Artistas invisíveis: conheça os diversos profissionais envolvidos nos bastidores de um espetáculo
Diversos técnicos que atuam nos bastidores, cada um na sua especialidade, são fundamentais para a experiência final que o público levará para sempre na memória
Quando lembramos de um show, uma peça teatral ou um espetáculo de dança que nos marcou, geralmente o que nos vem à mente é o nome do artista, aquela canção favorita ou uma cena que nos fez chorar. Mas poucos de nós percebemos que para que essa magia aconteça, muitos profissionais atuam nos bastidores e são fundamentais para a experiência final que o público levará para sempre na memória.
Para que um grande palco se erga, por exemplo, é importante saber que a simples montagem da estrutura envolve uma grande operação logística, mobilizando dezenas de pessoas no transporte, carregamento e cuidado com cada equipamento necessário. Depois de transportar todo o material, outro trabalho homérico é montar a estrutura e posicionar equipamentos de som e de luz. E quando está tudo posicionado e ligado, entram em cena outros profissionais que garantem que o espetáculo tenha o melhor cenário, som e luz possíveis.
Quem é quem nos bastidores
São diversos técnicos envolvidos em um espetáculo. O roadie é responsável pelo carregamento dos equipamentos, auxiliar na passagem de som, afinação dos instrumentos e ajudar em qualquer problema que ocorra no palco durante o show. Ele deve garantir que a apresentação aconteça sem imprevistos. Já o técnico de som é quem vai cuidar para que a mixagem entre as frequências e volume de todos os instrumentos esteja audíveis e equilibrados, tanto para a banda (técnico de monitor) quanto para o público (técnico de PA).
O diretor de palco é responsável pela segurança de todos, observando questões de aterramento e gerador de energia, mobilizando a equipe de roadies e fazendo a intermediação entre o mapa de palco enviado pelos artistas com a disponibilidade do evento. Iluminadores, cenografistas, figurinistas e maquiadores são fundamentais para garantir a força estética e artística do espetáculo, com toda a importância para a dramaturgia de cada uma dessas especialidades.
Os 'artistas invisíveis'
“Nós, profissionais técnicos, ‘artistas invisíveis’ que compomos a cadeia da música somos imprescindíveis desde a pré-produção, produção, até a pós-produção de um show ou evento. Sem uma equipe profissional responsável, o artista ou evento perde muito em qualidade comprometendo todo o projeto”, avalia Geison Guedes, especialista em técnica de palco, produtor e diretor geral da Black Stage Produções. Ele tem no currículo a experiência em grandes palcos e festivais. Atualmente, tem se dedicado à formação de novos profissionais. Já ministrou cursos de técnica de palco com recorte social, contemplando jovens periféricos e capacitando pessoas privadas de liberdade como forma de ressocialização.
“Nenhuma banda de sucesso, nenhuma companhia teatral e nenhuma instituição que mexa com arte consegue chegar ao êxito sem ter uma equipe técnica, um produtor, um roterista, um maquiador, um figurinista. Então, o trabalho de roadie para as bandas é meio que de ‘anjo da guarda’. Você confia todo aquele o seu trabalho para aquela pessoa e ela vai entregar um palco completo. É só chegar, pegar no microfone e fazer o show”, destaca Paulo Silva, roadie com diversos eventos no currículo como o Festival BB de Blues e Jazz, Carnaval do Recife, Primavera Eu Te Amo (SP), Coquetel Molotov, Recife Mais Verde, RecBeat, Polo HipHop, entre outros.
A luz e sua narrativa em cena
A iluminação é um dos elementos mais importantes de um espetáculo, definindo cor, temperatura da luz e sombra como dramaturgia. “A iluminação, quando é convidada desde o início em um processo artístico, é excelente para a criação e estímulo criativos, seja estético ou para um figurino, um cenário. A iluminação é magia”, frisa a iluminadora e performer Natalie Revorêdo, graduada em Licenciatura em Dança (UFPE) e integrante do Farol Ateliê da Luz, do Coletivo Nativa e da COLETIVA.
Desde 2013, Natalie vem se especializando. O interesse pela iluminaçao começou quando foi convidada por um amigo para ajudar com a luz de um espetáculo, “Comecei a entender que estar nesse lugar é ter a permissão de contar histórias, criar sonhos e criar possibilidades, que a luz e o processo técnico e estético nos permite ser como uma deusa movimentando a cena, fazendo aparecer e sumir”, esmiúça.
Desafios da profissão
Como se não bastassem as dificuldades cotidianas enfrentadas por esses profissionais, as medidas sanitárias contra a covid também impactaram em cheio a categoria. “O cenário ainda está muito delicado. Desde o início, a classe técnica é a primeira a sofrer um abalo. A pandemia foi uma avalanche e quando a gente começa a dar um passo a avalanche vem de novo. E temos companheiras e companheiros que saíram para buscar outros trabalhos. Pessoas competentíssimas que fazem essa engrenagem técnica andar. Muita gente passou fome e precisou de cesta básica. Muitos técnicos viveram de cesta básica durante muito tempo”, lamenta Natalie.
“Eu mesma tive trabalhos que caíram. Eu tinha agenda fechada até março e todas caíram. Todo mundo agora está se reajustando. Como viver nesse processo pandêmico quando nosso trabalho é feito da arte do encontro?”, desabafa a iluminadora. “A classe técnica está com muita saudade e necessitando voltar aos trabalhos. A gente está há um tempo parado e a gente merece. Eu acho que é pertinente pensar sobre isso, sobre esse olhar para a classe técnica. Um olhar que merece acolhimento”, diz ela.
A falta de percepção sobre a importância de uma boa equipe técnica ainda é uma cultura que precisa ser repensada. “Você pode dizer ‘ah, vou perder um dinheiro para pagar um roadie ou um produtor’, mas o artista precisa entender que isso tudo vai enriquecer a cadeia produtiva e todo mundo vai ganhar. Você só enriquece a cena. É primordial o trabalho da equipe técnica, não só do roadie, mas de toda a equipe. Acho que o segredo do sucesso está aí. É ter uma equipe boa, profissional e bem paga”, avalia Paulo Silva.
Segundo Geison Guedes, outro grande obstáculo é a falta de valorização e a desunião da categoria. “A remuneração dessas(es) profissionais infelizmente não acompanha em valor o mesmo nível de sua importância. O profissional se capacita em cursos caros e raros, afinal de contas, com o não entendimento de sua importância pouco se investe em cursos formativos para capacitar mão de obra qualificada para esse mercado tão importante que é o da música, arte e cultura. Na minha opinião, para que isso aconteça eu acredito que muita coisa precisa mudar a começar pela própria postura dos profissionais e do mercado em geral”, afirma Geison.
“Vivemos em mundo globalizado onde temos acesso à tecnologia. O conhecimento está mais acessível do que antes, existem cursos de capacitação como o da Black Stage, no entanto a região ainda é muito carente de cursos técnicos específicos. O que se usa hoje aqui em equipamentos e técnicas, se usa no Brasil e no mundo. O profissional da produção, do áudio, da iluminação pernambucana não deixa a desejar pra nenhum profissional de fora, no entanto, o bairrismo e a falta de reconhecimento com os iguais gera uma disputa desnecessária ocasionando uma classe desunida”, pondera.