Com Internet das Coisas, 5G promete trazer mudanças profundas ao cotidiano; saiba como
Nova rede móvel chega às 27 capitais brasileiras até o final de julho. Entre as inovações esperadas, estão carros autônomos e conexão entre aparelhos domésticos.
É de manhã. Você, ainda com o olho pesado de quem acaba de acordar, dá bom-dia ao seu smart-speaker, assistente virtual de voz que lembra uma caixinha de som, e lhe pergunta que horas são, a previsão do tempo e como está o tráfego no trajeto até o local do seu primeiro compromisso. Agora, já informado, você pede ao aparelho para ligar a televisão e a cafeteira, que são desligadas quando as termina de usar.
Chega, então, uma mensagem no celular. É a sua máquina de lavar avisando que o sabão está perto do fim. Duas horas depois, você dá uma parada para recarregar a bateria do seu carro elétrico, volta para a rua e atravessa a faixa tranquilo, com a anuência do sinal verde do semáforo que se adapta ao fluxo do trânsito.
Mas, eis que passa, de repente, um motorista apressado, que, ao mudar de faixa, quase amassa a sua lateral. Quase, porque o computador de bordo disparou o sensor de alerta, fazendo o veículo desacelerar antes que você se desse conta e acionasse o freio com seu pé.
A partir deste ano, com a chegada da quinta geração da internet, o 5G, cenas como essas vão, aos poucos, se tornar uma realidade comum no Brasil. À exceção da batida evitada no trânsito e da máquina de lavar, elas até são possíveis hoje em alguns ambientes domésticos por aí afora, mas numa escala tímida perto do que as potencialidades da nova rede deverão proporcionar.
Com navegação muito mais rápida e transmissão de dados móveis na faixa dos 3.500 mega-hertz, bastante superior aos 700 MHz do 4G, a próxima fase da web promete aprofundar e acelerar o processo de estreitamento da relação humana com a tecnologia digital, que, a cada dia, se mostra mais incorporada e indispensável ao cotidiano.
Em vista disso, o País corre para implantar a tecnologia, que chegará às capitais até 31 de julho. Não à toa, no início desta semana, o prefeito João Campos assinou um decreto que retira a exigência de licenciamento urbanístico para a instalação das antenas de 5G.
A conexão de tudo
Esqueça a ideia de que internet só se acessa por celular, computador, assistente virtual e tablet. Com o 5G, praticamente tudo poderá ser conectado, naquilo que os especialistas chamam de Internet das Coisas (IoT, na sigla em inglês).
Da geladeira à maquina de lavar, incluindo o carro e até o rebanho nas propriedades rurais (veja no infográfico abaixo), os equipamentos e utensílios que compõem o nosso dia a dia terão um ponto de conexão com a rede móvel, fazendo com que a troca de informações seja muito mais rápida e eficiente do que é hoje.
“Nós estamos numa transição de uma economia com base na Tecnologia da Informação e Comunicação para uma economia baseada em dados. Isto significará uma grande revolução no sentido de que o volume de dados que poderão ser processados a partir do 5G é infinitamente maior do que nós temos até então, o que vai dar uma série de aplicações. Muitas ainda não conhecemos, outras sim, mas chegaremos a uma sociedade hiperconectada”, explica Marcos Ferrari, presidente executivo da Conexis Brasil Digital, entidade que representa as empresas do setor de telecomunicações.
Implantação por etapas
Toda essa transformação não se dará de uma só vez em todo o País. Após o leilão no ano passado, as empresas autorizadas a operar o serviço começam a instalar as antenas de difusão, também chamadas de estações de rádio base (ERB), que conectam os aparelhos à rede, seguindo um prazo determinado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
Primeiro, são contempladas as capitais, onde o 5G deve entrar em funcionamento até o fim de julho, com uma ERB para cada 100 mil habitantes. Depois, a internet móvel vai se expandindo pelas cidades de grande, médio e pequeno porte até 2029, quando todos os municípios com mais de 30 mil moradores deverão ter, pelo menos, uma antena para cada 15 mil pessoas. Por isso e pelo fato de que os smartphones mais acessíveis ainda não são conectados à nova tecnologia, as mudanças serão sentidas de forma gradual e o 5G não chegará, simultaneamente, a todos os bairros e comunidades.
