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Reformas de Bolsonaro são resultado da ação de Temer, diz líder de entidade liberal

Temer e Bolsonaro - Alan Santos/PR

Quem foi o presidente mais liberal do Brasil nos últimos anos, ao menos em matérias econômicas?

Até pouco tempo atrás havia vários argumentos para dar o troféu para Jair Bolsonaro, com seu ministro da Economia formado na Escola de Chicago e a promessa feita na campanha eleitoral de 2018 de "menos Brasília e mais Brasil".

Recentemente, no entanto, quem tem conquistado corações e mentes liberais é Michel Temer (MDB), que governou entre 2016 e 2018, cada vez mais reconhecido por eles como responsável por conseguir aprovar as mais relevantes reformas econômicas do Brasil da última década.

Não apenas isso: a avaliação é de que várias das matérias que Bolsonaro conseguiu aprovar na agenda liberal são resultado do legado deixado pelo antecessor, que não teve tempo de concretizá-las.


Um dos entusiastas do papel que teve o ex-presidente é o economista gaúcho Gabriel Torres, 35, presidente do IEE (Instituto de Estudos Empresariais), um dos principais centros formadores de lideranças liberais no país.

"Tudo que já estava no pipeline [bem encaminhado] no governo Temer avançou. Você tinha uma agenda bem forte lá de reformas. E o que não estava no pipeline não avançou. Claramente não havia uma ligação do próprio Bolsonaro com esses temas", diz Torres.

Exemplos de reformas cujo terreno foi preparado por Temer são as mudanças na Previdência, a privatização da Eletrobras, o marco do saneamento básico e o programa de concessões na área de infraestrutura, em ferrovias, portos, rodovias e aeroportos.

Ele não esconde a frustração com o que foi realizado nesse governo na comparação com as ambiciosas promessas de 2018, quando Bolsonaro inventou a figura do seu "posto Ipiranga", o ministro Paulo Guedes.
"Paulo Guedes está lá, tentando fazer essa agenda andar, mas faz sentido ainda? O mercado em geral, do empreendedor ao dono da padaria, entendeu que a capacidade de gerar impacto dele é bem menor que a promessa", afirma.

No chamado movimento liberal, que tem crescido bastante nos últimos anos, o IEE tem bastante peso. É ele o organizador do principal evento liberal do país, o Fórum da Liberdade, que ocorre em Porto Alegre (RS) sempre no mês de abril.

No ano que vem, o Fórum completa 35 anos, e a expectativa é que volte a ser presencial, ao menos parcialmente, após duas edições online. Neste ano, foram 17 mil pessoas que acompanharam as discussões, número que Torres espera aumentar para 32 mil em 2022, juntando quem comparece presencial e virtualmente.

Inevitavelmente, um dos assuntos que permearão o evento será a sucessão presidencial. Em 2018, os organizadores do Fórum convidaram os principais candidatos para debater a agenda de reformas para o país, mesmo aqueles cujas ideias estão distantes dos princípios liberais. A ideia é repetir a dose no ano que vem.
"Queremos levar todos os candidatos. A democracia é um dos aspectos da liberdade", afirma o economista. "Inclusive Lula, ele está convidado", reforça.

Os liberais são uma força crescente na política brasileira, embora ainda distantes da relevância que têm outros grupos, à direita ou à esquerda. "As pessoas perderam a vergonha de serem liberais. O liberalismo entrou no mainstream", afirma Torres.

Como todo movimento que cresce, o liberalismo também se fragmenta, e por isso não se comportará como um bloco em 2022. Ao contrário, muitos liberais estão órfãos, especialmente após a única legenda assumidamente seguidora dessa linha ideológica, o Partido Novo, ter entrado em crise existencial.

Segundo Torres, os liberais nunca cogitariam votar em Lula, apesar de alguns acenos que o petista fez ao mercado durante seus dois governos. A novidade é que também não há entusiasmo com Bolsonaro. Por isso, a preferência é mesmo por um candidato da chamada terceira via, ou do centro.

"O sentimento geral é de que é importante haver uma força centrista, reformista. O principal tema para nós são as reformas fundamentais para o país, as privatizações, as mudanças no tamanho do Estado. É ter coragem, por exemplo, de fatiar a Petrobras e depois vendê-la inteira", afirma.

Torres assumiu a presidência do IEE em maio, para um mandato de um ano, como é a tradição no instituto. Formado em economia pela Universidade Federal dos Rio Grande do Sul (UFRGS), com mestrado pela mesma universidade, trabalhou como economista na Federação das Indústrias do RS (Fiergs) e na Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre, além de uma corretora.

Teve uma única experiência no setor público, quando foi secretário-executivo adjunto de Gestão na Prefeitura de São Paulo, durante os governos tucanos de João Doria e Bruno Covas, em 2017 e 2018. Foi chamado para o cargo pelo titular da pasta, Paulo Uebel, ex-presidente do IEE e que depois migraria para a equipe de Guedes, de onde já saiu.

Por enquanto, Torres, que hoje trabalha com gestão de portfólios financeiros, não cogita uma volta à área pública, ou seguir carreira política. Era filiado ao Novo, partido que deixou quando assumiu o IEE, segundo ele para evitar conflitos de interesses.

Como todo o país, ele aguarda com um misto de ansiedade e preocupação o calendário eleitoral do ano que vem, que pode muito bem resultar em mais uma vitória de Lula. Se isso acontecer, diz, nada muda para os liberais.

"Se Lula ganhar, vamos continuar fazendo o que sempre fizemos nos últimos 40 anos, que é defender nossas pautas. Não há nenhuma expectativa sobre ele ter uma agenda liberal, mas sempre podemos ser surpreendidos. Ele fez uma minirreforma da Previdência, afinal".