Não é cuidado paliativo, é homicídio, diz paciente da Prevent durante CPI
"O que fizeram lá com muitas famílias que perderam seus entes queridos não tem o nome de cuidados paliativos, tem o nome de homicídio. Homicídio doloso qualificado."
A frase é do advogado Tadeu Frederico de Andrade, primeiro a depor nesta quinta-feira (28) na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Câmara Municipal de São Paulo instaurada para apurar a atuação da Prevent Senior durante a pandemia de Covid.
Pacientes e parentes de pessoas atendidas pela operadora participaram da sessão e relataram suas percepções sobre a prática da empresa de tentar convencer familiares de idosos a adotar o que chamavam de cuidados paliativos.
A medida, segundo disseram, não teria o objetivo de melhorar a qualidade de vida e ampliar a sobrevida do paciente, mas sim de evitar custos com o tratamento na UTI, muito mais caro. Além disso, citaram a postergação dos diagnósticos e a realização de internações apenas após a piora dos sintomas.
Andrade já havia falado à CPI da Covid no Senado, quando também relatou pressão pela adoção do cuidado paliativo mesmo quando se julgava haver condições de o paciente ser tratado.
"Sou um dos poucos sobreviventes do procedimento que a Prevent tinha tomado como política interna de levar a óbito pacientes que estavam em estado grave, mas não eram terminais", disse Andrade ao vereadores nesta quinta.
Ele afirmou que os médicos queriam encaminhá-lo para os cuidados paliativos e que seu óbito aconteceria em poucos dias. No entanto, sua família resistiu e ele sobreviveu.
"Fiquei 120 dias internado e era para estar indo a óbito já no primeiro mês. Porque estava na UTI, intubado, internado, gerando custo e a desculpa foi essa, que eu não tinha salvação. E hoje sabemos que dezenas, talvez centenas de famílias foram convencidas com esse conceito de cuidado paliativo", disse.
O escritor Gilberto Nascimento também afirmou que os médicos da operadora quiseram convencer seus familiares a aceitar que sua mãe, Terezinha, fosse mandada para os cuidados paliativos. Ele disse que seus parentes entreouviram uma conversa dos médicos, na qual um deles perguntou: "Para que internar uma pessoa de 90 anos?".
A família resistiu, mas a idosa foi intubada e mandada não para a unidade intensiva, mas para um setor diferente. De acordo com o relato, só depois ela foi deslocada para a UTI, mas acabou morrendo.
"Todas as pessoas idosas que deram entrada na Prevent Senior, a maneira de agir, de abordar, as conversas eram todas iguais. Nós nos sentimos completamente enganados", afirmou. "Era um procedimento no sentido de convencer a família a todo custo de aceitar os cuidados paliativos."
Tomás Monge, neto de uma paciente de 94 anos que morreu, relatou situação semelhante. "Depois de tudo que foi mostrado, para mim fica muito claro que é uma prática escabrosa", disse. "A gente nunca vai saber se a minha avó tinha condições de lutar."
Tércio Felippe Mucedolia Bamonte, que perdeu o pai de 71 anos, afirmou que os sintomas dele foram tratados como "preguiça"
pela operadora. Ao chegar ao hospital, o paciente era mandado embora.
"Ele se arrastando, mal conseguindo falar, a Prevent mandava de volta para casa. Foram quatro vezes que isso aconteceu", disse.
Bamonte disse que chegou a ouvir dos profissionais que atenderam seu pai que ele estava "preguiçoso" e precisava se alimentar.
Posteriormente, quando uma tomografia confirmou o diagnóstico de Covid, teve prescrição de hidroxicloroquina, tratamento sem eficácia contra o coronavírus.
"A Prevent tirou de nós a possibilidade de tratamento, de cura, quando ciente de que ele tinha Covid mandou para casa. A minha percepção é que eles queriam que meu pai morresse em casa", disse.
Também foi ouvida Andréa Rota, viúva de um homem de 51 anos que morreu após tratamento na operadora.
Ela relatou que o marido foi tratado com o chamado "kit Covid", pacote de medicamentos ineficazes contra a doença. Segundo seu depoimento, os sintomas dele, que tinha problemas cardíacos, foram piorando. O atendimento também apresentou várias falhas, disse.
"Eles não fizeram nem o mínimo pelo Fabio. Não tenho dúvida de que não era para o Fabio ter morrido", disse.
As CPIs na Câmara podem ter 120 dias, prorrogáveis duas vezes por igual período, fazendo com que os trabalhos se estendam por quase um ano.
Questionada, a Prevent Senior negou que adotasse procedimentos para liberar leitos e reduzir custos.
"Em relação aos depoimentos de familiares à CPI da Covid na Câmara Municipal, a Prevent Senior lamenta a dor sofrida pelas perdas. Reafirma que jamais tratou seus pacientes adotando procedimentos com o objetivo de reduzir custos ou liberar leitos. Trata-se de uma narrativa mentirosa, equivocada, com o objetivo de atingir a imagem da empresa. A Prevent continuará prestando atendimento de qualidade aos mais de 550 mil beneficiários e buscará na Justiça a retratação de todos os que buscam desacreditá-la", diz a nota da operadora.