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Vencedora do Nobel da Paz critica ambiente de desinformação no Facebook

Maria Ressa disse que o Facebook falha em proteger suas plataformas contra a propagação de fake news e é "tendencioso em relação aos fatos"

Jornalista filipino-americana Maria Ressa - Noel Celis / AFP

A jornalista filipino-americana Maria Ressa, que nesta sexta-feira (8) ganhou o Nobel da Paz ao lado do russo Dmitri Muratov, vem preenchendo suas primeiras declarações públicas após a premiação com dois alertas: a necessidade de promover a segurança dos profissionais da imprensa e o perigo da disseminação do ódio e da desinformação nas redes sociais.

Em entrevista à agência de notícias Reuters, Ressa, 58, disse que o Facebook falha em proteger suas plataformas contra a propagação de fake news e é "tendencioso em relação aos fatos", o que oxigena as recentes ameaças à democracia em diferentes países.

"[Os algoritmos do Facebook] priorizam a disseminação de mentiras misturadas com raiva e ódio em detrimento dos fatos", disse Ressa, editora do site de jornalismo investigativo Rappler, alvo constante de tentativas de silenciamento por parte do governo de Rodrigo Duterte nas Filipinas.

Os comentários da premiada jornalista, escolhida em 2018 pela revista Time como uma das Pessoas do Ano, vêm poucos dias após uma ex-funcionária do Facebook vazar documentos que detalham como a empresa sabia que seus sites eram potencialmente prejudiciais para a saúde mental dos jovens e pedir, em depoimento no Congresso dos EUA, a regulamentação do gigante das redes sociais.

À Reuters, um porta-voz do Facebook disse que a empresa continua investindo para remover e reduzir a visibilidade de conteúdo prejudicial e que "acredita na liberdade de imprensa e apoia organizações de notícias e jornalistas em todo o mundo".

Ressa tem debatido o que caracteriza como uma circulação livre de mentiras nas redes sociais ao longo dos últimos anos. Em entrevista à Folha em 2018, disse que as plataformas não assumiram a responsabilidade de proteger as informações na esfera pública.

"Seus algoritmos tratam mentiras e fatos da mesma forma, o que põe em perigo democracias no mundo todo", afirmou na ocasião. "Achamos que é possível limpar esse lodo tóxico e usar a ferramenta para construir instituições de baixo para cima."

Ela e o Rappler têm sido alvos de campanhas de ódio nas redes sociais por apoiadores do presidente Rodrigo Duterte –ataques que a jornalista descreve como armas de silenciamento. Reportagens do veículo que co-fundou mostraram a estratégia do governo de usar blogueiros para incitar raiva entre os apoiadores online que, por sua vez, ameaçam e descredibilizam os críticos de Duterte.

"A ideia de 'nós contra eles' não foi criada pelos jornalistas, mas sim pelas pessoas que estão no poder, que apostam em uma maneira de governar que divide a sociedade", disse, em entrevista à agência AFP. Frente a esse cenário, o prêmio do Nobel da Paz é uma "dose de adrenalina".

O presidente filipino não comentou a premiação de Ressa. Em breve, Duterte se despede do cargo, mas o cenário pré-eleitoral indica que um governo de continuidade pode vencer nas eleições de maio de 2022. O chefe de Estado anunciou, há uma semana, que não concorrerá a nenhuma posição, mesmo que viesse reiterando a ambição de disputar a Vice-Presidência.

Nesta sexta-feira (8), o chefe de polícia de seu governo, o senador Ronald dela Rosa, registrou sua candidatura à Presidência pelo partido governista. Ele foi responsável por supervisionar as execuções extrajudiciais patrocinadas pela gestão de Duterte na guerra contra as drogas, hoje investigadas pelo Tribunal Penal Internacional.

Segundo dados oficiais, cerca de 8.000 pessoas morreram em mais de 200 mil operações no arquipélago asiático desde 2016 –organizações de direitos humanos afirmam que os números reais são muito maiores.

A campanha "será uma batalha pelos fatos", disse Ressa, a 18ª mulher a ser laureada com o Nobel da Paz desde que a distinção começou a ser entregue, em 1901. "Continuaremos nos certificando de que nosso público veja os fatos e os entenda. A perseguição e a intimidação não vão nos calar", concluiu.