Dispersão de Rayleigh

Cinzas de vulcão em Tonga deixam céu rosado no Grande Recife; entenda fenômeno

Apesar da beleza, a coloração é um sinal de poluição na atmosfera

Imagens mostram a coloração do céu no Recife - Cortesia/Gustavo Belarmino

A erupção do vulcão submarino Hunga Tonga-Hunga Ha’apal, em Tonga, na Oceania, no dia 15 de janeiro, pode explicar os tons de rosa e vermelho no céu da Região Metropolitana do Recife (RMR) que vêm chamando a atenção no amanhecer e entardecer nos últimos dias. 

O fenômeno é conhecido como dispersão de Rayleigh, que ocorre quando raios solares se espalham pela atmosfera em forma uma nuvem de aerossóis de materiais particulados em suspensão, ou seja, poeira. O ar que circula no planeta se eleva para as altas camadas da atmosfera e se desloca para várias direções do globo, transportando umidade e, no caso do vulcão, as cinzas vulcânicas.

De acordo com Cleiton Batista, do Observatório Astronômico da Sé, a erupção na ilha do Pacífico produziu uma grande quantidade de enxofre e outras partículas que viajaram milhares de quilômetros até o Brasil em nuvens. “Quando o sol está nascendo ou se pondo são os momentos para que a gente observe esse ganho de tonalidade”, explica.

A nuvem de gás, vapor e cinzas foi expelida pelo Hunga Tonga-Hunga Ha’apal a cerca de 20 quilômetros de altura, atravessou os oceanos Pacífico e Índico, passou pela África e chegou à costa brasileira.

Imagens de satélite compartilhadas pela plataforma especializada Zoom Earth, em 24 de janeiro, mostram a nuvem de poeira do vulcão cobrindo toda a extensão do litoral brasileiro. “Aqui você pode ver a nuvem branca de cinzas ficar marrom à medida que o Sol se põe no Atlântico Sul”, explica.



O fenômeno já foi registrado em diversas outras regiões do Brasil, como em São Paulo, no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, na Paraíba e no Mato Grosso do Sul.

A coloração é explicada pela inclinação do eixo do planeta durante o começo da manhã e o fim da tarde: é quando as partículas que refletem as cores tendem a ser mais avermelhadas e róseas.

Em entrevista à Climatempo, a professora e pesquisadora do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP) Marcia Yamasoe reforçou a explicação sobre a coloração rosa do céu causada pela erupção do vulcão.

Equipamentos do instituto detectaram a chegada da pluma vulcânica a São Paulo. "Outras imagens de satélite da Nasa mostram a evolução da pluma saindo de Tonga, atravessando a África, o Atlântico e chegando a São Paulo", detalhou a professora. 

A erupção desse vulcão foi bastante intensa e lançou material na estratosfera, acima de 15 quilômetros. Em 31 de janeiro, um satélite da Nasa detectou a poeira a cerca de 30 quilômetros de altitude. "Na estratosfera, é muito mais fácil esse material ser transportado em longas distâncias", acrescentou. 

Ainda segundo Marcia, como o material está na estratosfera, há uma demora para a dispersão completa e a coloração poderá ser vista ao longo de algumas semanas ou meses. 

Coloração diferente também pode ser observada no entardecer (Foto: Cortesia/Camila Oliveira)

Bioindicador de poluição
Apesar da beleza do céu diferente, a coloração é um sinal de poluição na atmosfera. “Essa mudança de tonalidade acentuada acaba sendo um bioindicador de poluição atmosférica. Assim como a chuva, que reflete a cor do Sol e forma o arco-íris, as partículas do vulcão refletem a luz solar e por isso alteram a cor do céu. O mesmo fenômeno pode ser observado quando há grandes queimadas”, acrescenta Cleiton.

O especialista detalha ainda que à medida que os dias forem passando, a dispersão da poeira tende a diminuir e o céu vai ganhar as cores normais para amanhecer e entardecer. 

O meteorologista da Agência Pernambucana de Águas e Clima (Apac) Romilson Ferreira explica que o fenômeno é relativamente comum em climas mais secos, como o que ocorre no Agreste e no Sertão do Estado. A falta de chuva dos últimos dias na RMR, acrescenta, contribui para a visualização. 

“É mais comum no Agreste e no Sertão porque temos o que a gente chama de material particulado em suspensão. As pessoas [nessas regiões] são mais acostumadas por causa da dispersão”, detalha. 

“Ao nascer e pôr do sol, os raios solares viajam por mais moléculas de gases da atmosfera do que quando o sol está a pino. Toda essa massa extra de gás faz com que haja um maior espalhamento dos raios solares nos espectros de maior energia, como o violeta e o azul. O composto de gases da atmosfera, Nitrogênio, Oxigênio, água e materiais particulados também contribuem para dar uma coloração diferente na atmosfera, por exemplo, em dias mais secos, o céu fica mais azulado, enquanto em dias úmidos o céu fica mais esbranquiçado”, afirma a Apac.

A dispersão também é responsável pela cor azul do céu durante a maior parte do dia e explica o que acontece durante o nascer ou pôr do sol e, de forma mais intensa, nas camadas mais baixas da atmosfera, especialmente na presença de nuvens.