Bolsonaro diz a investidores em Dubai que Amazônia 'não pega fogo' e 'ataques' 'não são justos'
Durante evento para captação de negócios, presidente convidou árabes a conhecer 'o Brasil de fato'
Em uma tentativa de melhorar a imagem ambiental do Brasil no exterior, o presidente Jair Bolsonaro disse nesta segunda-feira a uma plateia de empresários e investidores em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, que as críticas recebidas por seu governo nessa área não são justas.
Contrariando dados sobre desmatamento e queimadas reunidos pelo próprio governo, o presidente disse que a floresta amazônica está intocada desde 1500. Afirmou que a Amazônia não “pega fogo ,"por ser uma floresta úmida”.
"Nós queremos que os senhores conheçam o Brasil de fato. Uma viagem, um passeio pela Amazônia, é algo fantástico, até para que os senhores vejam que a nossa Amazônia, por ser uma floresta úmida, não pega fogo. Que os senhores vejam realmente o que ela tem. Com toda certeza, uma viagem inesquecível", afirmou Bolsonaro, durante a abertura do evento "Invest in Brasil Forum", em Dubai.
'Quem gosta de ver pobre roendo osso é o Bolsonaro': MTST rebate críticas a foto de Wagner Moura comendo quentinha de camarão
Não é a primeira vez que o presidente usa esse argumento para dizer que a Amazônia não pega fogo, mas os dados reunidos por órgãos do governo federal desmentem a fala de Bolsonaro. Apesar de úmida, a Amazônia registra incêndios. Os de maiores proporções não têm origem natural e são provocados pela ação do homem, ligados ao desmatamento, que busca limpar a área derrubada para tomar posse de terras públicas.
Em agosto deste ano, por exemplo, foram registrados 28.060 focos de calor na Amazônia, apontam dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe). Foi o terceiro maior índice para o mês desde 2010, abaixo apenas de 2019 e 2020. Em junho, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou o maior número de focos para o mês em 14 anos.
Entre agosto de 2019 e setembro de 2020, o mesmo Inpe, vinculado ao governo federal, mostrou que mais de um terço dos quase 150 mil focos de queimadas ocorridos na Amazônia no período aconteceram em terras públicas sem destinação.
Além dos registros de focos de queimada, os dados de desmatamento do Inpe também derrubam a tese de Jair Bolsonaro. No mês passado, por exemplo, de acordo com o monitoramento do sistema Deter-B, via satélite, houve o pior resultado para meses de outubro dentro da série histórica, que se iniciou em 2016, com a identificação de 877 km² de área desmatada na Amazônia.
No ciclo anual de agosto de 2019 a julho de 2020, o governo atual já havia protagonizado o recorde da série histórica do Deter-B, com resultado de 9.216 km² desmatados na região amazônica. Diante disso, o governo estipulou, na época, o objetivo de alcançar uma redução de 10% neste ano, o que não foi cumprido. No último ciclo (de agosto 2020 a julho 2021)o resultado foi de 8.712 km² desmatados, ou seja, número 5,47% menor, metade da meta.
Em agosto, o vice-presidente Hamilton Mourão, coordenador do Conselho da Amazônia, já havia admitido o fracasso da promessa em agosto, quando afirmou, na ocasião.
"Provavelmente não vou cumprir aquilo que eu achava que seria o nosso papel de chegar a 10% de redução. Acho que vai dar na faixa de 4% a 5%, uma redução muito pequena, muito irrisória, mas já é um caminho andado".
Mas, para Bolsonaro, as críticas que o seu governo sofre não são justos, conforme afirmou nesta segunda.
"Além de turismo, conhecer aquilo que seria um paraíso aqui na Terra. A Amazônia é um patrimônio, a Amazônia é brasileira. E vocês lá comprovarão isso e trarão realmente uma imagem que condiz com a realidade. Os ataques que o Brasil sofre, quando se fala em Amazônia, não são justos. Lá, mais de 90% daquela área está preservada, está exatamente igual quando foi descoberto no ano de 1500. A Amazônia é fantástica", disse Bolsonaro.
A fala de Bolsonaro seguiu a cartilha elaborada pelo governo para o evento e revelada pelo GLOBO no início do mês, pintando um Brasil sem desmatamento, sem poluição e com o respeito à legislação ambiental.
Na feira, presidente também defendeu a agricultura do país e convidou investidores de Dubai a se interessarem pela área.
"Temos uma das agriculturas mais pujantes do mundo. Alimentamos mais de 1 bilhão de pessoas pelo mundo. Sabemos da nossa responsabilidade. Todos sabem que qualquer país busca a sua segurança alimentar. O Brasil está de portas abertas para negócios voltados para a agricultura", afirmou.
Bolsonaro ainda afirmou que os países árabes "são um dos parceiros preferidos" pelo Brasil e que já os considera a sau segunda casa.
Mais tarde, na abertura do evento “Dia do Brasil” em Dubai, Bolsonaro repetiu a defesa ao agronegócio que, segundo ele, alimenta um bilhão de pessoas no mundo. Disse que está ganhando “confiança, respeito, consideração e carinho pelo mundo” e voltou a pedir que os investidores visitem a Amazônia.
No sábado, primeiro dia da viagem oficial ao Oriente Médio, Bolsonaro reclamou que o Brasil teria sido "atacado" na COP 26, a Conferência do Clima organizada pela ONU, em Glasgow.
Bolsonaro não foi à COP, mas integrantes do governo representaram o país. A gestão de Bolsonaro vem sendo criticada pela comunidade internacional desde 2019, quando começou o governo, em razão da postura do presidente em relação ao meio ambiente.
No mesmo evento, organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Apex, o ministro das Relações Exteriores, Carlos França, repetiu a mensagem de Bolsonaro em defesa da sustentabilidade.
França disse que o Brasil se comprometeu, na COP26, com uma meta ambiciosa de redução de emissão de gases de efeito estufa. Ele também mencionou esforços do governo na redução do desmatamento.
"Desde 2019, o governo, com apoio das Forças Armadas, têm implementado políticas contra crimes ambientais. Os desafios de cuidar do meio ambiente num país de dimensões continentais como o Brasil são imensos, mas o Brasil tem envidado esforços bem sucedidos nesse setor", disse França.
Durante a abertura do evento, o presidente também fez propaganda do cargueiro KC-390 fabricado pela Embraer. A aeronave é motivo de atrito entre a fabricante e a Força Aérea Brasileira (FAB), que anunciou a redução da compra de unidades da aeronave – de 28 para 15.
A Embraer declarou que adotará medidas cabíveis em relação ao acordo com a FAB, o que sinaliza um possível litígio na Justiça. O governo deseja abrir uma renegociação com a empresa.