Justiça nega pedido da Prefeitura de Paulista por prazo maior para volta às aulas presenciais
Magistrado alegou "negligência" e associou situação a uma "epidemia de analfabetismo, evasão escolar e agravamento da desigualdade social"
O juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Paulista, Ricardo de Sá Leitão Alencar Júnior, negou, nessa quinta-feira (17), o pedido da prefeitura por um prazo maior para a volta às aulas presenciais dos 20 mil estudantes da rede municipal de ensino.
Mais de dois anos após o início da pandemia de Covid-19, a cidade é a única da Região Metropolitana do Recife que ainda não retornou às atividades presenciais.
A prefeitura havia solicitado um cronograma em resposta à liminar que determinava o retorno até 17 de março, sob pena de multa diária de R$ 20 mil. O juiz entendeu que o município "tem-se escorado na pandemia para justificar sua inoperância".
A prefeitura havia solicitado o escalonamento para a volta às aulas agrupando as escolas em três grupos, com períodos para tempo de retorno que variavam entre 45 e 90 dias.
"Este se mostra o real motivo do atraso: o Poder Público municipal negligenciou a manutenção e estruturação das unidades de ensino, abrigando-se à confortável sombra da pandemia de Covid-19, à qual, por deliberada inércia, fez associar-se uma epidemia de analfabetismo, evasão escolar e agravamento da desigualdade social", afirmou o juiz na decisão interlocutória.
Em comunicado emitido na quinta-feira, a Secretaria de Educação de Paulista informou que realiza a manutenção e recuperação de cinco unidades de ensino: Escola Municipal Maria das Neves, em Jardim Paulista Baixo; Creche Tio Roberto, em Maranguape I; Creche Municipal Maria Anunciada de Arruda, em Chega Mais; e Escola Municipal Maria Conceição da Paz, em Maranguape II.
A gestão ainda alegou que o processo licitatório para a reforma das demais unidades de ensino "já está sendo concluído", sem citar prazos. A prefeitura acrescentou que solicitou reconsideração do prazo da decisão liminar, o que foi negado pelo juiz Ricardo de Sá Leitão Alencar Júnior.
"O pedido de reconsideração é uma verdadeira confissão, uma demissão de culpa por omissão. Na verdade, a petição escancara o real motivo do fechamento das escolas: negligência", disparou o magistrado.
O juiz ainda ressaltou que a cidade de Paulista "não possui uma escola sequer em condições de funcionamento" e criticou a justificativa relacionada à falta de recursos provocada pelo bloqueio dos precatórios do extinto Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).
"As intervenções aqui tratadas são custeadas por outra rubrica orçamentária - os repasses regulares do Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação]", disse o juiz.
A Folha de Pernambuco tentou contato com a Prefeitura de Paulista para repercutir a decisão judicial, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
Demora pode levar prefeito a perder o cargo
O juiz Ricardo de Sá Leitão Alencar Júnior irá comunicar o procurador-geral de Justiça para averiguar se houve crime de responsabilidade por parte do prefeito Yves Ribeiro, bem como avaliar a viabilidade de ingresso com uma representação para "intervenção estadual" na rede municipal de Paulista.
Segundo os dispositivos da decisão interlocutória, o fundamento para essas medidas, além do descumprimento da ordem judicial, seria a "gravíssima sonegação do direito fundamental à educação".
Com o comunicado feito pelo magistrado, o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), se assim entender, irá avaliar o possível crime de responsabilidade. Neste cenário, o órgão ministerial denunciaria o prefeito ao Tribunal de Justiça, o que poderia ensejar a perda do cargo.
Por fim, também caso o MPPE entenda, pode ser feita a intervenção estadual, o que levaria o Estado a assumir a educação básica de Paulista com medidas como locar imóveis, ampliar a própria rede estadual de ensino para receber os estudantes.
Multa revertida para fundo de direitos
Segundo o Tribunal de Justiça de Pernambuco, as multas nas ações coletivas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) são revertidas para o fundo dos direitos de crianças e adolescentes - neste caso, para o fundo municipal.
Em Paulista, o fundo é o Conselho Municipal de Promoção e Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paulista (Comcap), que é gerido de forma autônoma e custeia o atendimento a crianças nos mais diversos programas de atendimento - socioeducativo, protetivo, instituições de acolhimento.