Nem perdão, nem equilíbrio: troglodismo e preconceito resistem a decompor no Sport
O genial Albert Einstein ja dizia que "é mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito". Gostaria de ter orgulho para falar de um gesto de inteligência emocional oriundo do Conselho Deliberativo do Sport Club do Recife. Isso seria hoje uma atitude de sapiência, imposta como resposta a uma vergonha pública, propagada por conta de um grave erro cometido antes. Mas, a velha soberba se superou. Assim, em vez do orgulho, o que me restou foi um amargo engulho, de quem reage descrente diante da prevalência do absurdo.
É uma pena ter que encarar a perda de uma energia agregadora, só para comentar sobre temas que causam prazer às cabeças dos que se contaminam com a indigência cognitiva em voga. É duro amanhecer sob os riscos de contaminações predatórias causadas por tantas formas de ódio. Senti que a noite do dia 09 de novembro será para o Sport um péssimo referencial, tal e qual foi a fatídica noite de São Bartolomeu na França, naquele longínquo 1572. Infelizmente, a sala do Conselho Deliberativo do Sport, um espaço estabelecido para um exercício democrático e propicio ao debate respeitoso em torno de pessoas e ideias diferentes, foi palco de uma tragédia civilizatória.
De fato, um massacre foi promovido pela maioria dos conselheiros presentes, como uma reação descomunal contrária à opção sexual de um torcedor, meses atrás atingido na sua dignidade cidadã e rubro-negra, por um ato descabido e injurioso da parte de um conselheiro. Se, antes, a atitude individual foi absolutamente carregada de preconceito e soberba, a resposta da avaliação colegiada sobre o gesto foi ainda pior. Afinal, ratificou-se o indefensável e exercitou-se o poder autoritário e absoluto. Neste particular, através de uma forma agressiva para expulsar da sala um membro da diretoria executiva. Justo quem cuida exatamente do tema, retirado do ambiente sob gritos descontrolados com pitadas de preconceito. Sem dúvida, algo incondizente com as regras de convivência humana.
Confesso que me envergonho com cenas de troglodismo ideológico, inconsistentes com o mundo que vivemos hoje. Perceber que isso aconteceu no meu clube e diante do fato de estar o assunto afeito ao futebol - o esporte mais popular do país - tudo isso repercute muito mal. Não há o menor cabimento, para quem quer que seja, "desconsiderar" a paixão torcedora de pessoas que sejam LGBTIQIA+. É evidente que a opção sexual não retira e nem acresce o amor pelo Sport, ou qualquer clube. Esse respeito já deveria ter sido conquistado há tempo, assim como, outros papéis ainda tratados com desdém e preconceito no clube, como a presença de mulheres, de afrodescendentes e até de pessoas de classe de renda inferior, nos altos escalões diretivos.
Em se tratando do ambiente político do Sport hoje, para minimizar decepções é melhor não jogar tantas fichas em muitos protagonistas. Afinal, não adianta serem incompreensivos com os sinais emitidos por um mundo que dispensam conhecer, para depois dizerem que quem decepciona é a sociedade.
Enfim, não é - e nem nunca será - a arrogância de uma elite preconceituosa que irá tirar do Sport sua condição de ser um clube popular e que dá valor à sua própria diversidade. Fora disso, o clube poderá arcar com os custos de insistir em viver como se estivesse à época de Guilherme Aquino.
*Economista e colunista da Folha de Pernambuco
- Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião do jornal. Os textos para este espaço devem ser enviados para o e-mail cartas@folhape.com.br e passam por uma curadoria para possível publicação.