Justiça federal suspende liminar que afastou presidente do Iphan
Segundo o desembargador, a suspensão teria 'potencialidade de causar grave lesão à ordem administrativa'
A Justiça Federal no Rio de Janeiro suspendeu nesta segunda-feira (20) a liminar que determinou, no sábado (18), o afastamento da presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Larissa Rodrigues Peixoto Dutra.
O pedido foi feito após o presidente Jair Bolsonaro admitir em evento na Federação das Indústrias do Estado de São (Fiesp), no último dia 15, ter "ripado" funcionários do instituto que interditaram uma obra do empresário Luciano Hang, um dos principais apoiadores dele.
Na decisão desta segunda, o desembargador Theophilo Antonio Miguel Filho, presidente em exercício do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), afirmou que o afastamento da chefe do Iphan poderia causar "inegáveis prejuízos à atividades administrativas e às políticas públicas de competência da autarquia".
No entendimento do magistrado, a suspensão teria "potencialidade de causar grave lesão à ordem administrativa". Ao derrubar a liminar que afastava Larissa Rodrigues da presidência do Iphan, Miguel Filho analisou um recurso apresentado ao TRF-2, no sábado (18), pela Advocacia-Geral da União.
Larissa Dutra, que tomou posse na presidência do Iphan em junho do ano passado, teria sido colocada no posto após reclamação de Bolsonaro sobre a atuação do órgão. O presidente afirmou no evento da Fiesp ter feito a mudança no instituto para "não dá mais dor de cabeça pra gente"
"Tomei conhecimento que uma obra, uma pessoa conhecida, o Luciano Hang, estava fazendo mais uma loja e apareceu um pedaço de azulejo durante as escavações. Chegou o Iphan e interditou a obra. Liguei para o ministro da pasta [e perguntei]: 'que trem é esse?'. Porque eu não sou tão inteligente como meus ministros. 'O que é Iphan?', explicaram para mim, tomei conhecimento, ripei todo mundo do Iphan. Botei outro cara lá. O Iphan não dá mais dor de cabeça pra gente [risos]", disse o presidente.
Larissa Rodrigues Peixoto Dutra era servidora do Ministério do Turismo, ao qual o Instituto está subordinado, através da Secretaria Especial da Cultura. Antes, ocupava a direção do Departamento de Desenvolvimento Produtivo da Secretaria Nacional de Integração Interinstitucional, subordinada ao Turismo.
Desde a exoneração de Kátia Bogéa pelo então secretário da Cultura, Roberto Alvim, o Iphan ficou com a presidência vaga. A arquiteta Luciana Rocha Feres chegou a ser nomeada para o cargo, mas a portaria foi cancelada no dia seguinte. Kátia Bogéa ocupou a presidência do Insituto entre 2016 e 2019. Desde dezembro de 2019, a presidência foi ocupada interinamente por Robson Antônio de Almeida. Após a indicação de Luciana, o nome do arquiteto mineiro Flávio de Paula Moura foi cogitado para o cargo, mas seu nome nunca foi confirmado no Diário Oficial. Na época, especialistas em patrimônio fizeram ressalvas à possível nomeação pela falta de experiência na área.
A nomeação de Larissa Peixoto ao cargo chegou a ser anulada depois de alguns dias no cargo, por ação popular movida pelo deputado federal licenciado Marcelo Calero (Cidadania-RJ), sob a alegação de que ela não preenchia os requisitos para o cargo. Calero foi ministro da Cultura durante a gestão de Michel Temer. Ela é formada em Turismo e Hotelaria e cursava pós-graduação em “MBA Executivo em gestão estratégica de marketing, planejamento e inteligência competitiva”. Para assumir a presidência do Iphan, deveria ter graduação em história, arqueologia, museologia, antropologia, artes ou outra área relacionada ao tombamento, conservação, enriquecimento e conhecimento do patrimônio histórico e artístico nacional. A liminar que impedia a nomeação, no entanto, acabou cassada e ela assumiu o cargo.
As declarações de Bolsonaro suscitaram a edição, na quinta, de uma notícia-crime contra o presidente no STF, apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), pedindo que Bolsonaro fosse investigado por prevaricação e advocacia administrativa.
O empreendimento no centro da polêmica é uma loja da Havan na cidade de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, inaugurada em julho deste ano, e cujas obras se iniciaram em março de 2019. Segundo reportagem do UOL, 20 achados arqueológicos foram encontrados no terreno, entre eles estão cerâmicas pré-coloniais de dois tipos diferentes - uma delas de indígenas tupi-guaranis - e pedaços de louças fabricadas no final do século 19. Ainda segundo a reportagem, o material está guardado na Furg (Universidade Federal do Rio Grande).
Em sua conta no Twitter, o empresário escreveu que em 2020 fez uma transmissão ao vivo pelas redes sociais para falar sobre o “absurdo” de o Iphan ter paralisado a obra da loja da Havan "por mais de 40 dias". Segundo Hang, a medida foi tomada porque técnicos do instituto encontraram um artefato no terreno que pensavam ter valor histórico. De acordo com o empresário, porém, "não passava de um pedaço de cerâmica comum”.
Hang ainda afirmou que a obra só não ficou paralisada por mais tempo porque ele colocou a “boca no trombone”. “Bolsonaro usou o meu exemplo para expor algo que acontece com qualquer empreendedor brasileiro todos os dias. A fala do presidente reforça seu compromisso em buscar um país que cresça por meio da livre iniciativa, sem burocracia. Não adianta termos órgãos públicos que não deixam o povo trabalhar”, escreveu.A interdição