Patrimônio Cultural

Possível transferência de mural de Brennand para Boa Viagem gera polêmica

Obra 'Batalha dos Guararapes', de 1962, está localizada na rua das Flores, no bairro de Santo Antônio

Mural 'Batalha dos Guararapes', de Francisco Brennand - Léo Motta/Arquivo Folha de Pernambuco

O mural cerâmico “Batalha dos Guararapes”, um dos vários trabalhos públicos de Francisco Brennand espalhados pelo Recife, pode mudar de endereço. Isso porque o banco Santander, proprietário da obra, pretende restaurá-la e removê-la do bairro de Santo Antônio, na área central da Capital pernambucana, para uma agência em Boa Viagem, na rua Antônio Falcão.

A transferência foi aprovada pelo Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Cultural (CEPPC), com nove votos favoráveis e cinco contrários, em reunião realizada no dia 30 de setembro. Nesta semana, a decisão do órgão foi publicada no Diário Oficial do Estado, garantindo o andamento do processo. O poder municipal já havia autorizado a mudança, por meio de um decreto, desde agosto do ano passado.

Em nota divulgada por sua assessoria de comunicação, o Santander afirma que a iniciativa de realocação tem o objetivo de proteger o painel de atos de depredação e vandalismo. A empresa também garante que a obra permanecerá em área pública, com livre acesso a todos. “Trata-se de um projeto meticuloso, concebido após consultas aos poderes públicos das esferas municipal e estadual, seguindo todos os trâmites legais, preservando este patrimônio cultural para a posteridade”, diz o comunicado.
 

Com 33 metros de comprimento por 2,5 de altura, o mural foi criado por Brennand entre 1961 e 1962, por encomenda do extinto Banco da Lavoura de Minas Gerais. Está instalado na base da fachada lateral do edifício Tiradentes, na rua das Flores, atualmente protegido por tapumes, o que impede sua visualização pelos transeuntes. Além dos desenhos, textos de Ariano Suassuna e César Leal compõem a obra, cujo tombamento estadual foi aprovado em julho deste ano.

A permissão para a transferência, no entanto, é contestada por instituições como o Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco (CAU-PE), que aponta possíveis danos decorrentes da ação. “Primeiro, há o empobrecimento cultural de um bairro histórico, que acabará perdendo um dos seus bens culturais. Outra questão é o risco à integridade física da obra durante o processo de remoção das peças”, aponta Juliana Barreto, coordenadora da comissão de patrimônio cultural do CAU-PE.

Além de já ter solicitado que a autorização seja reconsiderada, o CAU-PE pretende apresentar denúncia ao Ministério Público Estadual, junto a outras entidades. No início deste mês, a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) enviou ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) o pedido de tombamento federal da obra.

“Hoje, no local onde está, o painel sofre com a presença de agentes biológicos, como urina e umidade, pichações, riscos e entulhos, que são problemas do Centro como um todo. Todas essas circunstâncias foram alegadas pelo banco e levadas em conta pelos conselheiros", conta Cássio Raniere, presidente do CEPPC. Ele explica que a decisão do colegiado foi tomada após uma análise técnica e jurídica da questão, tendo como base o decreto estadual de nº 36.249, de 17 de fevereiro de 2011.

O texto prevê a possibilidade de remoção de um bem tombado ou em processo de tombamento pelo Estado “na hipótese de fundamentada necessidade inadiável”. O mesmo artigo, no entanto, orienta que o bem retorne ao seu local de origem, uma vez cessada a causa que originou a sua transferência. Esse retorno não é mencionado na documentação entregue pelo banco ao CEPPC, que garante que o projeto só poderá ser executado respeitando a legislação vigente.