Confira a entrevista com Bruno Becker, candidato à presidência do Náutico
Advogado concorre pela chapa "Náutico Sustentável", com Ivan Pinto da Rocha como vice
De possível candidato a vice-presidência pela situação a candidato à presidência pela oposição. Ou melhor, como ele prefere chamar, por um bloco “alternativo”. O ex-vice-presidente jurídico do Náutico, Bruno Becker, deixou a atual gestão do clube no mês passado, após divergências quanto ao processo de escolha dos novos candidatos. Reviravolta baseada, de acordo com o próprio, por uma vontade de “pensar fora da caixa”, além de criar um modelo sustentável, termo que o advogado usa na nomenclatura da chapa.
Confira abaixo a entrevista com Bruno Becker, candidato à presidência do Náutico pela chapa “Náutico Sustentável”. O vice é Ivan Pinto da Rocha
Por que você quer ser presidente?
O clube precisa seguir novos rumos. A chapa ‘Náutico Sustentável’ conseguiu aglutinar pessoas e ideias que podem tirar o clube dessa mesmice. Precisamos pensar fora da caixa, ousar, mas com responsabilidade. Precisamos discutir conceitos para não deixar o clube para trás. O desafio é grande, mas a vontade de fazer diferente é maior. E a certeza de que é possível fazer isso é maior ainda.
Saída da gestão de Edno Melo
Minha saída foi por conta de um processo interno de divergências. Quando você não vê perspectiva da realização de algo diferente, não há mais motivos para abraçar um projeto. Um ponto primordial, que já vinha observando, era a questão dos novos rumos. Não vislumbrava o clube seguindo isso. O processo de escolha da chapa da gestão agravou esse pensamento. Percebi que era apenas uma ‘dança de cadeiras’, corroborando com o sentimento que eu já nutria. Vi que o conceito continuaria o mesmo, a falta de projeto também. Preferi me afastar do clube. Quando saí, algumas pessoas me procuraram e perguntaram o que poderia ser feito. Sempre disse que minha saída não era por conta de pretensões eleitorais. Na última semana de inscrição da chapa, sentei com algumas pessoas e discutimos sobre o Náutico. Ali, percebi que, de fato, seria possível debater e definir novos rumos, apresentado à torcida e aos associados, em especial, essas possibilidades.
Negativa de convite para ser vice de Diógenes Braga
Houve o convite há três meses, mas eu já tinha comunicado que não seria. Achei que, para aquilo que estava se desenhando na gestão, eu não tinha o perfil necessário. Não acreditei no projeto e o ideal era colocar alguém que considerava correto o que estava sendo feito. Em momento algum, eu exigi ser o candidato a presidente. Se eu quisesse, teria saído de imediato. Permaneci na gestão, mas discordei do processo de escolha da chapa. Acredito que deveria ser algo mais debatido, com uma discussão mais madura, profissional, traçando um perfil.
Becker é “situação 2.0” ou “novo MTA?
Tenho plena convicção do meu trabalho no clube, dos motivos que me fizeram sair da gestão e como eu posso contribuir. O que me incomoda é tentar rotular pessoas ou grupos. Todo grupo tem quem fez bom trabalho e quem não teve êxito. Dizer que sou do MTA ou algum grupo determinado não existe. Se você olhar as chapas, vai ver que existem pessoas de vários segmentos. O MTA foi muito citado, inclusive recentemente pelo presidente Edno Melo. O movimento foi importante historicamente. Através dele, surgiu o que estamos vivendo hoje, com o bate-chapa. Elegeu um presidente (Glauber Vasconcelos), que teve acertos e erros, como todos. Se pegarmos hoje, a atual gestão tem pessoas sérias que estavam no MTA. O atual vice (Diógenes Braga) tem origem lá também. Acho que o Náutico perde muito, como instituição, com essas rotulações. Quem não é situação, semanticamente é oposição. Mas eu prefiro a palavra “alternativa”. Ela abarca o que a situação fez de positivo, até porque não existe uma gestão que só faz coisa ruim, e também serve para redirecionar o que não foi bom. Dizer que sou somente de “oposição” parece que está tudo errado. Não é bem assim. É preciso equilíbrio.
Opinião sobre os concorrentes na eleição
O bate-chapa é algo natural. O Náutico brigou muito para ter uma eleição direta para presidente. O que é ruim para o clube é uma campanha com agressão. Ou, após a eleição, continuar o bate-chapa. Eu não gosto de falar sobre pessoas. Não tenho algo contra Diógenes ou Plínio. Diógenes eu trabalhei com ele na antiga gestão e Plínio eu conheci apenas recentemente. Chegamos a conversar após minha saída do clube. Vejo que todos possuem boas ideias, querendo fazer algo pelo clube. Mas o foco está na ideia, no perfil. Quem deve julgar é o eleitor.