Outro ponto importante é a regulamentação. No âmbito federal, a Lei Geral das Antenas, regulamentada por decreto de 2020, já estipula os critérios técnicos para a implantação da infraestrutura de telecomunicações, incluindo o 5G. Mas cada município precisa ter uma legislação própria sobre o assunto, estabelecendo as áreas onde ela pode ser colocada. Segundo foi acordado no leilão, todas as 185 cidades pernambucanas têm o compromisso de implantar a rede, que será operada pelas três companhias vencedoras dos pacotes de cobertura nacional, Vivo, Claro e TIM, além da Brisanet, que arrematou todos os lotes da região Nordeste.
No Recife, que hoje conta com 855 antenas, será necessário quintuplicar o número de estações disponíveis para que a cobertura atinja todo o território municipal. Como explica Marcos Ferrari, diferentemente do 4G, que, para se propagar, precisa daquelas antenas grandes fixadas em postes, na quinta geração, a estrutura é bem menor, quase do tamanho de uma caixa de sapato. “No 5G, a gente tem uma banda maior de frequência, transportando muito mais dados, mas um comprimento de onda menor. Por isso é que tem que ter mais antenas”, diz.
Incentivo municipal
Nesse cenário, o prefeito do Recife, João Campos, assinou o decreto que dispensa o licenciamento para a colocação de transmissores de pequeno porte em lugares que já contem com a infraestrutura. Nos demais casos e nos locais de patrimônio histórico, o poder público tem até 60 dias para conceder a licença. A medida visa agilizar a instalação das ERBs na Capital pernambucana, que, em 2021, foi classificada pela Conexis como cidade de média aderência à Lei Geral das Antenas, precisando de adequações.
“Quando saiu o ranking da Conexis, reunimos as áreas da Prefeitura ligadas ao tema para garantir que tivesse uma regulação bastante clara e, com isso, que as empresas pudessem olhar para o Recife com uma das melhores legislações. Também sentamos com a Conexis e analisamos item por item. E o resultado foi esse decreto, que está esclarecendo as dúvidas que havia sobre a instalação dessas antenas”, conta o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, Rafael Dubeux.
A partir da chegada do 5G, a gestão espera executar projetos que utilizem a cidade como um “espaço de experimentação”, a partir do Bairro do Recife, em parceria com o Porto Digital. “A ideia é que todo o espaço público vire um local para testar novas tecnologias. Por exemplo, acoplar Inteligência Artificial em câmeras de segurança para fazer leitura das imagens e identificar algum perigo ou usar energia solar fotovoltaica para carregar celular ou bateria de carro elétrico ou utilizar sensores nas esquinas para avaliar o fluxo de carros e dosar a semaforização”, afirma o secretário Rafael Dubeux.
A questão do acesso
Além da possibilidade de produzir inovações no futuro, o presidente do Porto Digital, Pierre Lucena, considera que o primeiro ganho deve ser a ampliação do acesso à internet, que, nesta quinta geração, deverá ter um raio de alcance maior, chegando a áreas hoje pouco atingidas pela rede de cobertura, especialmente nas periferias e zonas rurais.
“No primeiro momento, pouca gente vai ter aparelhos com 5G, mas as conexões vão poder chegar às escolas, por exemplo, aonde hoje elas chegam via cabo com todos os problemas que tem. O que isso vai possibilitar é que a gente tenha uma internet melhor, possa fazer uma série de experimentos, principalmente a Internet das Coisas, e uma democratização do acesso da internet de qualidade”, argumenta.
Na ponta, longe das decisões e descobertas que saem dos gabinetes e escritórios, a população espera. “Aqui é horrível. Até entro no zap (WhatsApp), mas não consigo abrir um vídeo. E olha que a minha é 4G e eu pago R$ 45 por mês”, diz a comerciante Ana Cláudia Farias, de 51 anos, que mora e trabalha em Cavaleiro, Jaboatão dos Guararapes.
“De manhã, ela [a internet] pega até bem, mas depois, acho que quando as pessoas começam a usar, é difícil. Se alguém me mandar qualquer coisa, fica aquela bolinha rodando. Para sair daqui, dependendo do lugar, aplicativo de transporte não pega de jeito nenhum. E eu preciso ficar com a internet ligada o tempo todo porque os clientes vêm fazer compra, pedir”, conta.