Congresso flexibiliza regra para governo usar espaço orçamentário do Bolsa Família
A economia está sendo gerada pela liberação dos chamados créditos extraordinários durante a pandemia de Covid-19.
O governo vai poder usar a economia a ser observada no Bolsa Família em 2021 em qualquer outra despesa do Executivo, de acordo com um projeto de lei aprovado pelo Congresso nesta semana.
A economia está sendo gerada pela liberação dos chamados créditos extraordinários durante a pandemia de Covid-19. Os instrumentos não fazem parte do Orçamento e são permitidos pela Constituição em casos de imprevisibilidade e urgência.
Como os créditos extraordinários foram emitidos para pagar o auxílio emergencial, e os pagamentos substituem o Bolsa Família na maior parte dos casos, será aberto um espaço no Orçamento calculado até agora em R$ 9,4 bilhões.
Esse era o espaço reservado até agora para o Bolsa Família dentro do teto de gastos -regra que impede o crescimento real das despesas federais. O intervalo agora poderá ser usado para praticamente qualquer tipo de programa.
Antes, o uso desse espaço era restrito. Acórdão do TCU (Tribunal de Contas da União) estabelecia desde o ano passado que a economia no Bolsa Família só poderia bancar despesas com a pandemia ou com a mesma função orçamentária anterior -no caso, a assistência social.
O governo pediu uma maior flexibilização ao Congresso, para que os recursos pudessem ser usados também nas prioridades elencadas para o ano -o que incluía a agenda para a primeira infância e o programa habitacional Casa Verde e Amarela, por exemplo.
Os congressistas foram além e aprovaram o uso dos recursos para qualquer possibilidade dentre as despesas primárias -isto é, exceto gastos com juros.
O projeto de lei em questão é o PLN 12, que altera a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2021. O relator da matéria na Câmara foi o deputado federal Juscelino Filho (DEM-MA), que fez alterações no texto enviado pelo Executivo.
O texto aprovado diz que, se os créditos extraordinários possibilitarem uma redução de despesas primárias, a margem em relação aos limites do teto poderá ser usada para "outras despesas primárias no âmbito do Poder Executivo".
"Essa é uma medida preocupante, porque abre um flanco para expansão de gastos em um momento de fragilidade das contas públicas", afirma Felipe Salto, diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente, órgão do Senado que monitora as contas públicas).
"Contabilidade criativa, riscos à LRF [Lei de Responsabilidade Fiscal] e ao arcabouço fiscal. Este é o debate suscitado pelo PLN 12", afirmou Salto, em rede social.
Como o auxílio emergencial poupa recursos do Bolsa Família, a eventual prorrogação pode gerar ainda mais espaço para outras iniciativas do governo neste ano.
Membros do governo afirmam que a prorrogação é uma alternativa em discussão no Executivo e no Congresso, mas usam como justificativa a necessidade de não deixar milhões de pessoas sem auxílio a partir de novembro.
Segundo eles, o objetivo seria atender a parcela de público que não será contemplada pelo Auxílio Brasil e que pararia de receber o auxílio emergencial. Mas interlocutores ressaltam que não há nada definido e, até agora, o Ministério da Economia tem resistido à ideia da prorrogação.
O projeto de lei é o mesmo que autorizou outras manobras, como a que dá aval para o Executivo usar propostas ainda em tramitação como forma de compensar novas despesas em programas de transferência de renda.
Na prática, isso protegerá o Auxílio Brasil (substituto do Bolsa Família) -que ainda depende, nos planos do governo, do projeto do Imposto de Renda (IR) para não ferir a LRF. O projeto do IR ainda precisa de aprovação do Senado.
A LRF exige uma compensação no caso de novas despesas de caráter obrigatório e continuado, o que pode ser feito via corte de gastos ou novas receitas.
Em outro trecho, o projeto extingue um trecho da LDO que evitava a redução de recursos previstos no Orçamento para área da Saúde.
Também foi retirada do projeto uma trava que exigia dos municípios de até 50 mil habitantes comprovação de adimplência para receber transferências voluntárias.
O texto também desobrigou o governo de apresentar justificativa pela não execução de programação orçamentária prevista, quando a diferença for inferior a 1%. Segundo o governo, tratava-se de uma exigência excessiva.
O secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, afirmou nesta terça-feira (28) que o governo ainda não recebeu formalmente do Congresso o projeto aprovado.
Questionado se há algum ponto com o qual Tesouro não concorda no texto, ele disse que, a partir do recebimento da peça, o governo analisará o texto para se pronunciar sobre uma eventual discordância antes da sanção do presidente.