TRAGÉDIA

Petrópolis: secretário da Defesa Civil diz que prefeitura demorou a aceitar bloqueios

Bombeiros sugeriram fechar seis pontos, mas prefeito Rubens Bontempo permitiu apenas dois.

Buscas dos Bombeiros em Petrópolis - Reprodução/Twitter - Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro

Na manhã desta segunda-feira, durante uma coletiva de imprensa no Quartel do Corpo de Bombeiros de Petrópolis, o secretário da Defesa Civil e comandante-geral do Corpo de Bombeiros do Rio, Leandro Monteiro, afirmou que chegou a pedir ao prefeito da Cidade Imperial, Rubens Bontempo, na semana passada, para fechar seis pontos de acesso ao município. No entanto, o chefe do executivo municipal não teria aceitado.

Apenas no domingo Bontempo colocou barreiras em dois pontos. Monteiro afirmou que expôs em reuniões a necessidade de evitar ao máximo o fluxo de trânsito na cidade. Apesar da dificuldade do plano ser implementado, o secretário diz não ser o momento de "politizar". No momento, mais de cem pessoas continuam desaparecidas.

— Eu falei com o governador que precisávamos fechar a cidade. Só poderiam entrar moradores com comprovante, turistas que já estavam com reservas para hotéis não afetados e carros de serviço e de trabalho. Pedimos isso na quarta (16). No entanto, o prefeito se recusou. Ontem (domingo) fizemos uma reunião para tomarmos uma medida drástica. Conversamos com equipes da prefeitura para sensibilizar o prefeito para autorizar as barreiras. Num primeiro momento o prefeito não aceitou. Só à noite que a gente começou, mas não da maneira que queríamos — disse Monteiro, que completou:

— O grande maestro disso tudo é o prefeito. Ele que define o que deve ser feito. Mas tivemos muita dificuldade.

O secretário pediu que a população “tenha confiança no corpo de bombeiros” e afirmou que “não podemos politizar” este momento. Em balanço divulgado na manha desta segunda-feira, de acordo com a Polícia Civil, 112 pessoas ainda estão desaparecidas. Já o número de mortos alcançou a 176, segundo os Bombeiros. 

Monteiro voltou a falar da dificuldade em implementar o plano pensado pela corporação de não permitir acesso livre a áreas atingidas, autorizando a entrada apenas das equipes de busca.

— O governador não pode fechar a cidade. Ele não tem essa atribuição. Estamos aqui para dar o suporte ao município, auxiliar. Pensei em colocar barreiras de bloqueios na cidade e em locais onde havia casos, só os bombeiros. Nós não conseguimos isso. Tentamos vários dias, mas ele só aceitou ontem (domingo).

Equipes do Corpo de Bombeiros de outros estados se encontram em Petrópolis como reforço ao trabalho de buscas por sobreviventes. Moradores de regiões muito afetadas por deslizamentos reclamaram e afirmaram que não havia agentes para atuarem em áreas onde imóveis foram derrubados e cobertos pela lama. Para Monteiro, num primeiro momento era preciso entender as dimensões da tragédia e então definir os pontos de atuação.

— Como vou pedir ajuda a outros estados quando não sei o que aconteceu? Só depois do que vimos o que havia, foram chegando os militares. O Corpo de Bombeiros jamais negou ajuda. Eu não preciso de mais bombeiros trabalhando em campo. Preciso de locais seguros para trabalharmos. Entendemos a necessidade das pessoas de acharem seus parentes. Mas elas precisam acreditar no Corpo de Bombeiros.

De acordo com o secretário, “não há falta de militares”.

— É covardia dizer que pontos de pequenas barreiras em ruas têm vítimas. Temos que estar onde tem vítimas. Só quero que vocês deem a oportunidade dos bombeiros falarem. Temos 88% de aceitação no país. Em todos os pontos com possibilidades de vitimas há a presença dos bombeiros.

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O planejamento de colocar bloqueios em pontos de acesso à cidade foi pensado para evitar o fluxo de pessoas — tanto de amigos e parentes de moradores, voluntários e de curiosos — num terreno já acidentado e instável. Além da lama e dos veículos arrastados ocupando as ruas, o que dificulta o deslocamento, o trânsito criado pelos que chegam de outras cidades aumenta o problema e o tempo gasto pelas equipes para as áreas afetadas.

— Pedi que na Chácara Flora e Morro se Oficina, por exemplo, só entrassem carros dos bombeiros. Infelizmente, temos ainda o turista de desastre. As pessoas param seus carros para filmarem e vão embora — disse Monteiro, que completou:

— O tempo de deslocamento tem sido muito grande. Nós estamos gastando mais de duas horas para sair do quartel até o Morro da Oficina. A cidade está com muitos carros. 

O secretário afirma que o pedido pelos pontos de bloqueio foi feito mais de uma vez dada a situação de emergência, que está no sétimo dia de buscas.

— Eu pessoalmente solicitei ao prefeito. Fizemos inúmeras reuniões. Não estou aqui transferindo o problema para o prefeito. Eu falei com ele. Foi amplamente discutido. O prefeito pediu uma reunião com o governador, comigo, o secretário de governo e ele prometeu que a cidade amanheceria com o bloqueio. Eu não vou fiscalizar barreiras.

O Globo procurou a Prefeitura de Petrópolis para comentar. Não houve retorno até o momento.

O secretário contou como aconteceu a dinâmica de atendimento logo após os primeiros chamados. Quartéis próximos foram acionados dada a dimensão da tragédia, que atingiu diferentes pontos do município, com deslizamentos de encostas, desabamentos de imóveis, cheias de rios e alagamentos inclusive nas principais vias de acesso.

