Música

Ana de Hollanda retorna ao cenário musical com o autoral "Vivemos"

Disco, disponível nas plataformas digitais e também formato físico, é o quarto da carreira de Ana de Hollanda

Ana de Hollanda, cantora e compositora - Léo Aversa

Não deve ser lá essas coisas de muito fácil ser irmã de Chico Buarque, nome inconteste da música brasileira. Ana de Hollanda, literalmente, sofre desse “bem” na pele e, como cantora e letrista, é justificável que hesite em mostrar-se em um universo que, por vezes, postula que algumas trajetórias sejam pautadas por referências - como naturalmente Chico é no quesito ‘fazedor de arte’. 

Sambas, toadas, boleros
No entanto, desde o início da década de 1980 com o disco inaugural, e na sequência com “Tão Simples” (1995), “Um Filme” (2001) e “Só na Canção” (2009) e, na última sexta-feira (29) com o novo trabalho “Vivemos” (Biscoito Fino), disponível em formatos físico e digital, ela esboça o desejo de ser do teatro, da dramaturgia, das políticas culturais e, em especial, da música e do cancioneiro autoral, em onze faixas entremeadas por sambas, toada, boleros e belos arranjos.

Álbum costurado com parceria
Em meio a uma diversidade de parceiros, “Verão que Ficou” abre o álbum, com melodia do saxofonista e arranjador mineiro Nivaldo Ornellas.

Em seguida “Outono” chega com toada do compositor paulistano Lula Barbosa e ares tipicamente caipiras em letra que resvala em frases do tipo “Meu amor eu tenho que partir/Não sou eu que invento o meu gostar”. Em tom de lamento, “O Que Eu Deixei Cair” tem letra de Ana e de Nilson Chaves e vem próxima à faixa “Jamais Decifrei”, uma das que ela assina com Cristóvão e que traz, o tanto quanto, em ritmo de bolero, narrativa carregada de incógnita explícita, por exemplo em “Foi você/Foi talvez você/Foi talvez você que se desfez na multidão/Foi Luiz/Foi José Luiz/Ou uma mulher a me escapar com aflição”.



Já “Fantasia”, samba escrito junto com Marcelo Menezes, vem entre as duas canções e desperta levezas de uma Ana Hollanda avó, que responde com música ao neto de sete anos após ter sido desafiada por ele em uma brincadeira de futebol. “Fantasias que eram minhas/Você vem desafiar/Me acusando de medinho/Por num drible me humilhar/Já fui craque, fiz firulas/Zonzeei quem me enfrentou/Fui um Messi no meu bairro/Não duvide qu’inda sou”.

Dona Ivone Lara
Em “Primeira Dama”, Leandro Braga cede melodia para letra de Ana de Hollanda a Dona Ivone Lara, a quem Leandro acompanhou por algum tempo. “Eu contigo toquei a leveza do acorde/E de ti copiei pura inspiração/Sendo filho de leite, suguei tua fonte/Tateando as cordas, guiaste a minha mão” explicita a devoção pela compositora carioca.
 

Crédito: Léo Aversa

“Botucuxi”, parceria com Simone Guimaraes, entoa sobre o Tucuxi, boto da Amazônia e em parceria com Lucina, “Era tão Claro” e “Vivemos” - esta última, faixa que encerra o disco e dá nome ao álbum - há uma mescla respectiva de noites insones que às quatro da manhã culminam em uma “Noite amassada em lençóis” e de vivências plurais refletidas nas canções que perfazem o disco. 

“Berço Vazio”, também com Braga, entrega sutilezas, ao mesmo tempo que traz em letra a intensidade da dor da perda de um filho e “Sem Fim” projeta a artista em ares confessionais e assinala no disco - que traz Cristóvão Bastos na produção, arranjos e piano, além de João Lyra (violas e guitarra) e Zé Leal (percussão) - sua destreza em fazer repousar melodias em letras escritas sob esmero.