Coronavírus

Dois anos de pandemia de Covid-19: estamos perto do fim?

Cenário epidemiológico indica tendência de controle da doença, mas ainda é preciso cautela

Funcionários se preparam para desinfetar quartos de hospital em Wuhan, na China - STR/AFP

Há exatos dois anos, em 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) elevou a Covid-19, outrora chamada de "pneumonia desconhecida", que havia feito vítimas na província de Wuhan, na China, ao status de pandemia, título dado quando muitos casos de uma doença atingem diversas regiões do globo em um mesmo período de tempo. Desde então, o planeta e nós já não somos mais os mesmos

Mais de 6 milhões de vidas foram perdidas no planeta, das quais 654 mil, mais de 10%, no Brasil, sem contar as mortes não notificadas oficialmente, as relações sociais passaram por transformações e atos antes comuns, como abraçar e lavar as mãos, tornaram-se objetos de inúmeros protocolos.

Esta semana, às vésperas da marca de dois anos de pandemia, o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse que "esta pandemia está longe de terminar e não terminará em lugar algum se não conseguirmos [terminar] em todos os lugares". 

Isso porque o mundo ainda enfrenta uma vacinação heterogênea, além da possibilidade iminente da chegada de novas variantes tão transmissíveis quanto a ômicron ou letais como a delta. Enquanto países desenvolvidos, como os Emirados Árabes Unidos, já atingem patamares próximos aos 100% de vacinados com o esquema completo, os mais pobres, como a Nigéria, estão longe de alcançar sequer 10%

Apesar dessa desigualdade, o mundo começa a ver sinais de melhoria, ainda que aos poucos. No Brasil, após a tsunami da variante ômicron, cidades e estados, como São Paulo e Rio de Janeiro, começaram a liberar o uso de máscaras até em espaços fechados, como é o caso da capital fluminense. 

O cenário epidemiológico atual, com óbitos e internações em queda e protocolos sanitários um pouco mais flexíveis, aponta para um futuro de mais esperança, garantido pelo avanço da taxa de vacinação, embora o percentual da população com a dose de reforço aplicada ainda caminhe a passos muito lentos - Pernambuco, por exemplo, tem menos de 40% dos adultos com três doses, hoje necessárias para a completude do esquema vacinal.

Já podemos falar em fim da pandemia?
Para o médico pediatra Eduardo Jorge da Fonseca Lima, representante da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim) no Comitê Técnico Estadual para Acompanhamento da Vacinação contra a Covid-19, a pandemia deixou lições importantes. “Fomos aprendendo com o próprio vírus. As verdades foram sendo desfeitas e mais uma vez a ciência que deu os resultados e não os achismos”, disse à Folha de Pernambuco.

Eduardo acredita que, caso o cenário atual de queda contínua permaneça, poderemos falar nos próximos dois meses em uma endemia de Covid-19 no País. “A gente começa a ver luz no fim do túnel, acredito que a pandemia esteja terminando. Pandemia para se transformar em endemia não depende da decisão de um político, mas do dado epidemiológico”, acrescentou.

Eduardo Jorge da Fonseca, médico representante da SBIm no Comitê Estadual de Vacinação (Foto: Douglas Fagner/SEI)

A fala vem na esteira do que foi dito pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, no início do mês. Em entrevista à CNN Brasil, o gestor afirmou que o Governo Federal avalia mudar a classificação de pandemia para endemia na segunda quinzena de março, a partir da queda de casos graves da doença no País. A possibilidade foi reverberada pelo presidente Jair Bolsonaro.

É cedo para dizer que estamos no fim da pandemia, pois a Covid-19 ainda é uma doença que mata cerca de 400 brasileiros por dia, segundo Eduardo Jorge. “O trabalho da vacinação foi bem feito, mas ainda temos um contingente importante de pessoas que não tomaram a terceira dose, temos 50% de crianças não vacinadas. Precisamos dessas pessoas para termos maior tranquilidade”, completou o médico.

Em relação à não obrigatoriedade das máscaras, o médico acredita que seria precipitada a adoção neste momento, uma vez que o Estado passará até junho pelo período de sazonalidade de doenças respiratórias, como a gripe. 

“Acredito que a máscara para as pessoas de risco [como idosos e imunossuprimidos] deve persistir por mais um tempo, seria o ideal. Acredito que a pandemia mostrou que diante de um quadro respiratório qualquer, como resfriado e gripe, as pessoas precisam aprender as lições básicas de lavar as mãos e não ir trabalhar para não contaminar os outros”, fechou o médico.

Pesquisador Jones Albuquerque (Foto: Divulgação)

Pesquisador do Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami (Lika) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e do Instituto para Redução de Riscos e Desastres de Pernambuco da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Jones Albuquerque é mais cauteloso com as projeções. Ele diz que, com o aumento recentemente observado de casos novos em países da Ásia e da Europa, o risco pandêmico piorou no mundo

“No Brasil e aqui no nosso Estado, estamos com os indicadores em queda, o que é excelente. O porém é que hoje Pernambuco entrou num momento de risco igual a gente estava com a delta, em 11 de junho de 2021”, alertou Jones, acrescentando que, com o cenário de redução, poderíamos falar em dois ou três meses em retirada de máscaras e medidas, mas “a pandemia está reacendendo no mundo”

Não podemos falar de horizonte, de fim, ninguém sabe essa resposta. O presidente da Pfizer disse que haverá uma vacina para múltiplas variantes para acabar com esse negócio de quarta, quinta e sexta dose. A gente tem uma longa estrada e precisamos de fato aprender a melhorar o nosso distanciamento em tudo”, ponderou Jones Albuquerque. 

Como principais medidas aprendidas ao longo destes dois anos, o pesquisador elenca a maior transparência nas informações, a melhoria no atendimento a casos graves no sistema de saúde e a chegada da vacina. Jones espera para 2023 uma redução drástica da doença, com o advento da vacina para múltiplas variantes do Sars-CoV-2 e mais segurança sanitária em 2024. “Quem sabe a gente já tenha Carnaval e São João”, finalizou. 

Pernambuco
Em Pernambuco, os dois primeiros casos de Covid-19 foram confirmados em 12 de março de 2020, um dia após a OMS declarar pandemia. A primeira morte foi notificada 14 dias depois, em 26 de março. Desde lá, o Estado acumula quase 860 mil casos e mais de 21,1 mil mortes

Nos primeiros meses de pandemia, o Estado decretou calamidade pública, fechou comércio e atividades consideradas não essenciais e instaurou isolamento social em cinco municípios da Região Metropolitana do Recife. Em junho de 2020, uma lei determinou o uso obrigatório de máscaras, algo que perdura até os dias de hoje. 

Entre pioras e melhoras do cenário epidemiológico, outras medidas foram adotadas pelo Governo do Estado, como restrições em cidades do Interior, suspensão de festas populares como o Carnaval e a aplicação do Plano de Convivência com a Covid-19, protocolo estadual que versa sobre as restrições e flexibilizações dos setores. 

Atualmente, Pernambuco tem 50% dos 1.041 leitos de terapia intensiva na rede pública ocupados com pacientes com quadro suspeito ou confirmado para Covid-19.