— Com relação ao efetivo, quando entrou a primeira solicitação, por volta das 17h, no quartel de Petrópolis, tínhamos 30 militares que mantemos nos quartéis de cada estado. A partir do momento que acontece um evento como esse, o ofício do dia solicitou mais apoio. Acionamos os quartéis mais próximos para dar o suporte e instantaneamente chamamos o plano de chamado do quartel, os militares que estavam de folga. Em menos de quatro horas já estávamos trabalhando de forma integrada com o governo — diz Leandro Monteiro.

Até mesmo o quartel de Petrópolis sofreu as consequências das fortes chuvas e ficou inundado na última terça-feira (15). A corrida contra o tempo era para identificar áreas em que houvesse vítimas e planejar uma forma de acessá-las para ter início o trabalho de resgate.

— Em seguida começaram a entrar vários avisos. Tínhamos que identificar se nesses pontos tinham vítimas. Nosso quartel ficou alagado, com 80 centímetros de água, perdemos vários computadores. Avançamos com botes, caminhões mais altos, porque as viaturas 4x4 não conseguiam sair. Eu tinha 4 helicópteros, mas pelo protocolo, eles não poderiam voar. Nós não conseguimos nos locomover na cidade, que estava travada. Aos poucos fomos entendendo a situação. Em 24 horas retiramos 24 pessoas com vida nos escombros.

Sobre a falta de equipamentos — como pás, galochas e capacetes —, Monteiro afirmou que os agentes não operaram sem os itens:

— Todos os nossos quartéis possuíam seu estoque operacional. Todos os materiais são identificados. Vamos que acontecesse um incêndio, onde houvesse necessidade que três quartéis atuem. Na hora do combate pode ser trocado os esquipamentos e perdemos. Em nenhum momento faltou equipamento. Tem um caminhão do Centro de Armazenamento que fica em São Cristóvão. Esse caminhão não foi empregado ainda. Estamos usando os equipamentos das viaturas e do batalhão e ainda não usamos.

Monteiro disse que a compra emergencial de equipamentos “para se precaver” e dar “estrutura para bombeiros que vêm de outros estados”.

— Sobre a solicitação emergencial para a compra do material, todo o material é identificado e fica guardado. Cada quartel tem seu depósito operacional. Temos o Centro de Suprimento e Abastecimento, almoxarifado geral, que fica em São Cristóvão. Quando amanheceu e vimos o que aconteceu, vimos o caos, pedimos no depósito o material para subir. Vinte e quatro horas depois compramos esse material para nos precaver. Os militares que estão vindo de outro estado têm que estar equipados com o mesmo material que o nosso.

Desde o dia da forte chuva, na semana passada, parentes, amigos e voluntários têm se mobilizado e participado das buscas por sobreviventes em meio à lama e aos escombros. Por vezes, eles atuam por conta própria, sozinhos, como um grupo que procura num rio pelos passageiros que estavam em dois ônibus que foram arrastados pela correnteza.

Durante a coletiva desta segunda-feira, o coronel Alexandre Silveira, superintendente operacional da Defesa Civil, pediu para que a população tenha cuidado na hora de ajudar no resgate de vítimas.

— Não podemos pegar uma ferramenta e entregar para um civil. É preciso ter cuidado para que caso algum corpo seja retirado não haja mutilação. Entendemos a necessidade e o desespero da população. Mas eles não podem correr riscos também.

Os bombeiros afirmam que muita gente vem escavando em áreas atingidas onde antes ficavam imóveis, principalmente casas.

— Não podemos trabalhar dessa maneira, vai causar insegurança e não vamos avançar — disse ao mostrar uma foto com dezenas de pessoas removendo terras.

De acordo com a Defesa Civil, hoje, cerca de 500 homens do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro atuam nos resgates na Cidade Imperial. Somado a eles estão outros 115 militares de 16 estados, com apoio de 44 cães farejadores.

— Queremos acabar o mais rápido com esse sofrimento — afirmou o secretário Leonardo Monteiro.

Até o início da tarde desta segunda, a Polícia Civil confirmou que ao menos 112 pessoas continuam desaparecidas.  Em balanço divulgado no inícia desta manhã, de acordo com a Defesa Civil, 847 pessoas recebem atendimento da Assistência Social, com o suporte para suprir as necessidades essenciais da população. Doze escolas municipais estão funcionando como abrigo para quem teve que sair de casa.

Tanto a polícia como os bombeiros têm chamado a atenção para que quem está em busca de parentes e amigos, procure as autoridades e vá a abrigos.

— Sobre os desaparecidos, tem pessoas que perderam filhos, irmãos, amigos e estão em pânico. Elas não querem sair do teatro de operações. De repente o familiar está no abrigo e essa pessoa em pânico, entendemos, está ali. Pedimos que essas pessoas visitem o abrigo, pois elas podem estar lá. A Civil trabalha com esses números — salienta Monteiro.

Nos últimos dias, o trabalho teve que ser interrompido algumas vezes devido às chuvas, que contribuem para deixar o terreno ainda mais instável, e a neblina, que atrapalha a visibilidade e o acompanhamento de possíveis riscos, como o rolamento de mais pedras. O secretário destaca que a permanência de voluntários e de parentes de possíveis vítimas nos locais, após terem fornecidos informações que ajudem no paradeiro e na identificação, podem a atrapalhar as equipes de resgate.

— Acredito que esse foi o primeiro maior desastre de uma cidade do estado. É natural, entendemos que a pessoa que perdeu seu filho não vai sair dali. O bombeiro precisa de informações. Voluntários especializados estão preparados para nos ajudar. O que prejudicou os bombeiros são pessoas de coração aberto, que podem ser possíveis vítimas. Então, atrapalhou após as 48h onde voluntários passaram a entrar no local da cena.