Posicionamento de atletas e comissão técnica nas eleições
Vejo isso com naturalidade. Quem se posiciona é a pessoa, não o treinador ou jogador. Eles se posicionam dentro do que acham melhor. O que não pode ocorrer, tanto deles como do candidato, é retaliar. Do tipo “se você se pronunciou contra, não vou renovar”. Isso ia misturar as obrigações profissionais com posições pessoais. A mesma coisa é não concordar com um sócio que votou em outra chapa e dizer que não o quero como sócio. Seria errado.
Permanência de Hélio e departamento de futebol
Acredito no trabalho de Hélio. Não somente ele como toda a comissão. Eles provaram que são capazes de seguir um bom rumo no clube. Óbvio que precisa de ajuste. A discussão é: quem está no grupo consegue suportar esse ajuste para trilhar o caminho de êxito? Entendo que Hélio e a comissão conseguem. A solução não passa por uma mudança de nomes. Sobre os atletas, é preciso uma análise com mais profundidade. Se for do desejo dele, eu quero que Hélio continue. Minha ideia é permanecer com o mesmo staff. Não posso, por exemplo, por uma questão ‘eleitoreira’, tirar Ari (Barros, executivo) ou qualquer outro. Minha ideia é não mexer nas peças, mas sim mudar conceitos.
Passivo trabalhista
Precisamos diferenciar o que é gerenciar passivo e o que é diminuir passivo. Quando o jurídico suspende um leilão, a gente não diminuiu, mas sim gerenciou para não ter um impacto drástico no clube. O modelo atual é assim. O passivo trabalhista só cresce. O Náutico destina 20% para pagar essas dívidas, mas a receita do clube não é suficiente para que essa porcentagem de fato diminua. Exemplo: se o clube teve uma receita mensal de R$ 1,5 milhão, a Justiça do Trabalho ficará com R$ 300 mil. Mas se os juros são de R$ 500 mil, o passivo vai aumentar. Precisamos de uma solução para reduzir o passivo. Quanto mais receita, mais poder de barganha para reduzir os débitos.
Lei da Sociedade Anônima do Futebol (SAF)
O Náutico precisa fazer uso das opções que estão disponíveis. Por exemplo, há a Lei da Sociedade Anônima do Futebol, que entrou em vigor em outubro. Ela traz uma série de situações para os clubes, desde a venda para um investidor, até a possibilidade de apresentar um plano de pagamento das dívidas. A lei permite que o passivo do clube seja levantado, propondo aos credores um plano para quitar os pagamentos, que pode ser de até 10 anos. Os juros não cresceriam exponencialmente. Também seria possível negociar as dívidas, montando de acordo com a receita da instituição. É mais flexível, diferente de hoje, que tem de ser 20%. A gente pode destinar um valor, mas, estando na Série A, pode amortizar mais. Na B, pode amortizar de outra forma. Além de tudo isso, ao reunir essas execuções, o clube deixa de correr risco de ter bens penhorados e contas bloqueadas. Para conseguir isso, é preciso estruturar o clube administrativamente. A lei exige que, para ter esse plano, é necessário demonstrar a receita orçamentária dos próximos três anos. Isso requer uma prática de governança, prestação de contas com transparência.
Trabalho com a base
Hélio deu uma declaração que foi uma crítica pertinente (sobre a falta de comunicação com a base e as dificuldades estruturais). Podemos encarar a realidade e ver em que podemos melhorar. O Náutico perdeu o selo de clube formador e isso mostra que existe um equívoco na estrutura. A base não é despesa, é investimento. Ela revela jogadores. É preciso cuidar da estrutura física, dando apoio. O coordenador-técnico deve conversar com os treinadores de todas as categorias sub. Não adianta um treinador do sub-15 implementar um conceito e, quando chegar no sub-17, existir outro. É necessária uma diretriz única, próxima a do time profissional. Caso contrário, ele vai passar sete, oito anos na base e, no time principal, ver que é tudo diferente. Tem de existir o diálogo. Indo de degrau a degrau, formaremos atletas para o time de cima. Acredito que o Náutico não chega a investir R$ 500 mil por ano na base. Sem um centro formador, o clube negociou a venda de Thiago. Se você investir mais, a chance de aparecer outros “Thiagos” é maior ainda.
