Otto estreia na literatura em obra colorida por reflexões e desabafos
"Meu Livro Vermelho" foi lançado pela Impressões de Minas, a partir de relatos do artista pernambucano em sua rede social
Página 126, 6 de setembro de 2018: “Acordar cedo, escrever um poeminha, essa é a minha sina. Minha vaidade continua, meus gostos e uma intensa vontade de viver e dividir esse momento, essa horinha, esse mesmo coração (...)”. Em primeira pessoa, aqui caberia algo do tipo: “Prazer, meu nome é Otto”.
E tal qual o trecho de “Meu Livro Vermelho” (Impressões de Minas, R$ 70), assim como na música, as pouco mais de 180 páginas de sua estreia literária lhe descrevem em detalhes e personificam o artista pernambucano, desta vez em sua mais recente faceta - além das que acumula como criador de gatos, cantor, compositor e pintor de quadros.
Traduzindo o insconciente
“Escrever para mim é transformar meu pensamento em palavras escritas. Esse meu desafio... contextualizar meu inconsciente em consciente ou vice-versa. São emoções que margeiam meu universo e que se misturam com a dor e o amor que é viver. É minha vida sonhada acordada e viva”, enaltece ele para apresentar o livro em sua rede social.
Foi a partir desse universo virtual, entre 2014 e 2019, especificamente em seu perfil no Instagram “Ottomatopeia”, que ele compilou sentimentos, reflexões, inquietações, desabafos, poesias e escritos (livres), em tom autodidata – cuja revisão tem a assinatura de Paulo Bispo, seu professor em uma escola no Recife, a quem ele se refere como mestre e amigo que decodifica sua escrita e linguagem.
De leitura fácil, e beirando a aleatoriedade, é possível folhear o livro - embora editado cronologicamente - sem necessariamente mergulhar na sequência das páginas.
Sendo ternura ou obsceno
Ora deparando-se com desabafos expostos em uma única linha: “Há muita eletricidade em mim” (página 56, 29 de dezembro de 2016). Ora debruçando-se em poesias visionárias de um 2 de fevereiro de 2016, ocasião em que profetizou um futuro que de fato não viria em um mesmo fevereiro de 2021. “Olinda ainda paz, ainda luz, à espera de um belo Carnaval. Sempre linda, guerreira, forte, antiga e mãe das tradições”.
Há também em “Meu Livro Vermelho” um ‘quê’ de diário, por vezes revelado em timbre mais revolto e com vestígios políticos visíveis, principalmente em trechos a partir de 2017. “Tem horas que a solidão é precisa, singular, capaz de nocautear qualquer pensamento coletivo (...) E o Brasil? Que receba o que merece. Na verdade, o Brasil sempre foi isso mesmo, um Macunaíma”. Como diria Paulo Bispo, quando assina um dos textos da capa do livro, Otto quando escreve “ama a palavra e enche-a de ternura e escrúpulo (...) Às vezes obscena e imperadora”.
Ottopintamatomeia
Do perfil pessoal de Otto (Ottomatopeia) se chega ao ‘Ottopintamatopeia’ – criado por ele para levar os seguidores a uma exposição virtual e permanente de quadros seus, exclusivos, assinados e emoldurados. É o que diz a descrição. E embora sua aproximação com a pintura não seja recente, em 2020, no decorrer da pandemia, ele passou a pintar, também, para fomentar um ganha pão – já que estava fora dos palcos.
Precisamente em 20 de agosto de 2020 veio a primeira postagem, justificando a criação do perfil. “Criei esta página para tratar só da minha pintura, desta minha expressão artística, das minhas cores, deste mundo que me alimenta desde jovem e hoje me absorve por dentro, me instiga, me conecta com o espaço, com o tempo”.
O gosto por colorir telas em branco segue em 2021. Assim como para escrever e cantar, em breve, com “Carnicule Sauvage”, seu próximo disco. Porque multiartista que é, Otto segue com vontades (próprias) de mudar, viver e pensar melhor, em um futuro que para ele é agridoce. “(...) É frutívoro, é generoso. O futuro é agora a cada dia” (Página 94, 19 de dezembro de 2017).