Educação

Professor da escola pública recebe 78% do salário dos outros trabalhadores com ensino superior

Piso foi reajustado em 33,24%, como prevê norma, mas Comissão Nacional de Municípios orienta prefeitos a aplicar apenas a inflação, medida criticada por especialistas

Sala de aula - Arthur Mota/Folha de Pernambuco

Um levantamento do Todos Pela Educação com base nos dados do IBGE mostra que os professores da rede pública estão entre as categorias profissionais mais mal remuneradas do país. De acordo com o relatório, os docentes ganhavam em 2020 apenas 78% da média recebida por outros trabalhadores com ensino superior.

O percentual, que consta do Anuário Brasileiro da Educação Básica de 2021 da ONG, mostra que a média salarial dos professores se aproximou dos outros profissionais com ensino superior mais por conta da queda do rendimento dos demais profissionais do que da valorização do docente. De 2013 para 2020, o valor médio pago para professores oscilou entre R$ 3,7 mil e R$ 4,1 mil, atingido no último ano. Os outros profissionais tiveram uma queda constante de R$ 6,2 mil para R$ 5,2 mil em 2020.

A meta do Plano Nacional de Educação estipulada em 2014 era chegar em 2020 com a equiparação entre as duas categorias. Segundo especialistas, é uma estratégia fundamental para elevar a qualidade de ensino no país e já há riscos até de falta de mão de obra.

— O salário inicial pesa muito para a atratividade da carreira. Pesquisas apontam que só 5% dos jovens pretendem ir para a docência. Em algumas áreas, como Matemática e Biologia, já há possibilidade de não haver professores num futuro próximo. Um verdadeiro apagão — diz Gregório Grisa, doutor em Educação. — Além disso, o professor precisa ter recursos para uma atualização pessoal permanente e possibilidade de acesso a bens culturais sofisticados. Querem resultados europeus sem boas condições?

Quando o salário do professor é comparado com os das áreas de Exatas e de Saúde, a diferença é ainda maior. De acordo com o anuário, a média do que os profissionais dessas áreas recebem, mesmo com queda nos últimos anos, é de R$ 6,6 mil em ambos os casos: R$ 2,5 mil a mais do que os docentes.

Nesta semana, os ministérios da Educação, Economia e Casa Civil discutiram um cálculo alternativo para determinar o reajuste do piso salarial do magistério. Até que o presidente Jair Bolsonaro decidiu, para evitar o desgaste político no ano eleitoral, aplicar a fórmula prevista na Lei do Piso, que, no ano passado, resultou num aumento nulo e em 2022 foi de 33,24%.

Com isso, os valores iniciais passam de R$ 2,8 mil para R$ 3,8 mil. Esse aumento é pago, principalmente, pelos governos estaduais e municipais, que concentram a grande maioria dos professores e escolas públicas do Brasil. Com isso, a Confederação Nacional de Municípios (CNM) chegou a pressionar a União para evitar o aumento de 33,24%.

Sem êxito, a CNM decidiu recomendar aos prefeitos de todo o país que ignorem o índice de reajuste do piso nacional do magistério anunciado pelo presidente, e o corrijam o valor pela inflação. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acumulou 10,16% em 2021.

— Com um impacto de R$ 30,5 bilhões, vamos ultrapassar todo o limite de gasto com folha de pessoal. Compreendemos o papel dos profissionais, que precisam ser valorizados, mas estamos defendendo que seja a correção pela inflação porque as prefeituras não suportam — afirmou o presidente da entidade, Paulo Ziulkoski.

No entanto, especialistas em educação apontam que o piso salarial deve receber aumentos reais, como política pública da forma como foi criado, justamente para diminuir a distância salariais de professores das escolas públicas em relação a outras carreiras, como prevê o Plano Nacional de Educação.

— Esse é um aumento significativo que pesa no bolso dos municípios e dos estados, mas ele é necessário — avalia Tássia Cruz, economista especializada em financiamento da educação e gerente do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV. — É problemático só aumentar pela inflação porque é preciso realmente a valorização do docente.

O piso do magistério foi criado em 2009, quando foram estabelecidos o valor de R$ 950 e a previsão de aumentos anuais. Com isso, chega neste ano a R$ 3,8 mil. Caso tivesse sido reajustado apenas pela inflação, como defende a CNM, seria hoje de R$ 2 mil, quase a metade do que se tornou.

Ainda assim, o salário do professor brasileiro é um dos mais baixos do mundo. Um relatório divulgado em setembro pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontou que a média de remuneração dos docentes dos anos finais do ensino fundamental é a menor entre 40 países analisados. As outras nações com remunerações iniciais mais baixas para os docentes são Costa Rica, Hungria e Letônia.

— Pessoas vocacionadas são desestimuladas a seguirem a profissão docente e ela acaba sendo a última alternativa profissional de muitos que se tornaram professores — afirma o deputado Professor Israel Batista, presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação. — Sabemos que há discrepâncias da capacidade dos municípios de suportarem esse aumento. Aqueles que não tiverem condições precisam ser auxiliados por entes mais fortes, sejam os estados ou o governo federal.

A própria Lei do Piso prevê que a União deverá complementar o salário nos casos em que o ente federativo não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado. Para isso, no entanto, o município deverá justificar sua necessidade e incapacidade, enviando ao Ministério da Educação o pedido acompanhado de planilha de custos comprovando a necessidade da complementação.

— É uma questão de compartilhamento de responsabilidades e precisávamos da liderança do MEC, mas temos vivido, nesses três anos, uma enorme falta de coordenação do ministério. Compreendemos as necessidades dos prefeitos, e a Frente está disposta a ajudá-los nisso — diz Batista.