Centro de Treinamento
Eu visitei o CT do Atlético/GO. Comparado ao do Náutico, a área é menor, mas é estruturada. Só entra profissionais autorizados, com bom controle de acesso. Tudo funciona. O CT do Náutico tem mais de 40 hectares. Tem área de preservação que não pode ser utilizada, mas podemos considerar o espaço como “complexo”. Podemos dividir em três partes: uma, que fica próxima da BR, que pode ser arrendada para empresas, sem se desfazer do patrimônio. Com o valor do aluguel, eu posso utilizar para manutenção do complexo. Outra parte pode ficar para uso do sócio e da comunidade. Existem recursos que o Governo disponibiliza para bancar projetos sociais. A terceira, que é propriamente o CT, com os campos e o hotel, nós podemos estruturar mais, gerenciando o espaço de maneira profissional.
Aflitos
Fazer os Aflitos mais rentável não é futuro, é necessidade presente. Já existe um projeto sobre o estádio, mas ainda precisa ser realizada a segunda etapa. No meu entendimento, é incoerente pensar nesta etapa se a primeira ainda deixa a desejar. Não tenho um banheiro de acessibilidade, de família. A segunda envolve a questão de fazer uma praça integrada ao bairro, tirando o muro da Manoel de Carvalho para colocar bares, lanchonetes, mexendo na arquibancada também e criando camarotes. Mas isso não é possível de ser feito em um ano. Primeiro, temos de cuidar do básico.
Campanha de sócios e marketing
Não podemos esperar resultados diferentes fazendo a mesma coisa. As campanhas de sócios nos últimos 10, 15 anos são muito similares. Parte do apelo de pedir ajuda ao clube, dando no máximo desconto em camisa ou ingresso. No meu ponto de vista, não surte o efeito planejado. Primeiro, temos de ter especialistas em marketing esportivo. Segundo, é preciso pensar: é mais fácil o torcedor fazer um PIX de R$ 10, R$ 50 reais para simplesmente ajudar o clube ou para concorrer a um sorteio de uma vaga para sair com a delegação para um jogo nos Aflitos? Dos vários cursos que fiz sobre gestão, vi um exemplo extraordinário, bem diferente. Um clube, da oitava divisão da Inglaterra, desenvolveu um projeto para o torcedor ser treinador do time por um dia. Um “rachão” no CT ou em uma reapresentação, que não ia interferir na preparação da equipe em um campeonato. A adesão foi algo absurda na época. Vamos ver o que existe e adaptar para aqui, sempre pensando fora da caixa.
Futebol feminino e esportes olímpicos
Existe o torcedor que só quer saber do futebol masculino profissional. Mas tem outro grupo que quer saber do futsal ou do futebol feminino. É preciso dar importância. Basta ver que já temos transmissões recorrentes de campeonatos femininos, como foi na Copa do Mundo. É preciso, primeiro, dar dignidade. Não se pode colocar o time jogando com um pedaço do padrão do ano passado, com um patrocinador diferente. Imagina se a empresa que fornece o material atual olha isso e tenta rescindir o contrato? Juridicamente, isso é perigoso também. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) repassa R$ 10 mil por jogo, mas não é possível que não existam empresas interessadas em patrocinar essa área. Há um mercado consumidor ali. Tive um encontro com o vice-presidente de esportes olímpicos do Flamengo (Guilherme Kroll) e ele disse que cada vice-presidente apresenta o orçamento que ele quer para o ano seguinte. A presidência analisa, mas quem define para onde vai o recurso é o departamento. Precisamos criar um departamento do futebol feminino, assim como na base e nos esportes amadores.
Pautas sociais e divulgação da marca Náutico
O Náutico é mais do que o futebol. Ele tem responsabilidade social. Precisamos, por exemplo, de uma diretoria de inclusão social. Isso é básico. Não adianta ter o que rolou no jogo do Sampaio Corrêa, com um grupo soltando gritos homofóbicos, e o clube somente postar na conta do twitter algo a respeito. A campanha “Vidas Negras Importam” foi belíssima, tratando de um erro histórico, mas se não der sequência, tratando o tema de forma estrutural, fica parecendo que foi somente uma campanha de marketing. Eu estava lá dentro da atual gestão e sei que não foi, mas fica parecendo porque parou naquilo.
Se vencer, qual legado quer deixar no Náutico?
Gostaria de deixar o Náutico no presente. Fazendo isso, eu estarei pavimentando o futuro. O clube hoje está atrasado. Meu objetivo maior é deixar a instituição pronta para os desafios que virão.