosco, Guinga e Moacyr Luz, entre outros, escolhidos para dar voz ao cancioneiro de um dos maiorais do Brasil e que, dentro do que lhe coube como cronista, poeta e compositor, foi (é) fundamental. “Tem material para fazer discos volumes dois, três, quatro”, contou Moacyr, dentre os parceiros de Aldir, um dos mais longínquos.

 

Inédito, atemporal, primoroso
Com capa de Elifas Andreato e a sutileza de uma caneta-tinteiro que a estampa, o material garimpado por Mary Sá Freire, viúva de Aldir, esbanja em doze faixas, de papos de botequim a repousos sofridos em melodias (romanticamente) torturantes.

Um trabalho que se move por todos os lados e se faz atemporal e, portanto, audível a qualquer hora e em qualquer lugar. “Foi um privilégio ter convivido com ele. Fizemos nossa primeira (música) em 1984 e somamos outras dezenas”, contou Moacyr Luz, em bate-papo com a Folha de Pernambuco. 

 

Moacyr Luz, cantor e compositor                         Crédito: Marluce Martins

No disco, ele assina “Palácio de Lágrimas”, interpretada por Bethânia. “Mary disponibilizou letras avulsas que estavam guardadas. Aldir e eu batíamos essa bola e quase sempre a segunda parte das músicas era minha. Devo ter pelo menos uma dúzia de inéditas com ele, ainda não gravadas. Perdi um parceiro e amigo, sigo sem querer pensar muito na partida dele”, ressente-se. Ele também assina e canta “Mulher Lunar” e tem sua “Acalento”, composta junto a Aldir e João Bosco, interpretada por Ana de Hollanda. 

Aldir pelos amigos
João Bosco, a propósito, abre o disco em tom de levada de samba “puxado a cavaco e violão” em “Agora eu Sou Diretoria”. Já “Baião da Muda”, parceria com Nei Lopes e Moyseis Marques, amplia o universo de Aldir, assim como em “Voo Cego”, com Leandro Braga e interpretação de Chico Buarque e “Navio Negreiro”, dueto memorável de Leila Pinheiro e Guinga que reforça a opulência do álbum.

João Bosco, cantor e compositor          Crédito: Reprodução/Instagram

“Aqui, Daqui”, com Joyce Moreno e “Outro Último Desejo”, com Clarisse Grova, enveredam pelas parcerias femininas, completadas por Sueli Costa em “Ator de Pantomima”, faixa que disseca realidades (próximas) quando fala sobre a ridicularização da morte “(...) em cada ato que o rei realiza”. 

Ela antecede “Virulência”, a derradeira e assinada pelo ator Alexandre Nero, parceiro recente e que, na canção, canta “um vírus que nos virou do avesso”, esboçando o quão Aldir testemunhou histórias e não hesitou em contá-las. Como diria Chico Buarque “Aldir Blanc é uma glória, das letras cariocas, bom de se ler e ouvir, bom de esbaldar de rir, bom de se Aldir”.

“Ainda há muito a trilhar”
Mary Sá Freire segue tomada por sentimentos - de amor e de saudade. Emocionada, absteve-se em falar sobre memórias que a remetiam ao compositor carioca, seu companheiro por mais de três décadas. Ainda assim, não hesitou em falar sobre o “seguir honrando o legado de generosidade e amor incondicional à vida” que pairavam sobre Aldir Blanc.

 

“Aldir faria 75 anos, manter sua memória é fundamental para nós que convivemos com ele. Então, pesquisando em arquivos do computador, pastas específicas de poesias e letras separadas por parceiros – dos mais constantes, como João Bosco, Moacyr Luz, Guinga e Cristovão Bastos aos eventuais parceiros e parceiras, fomos montando as peças. 

Letras e poesias musicadas e vice-versa, melodias procurando as letras. Os encontros se deram e quase 30 inéditas estavam prontas para serem publicadas. A Biscoito Fino abraçou a ideia e produziu esse belo álbum com 12 faixas. Agora, é seguir honrando o seu legado de generosidade e amor incondicional à vida:

 

“...Tudo que é triste eu torno sublime

de cada morte eu sei renascer 

- a covardia é um crime.

Cada história que acabar

viro a folha e recomeço.”

Ainda há muito a trilhar”