Reabertura do Congresso testa apoio político de Bolsonaro em ano eleitoral
A fidelidade que Bolsonaro tentou angariar em seu primeiro discurso no Congresso neste ano será testada em breve
Em discurso na tribuna da Câmara na abertura dos trabalhos legislativos, o presidente Jair Bolsonaro, pré-candidato à reeleição, adotou na quarta-feira tom de campanha. Listou realizações de seu governo, criticou adversários e fez promessas relacionadas ao que enxerga como independência entre os Poderes, em um afago a deputados e senadores, de quem busca apoio na construção de palanques estaduais.
A efetividade desses acenos e o tamanho político do governo no início do ano eleitoral começarão a ser medidos nas próximas semanas, quando o Congresso deve apreciar vetos presidenciais e projetos contrários aos interesses do Palácio do Planalto, como a legalização dos jogos de azar no país.
A fidelidade que Bolsonaro tentou angariar em seu primeiro discurso no Congresso neste ano será testada em breve. Na Câmara, por exemplo, parlamentares se articulam para pautar, ainda em fevereiro, o projeto que legaliza o jogo. Na semana que vem, os líderes devem ter uma reunião para debater o tema. Ainda há dúvidas sobre a redação do texto e o alcance da liberação — se ocorreria apenas em grandes resorts ou também empreendimentos de pequeno porte.
O presidente já se posicionou de forma contrária à proposta e adiantou que irá vetá-la. A decisão é uma forma de garantir a manutenção do apoio dos evangélicos, que historicamente trabalham contra a mudança na legislação. Integrantes do Ministério da Economia, contudo, são favoráveis à pauta, já que geraria aumento na arrecadação federal.
Na próxima semana, deputados e senadores também devem derrubar alguns vetos já assinado pelo presidente, em sessão prevista para terça-feira. O principal deles é relativo ao texto que institui o Programa de Reescalonamento do Pagamento de Débitos no âmbito do Simples Nacional (Relp). A política autoriza o parcelamento das dívidas das micros e pequenas empresas.
Segundo o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), o Congresso também deve derrubar veto ao projeto que tratou da prorrogação do prazo dos concursos. O parlamentar defendeu a ajuda por meio do Relp. Antes, o próprio Arthur Lira, aliado do Planalto, sinalizou pela derrubada do veto.
"Em razão desse momento grave de desemprego, fome e emergência sanitária, devemos fazer todos os esforços para socorrer os pequenos negócios, os que mais geram empregos e que mais sofreram com a crise", disse Ramos.
Em ano eleitoral, como este, votações só ocorrem com regularidade semanal no Congresso durante o primeiro semestre. Nos meses seguintes, deputados e senadores costumam voltar todos os esforços para a própria eleição e de seus aliados.
Na Mesa Diretora da Câmara, ao lado do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL) e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), Bolsonaro leu a mensagem do Executivo ao Congresso, tarefa que se repete anualmente. Desta vez, porém, ele lançou mão de críticas ao seu principal concorrente na disputa pela reeleição, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os ataques não constavam no discurso original, distribuído à imprensa. Sem citar o petista nominalmente, Bolsonaro se comprometeu a não dar andamento a ações que Lula já demonstrou disposição em fazer, como revogar pontos da reforma trabalhista aprovada pelo Congresso durante o governo Michel Temer.
"Os senhores nunca me verão pedir pela regulação da mídia e da internet. Eu espero que isso não seja regulamentado por qualquer outro Poder. A nossa liberdade acima de tudo. Também nunca virei aqui para anular reforma trabalhista aprovada por esse Congresso, afinal os direitos trabalhistas continuam intactos no artigo 7. Sempre respeitaremos a harmonia e independência dos Poderes", afirmou.
Bolsonaro também citou ações do governo federal, como a aquisição das vacinas contra a Covid-19; o reajuste do Auxílio Brasil, cujo valor foi de R$ 190, em média, para R$ 400; além da criação do PIX como instrumento de transações bancárias. Essas realizações devem embasar o discurso de campanha do presidente, conforme defendem seus aliados políticos.
O presidente deu espaço de comando na sua campanha à reeleição a políticos do Centrão influentes no Congresso, como o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto. A diferença favorável ao ex-presidente Lula nas pequisas de intenção de votos e o posicionamento contra a vacinação que Bolsonaro adotou durante a pandemia preocupam seus aliados. No último domingo, o GLOBO mostrou que lideranças regionais de partidos do Centrão em vários estados já ensaiam “trair” e não apoiar Bolsonaro nas eleições. Derrotas no Congresso durante o ano eleitoral podem agravar o cenário de falta de apoio dos partidos do Centrão à sua reeleição.