Justiça Federal afasta presidente do Iphan após discurso de Bolsonaro
Nomeação de Larissa Rodrigues Peixoto Dutra foi anulada por falta de qualificação técnica para o cargo
A Justiça Federal afastou a presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Larissa Rodrigues Peixoto Dutra, do cargo. A decisão é da juíza Mariana Tomaz da Cunha, da 28ª Vara Federal do Rio de Janeiro, e a informação foi divulgada pelo blog do Ancelmo Goes.
A decisão acontece dias após a declaração do presidente Jair Bolsonaro (PL), de que "ripou" servidores do órgão após embargo de uma obra feita pelo empresário Luciano Hang, dono da Havan e grande apoiador de seu governo.
"Tomei conhecimento que uma obra de uma pessoa conhecida, o Luciano Hang, estava fazendo mais uma loja, e apareceu um pedaço de azulejo nas escavações. Chegou o Iphan e interditou a obra. Liguei para o ministro da pasta e [perguntei]: que trem é esse? Porque não sou inteligente como meus ministros. O que é Iphan, com PH? Explicaram para mim, tomei conhecimento, ripei todo mundo do Iphan. Botei outro cara lá ", disse Bolsonaro nesta quarta-feira, durante o “Fórum Moderniza Brasil - Ambiente de Negócios”, realizado na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Na ocasião, o presidente falou a empresários sobre mudanças promovidas pelo governo federal em benefício dos empresários.
"O Iphan não dá mais dor de cabeça para a gente. E quando eu ripei o cara do Iphan o que teve, me desculpa aqui prezado Ciro [Nogueira, ministro da Casa Civil, que participava do evento] de político querendo uma indicação não estava no gibi. Daí eu vi realmente o que pode fazer o Iphan, tem um poder de barganha extraordinário. Vocês sabem o que acontece", acrescentou o presidente.
Bolsonaro se referia a paralisação de uma obra da Havan na cidade de Rio Grande (RS). A interrupção dos trabalhos ocorreu em dezembro de 2019 após o órgão ter encontrado material de interesse arqueológico no local da construção.
Veja o trecho final da decisão:
"Com efeito, no exercício de suas funções, o atual Exmo. Presidente da República admitiu que, após ter tomado conhecimento de que uma obra realizada por Luciano Hang, empresário e notório apoiador do governo, teria sido paralisada por ordem do IPHAN, procedeu à substituição da direção da referida autarquia, de modo a viabilizar a continuidade da obra. As falas supratranscritas sugerem, ao menos em um juízo de cognição sumária, uma relação de causa e efeito entre as exigências que vinham sendo impostas pelo IPHAN à continuidade das obras do empresário e a destituição da então dirigente da entidade.
Tal declaração vai ao encontro das transcrições apresentadas pelo Ministério Público Federal no Evento 11, ANEXO3, as quais sinalizavam, desde a reunião interministerial realizada em 22 de abril de 2020, a intenção de substituir a presidência da autarquia com o propósito não de acautelar o patrimônio cultural brasileiro, mas de promover o favorecimento pessoal de interesses específicos de pessoas e instituições alinhadas à agenda governamental".