teatro

Magiluth revisita 'Morte e Vida Severina', de João Cabral de Melo Neto, em curta temporada no Recife

Quase 70 anos depois, "Estudo nº1 Morte e Vida" reflete sobre a atualidade de questões sociais que permeiam os versos regionalistas do escritor pernambucano

"Estudo N1: Morte e Vida", do Grupo Magiluth, faz curta temporada no Recife - Mariana Beda

Em 1955, o escritor pernambucano João Cabral de Melo Neto publicava "Morte e Vida Severina", um dos seus livros mais aclamados pelo público e crítica. Quase 70 anos depois, diante da permanência de várias questões sociais que permeiam os versos regionalistas da obra, que seguem bastante atuais, o Grupo Magiluth decidiu estudar e ressignificar o texto para encenar "Estudo nº1 Morte e Vida", em curta temporada no Recife, no Teatro Apolo, de amanhã a domingo (13) e entre os dias 17 e 20 de março, com ingressos à venda no Sympla.

Morte, vida e pandemia
Após estrear a montagem "Apenas o Fim do Mundo", do dramaturgo contemporâneo francês Jean-Luc Lagarce, que rendeu visibilidade ao grupo, o Magiluth decidiu levar sua dramaturgia para outro lugar nesta nova montagem, que se debruça sobre os versos de João Cabral. "A gente pensou que seria legal fazer algo que fosse de uma origem e característica muito forte brasileira, que não necessariamente fosse contemporâneo, que trouxesse coisas mais icônicas dentro da sua história", conta o ator e integrante do Magiluth, Giordano Castro.  

Com estreia inicialmente prevista para 8 de maio de 2020, a montagem já estava nas últimas semanas de ensaios quando as medidas sanitárias endureceram em razão da pandemia, levando ao fechamento de todos os serviços não essenciais. "Dentro desse processo aconteceram várias mortes para que houvesse a vida. Aconteceu como na trajetória desse livro. E essa foi talvez a primeira morte desse trabalho", lembra Giordano.

Texto revisitado
Depois de várias tentativas de retomar a montagem que inicialmente foi pensada para o teatro de rua - as idas e vindas dos ensaios durante a pandemia diversificaram o olhar sobre o texto, que foi apurado ao longo dos últimos anos, conta Giordano. "Toda a vez que a gente recomeçava o processo, a gente retomava com uma vontade outra. Uma vontade de discutir outra coisa".

"Posso dizer que quem for assistir o 'Morte e Vida' vai rever um processo de dois anos, que trouxe marcas de uma pandemia, que discute questões do hoje, questões que são fundamentais para que a gente comece a pensar a nossa vida a partir de agora, a partir de aqui, assim como João Cabral fez. É um trabalho que busca discutir o agora", avalia o ator. "Estudo nº1 Morte e Vida" conta com direção de Rodrigo Mercadante e direção musical de Juliano Holanda.

Pautas atemporais
Estudando a poesia de João Cabral, o grupo se deparou com cenários que continuam fazendo parte da paisagem brasileira. O êxodo rural, as questões climáticas e da precarização e exploração do trabalho e outros olhares políticos que o texto sugere, além da relação do autor com o Recife e seus rios chamou atenção durante o estudo. "A gente viu que o 'Morte e Vida' servia pra gente como uma grande plataforma de hiperlinks. E era como se ali a gente abrisse janelas infinitas e cada uma dessas janelas tivesse uma discussão", conta Giordano.

"A partir daquela história, daquele Severino, a gente via uma relação com a contemporaneidade, com questões de hoje muito fortes, muito latentes. E que explodia a partir da obra de João Cabral. A poesia era incrível, aquelas palavras eram muito interessantes, mas a ideia que estava por trás daquilo era que chamava mais a nossa atenção, de uma certa forma", lembra.

"A gente começou a ver que o trabalho não era uma montagem clássica daquela história, seguindo o texto do João Cabral, mas que explodia e vinha para depois daquilo. Era quase como se a gente colocasse na mesa toda aquela poesia, aquele poema dramático e dissesse assim: 'beleza. E se hoje a gente fosse recontar essa história?', o que também não é o trabalho, não é recontar aquilo ali", pondera.
 

Pesquisa
A pesquisa do Grupo Magiluth sobre a obra de João Cabral de Melo Neto, Morte e Vida Severina atravessa uma série de estudos contemporâneos acerca de construções, formações e interações sociopolíticas no Brasil ao longo dos séculos XX e XXI. No decorrer da história do país, em inúmeras circunstâncias, pessoas foram levadas a deixar os seus territórios de origem em busca de melhores condições.

São movimentos migratórios forçados por adversidades, que fazem com que muitos se lancem em direção a lugares de novas esperanças, novas oportunidades, de uma nova vida. Somos muitos Severinos. Morte e Vida Severina é um trabalho que fala muito sobre o Nordeste, mas também sobre dinâmicas de mudança em âmbito local, regional, nacional e, mesmo, mundial mesmo que seja árdua a travessia de fronteiras.

Sobre o Magiluth
Em quinze anos de trajetória, o Grupo Magiluth desenvolveu diversos trabalhos. Foram dez montagens de espetáculo, três livros publicados, a realização do Festival Pague Quanto Puder de Artes Integradas e inúmeras performances, intervenções urbanas e oficinas. Em seu histórico há a criação de trabalhos autorais (como Aquilo que o meu olhar guardou para você e O Ano em que sonhamos perigosamente) e a montagem de textos consagrados (Viúva, porém Honesta, de Nelson Rodrigues, e a adaptação de Hamlet, para Dinamarca), além da encenação da obra Apenas o Fim do Mundo, do dramaturgo contemporâneo Jean-Luc Lagarce. 

Serviço

Estudo nº1 Morte e Vida

Teatro Apolo
De 10 a 13/03 e de 17 a 20/03
Quinta a sábado 20h e domingos às 19h
Ingressos no Sympla