Pontes diz que entregar ministério ao centrão seria equivalente a botar político pilotando caça
Ministro revela que está trabalhando com 50% da necessidade das unidades de pesquisa
O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, é um dos oito integrantes do primeiro escalão da equipe apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro que está na mesma cadeira desde o início do governo. Por pouco tempo. O astronauta deixará a Esplanada para disputar uma vaga de deputado federal pelo PL de São Paulo.
A dois dias se despedir da pasta, Pontes afirma que só aceitou se lançar às urnas depois de ter certeza de que não seria substituído por um indicado do centrão, grupo político que tem o PL, sigla em que ele acaba de ingressar, como um dos pilares.
Questões partidárias à parte, Pontes compara o ministério que comanda a um caça, máquinas que, segundo ele, não devem ser entregues a políticos.
— Fica muita especulação 'Ah, vai entrar algum político no lugar', mas não funciona porque o ministério aqui é igual você pegar um (caça) F5 e dizer: está vendo aquele F5 ali? Sobe nele e voa. Não dá certo. Aqui é um ministério técnico. Essa era uma primeira premissa que eu coloquei para sair deputado federal — afirmou, acrescentando que além de ter perfil técnico o novo ministro tem que ser da sua equipe.
Como antecipou ontem o Globo, ele disse ter combinado com o presidente Jair Bolsonaro que o secretário de Empreendedorismo e Inovação, Paulo Alvim, será o seu substituto.
Marcos Pontes revela ainda que estuda retomar o ministério ao fim da campanha, conta que sonha com a possibilidade de Bolsonsaro tomar a vacina contra a Covid-19 que vem sendo desenvolvida no Brasil e admite que seus apelos ao ministro da Economia, Paulo Guedes, para corrigir o déficit de pessoas e a remuneração dos pesquisadores brasileiros não sensibilizaram o dono do cofre.
— Eu estou trabalhando com 50% da necessidade das unidades de pesquisa — acrescentou.
A seguir, confira os principais trechos da entrevista ao Globo:
Qual o perfil ideal para substituí-lo no ministério?
Isso é interessante porque estou saindo agora, no dia 31, e aí fica muita especulação: 'ah, vai entrar algum político no lugar', mas não funciona porque o ministério aqui é igual você pegar um (caça) F5 e dizer: 'está vendo aquele F5 ali? Sobe nele e voa nele'. Não dá certo. Então, aqui o ministério é técnico, bem técnico e precisa ser para ter resultados.
Essa era uma primeira premissa que eu coloquei para sair e ser candidato a deputado federal. Eu falei assim, eu vou ser candidato, mas a gente precisa ter uma substituição técnica para ficar no meu lugar por esses seis meses que eu fico afastado (durante a campanha). Volto depois das eleições para acompanhar até o final do ano. Além de ser perfil técnico, tem que ser da minha da minha equipe. Porque demora um tempo até você pegar a mão do que está acontecendo.
Algum nome em mente, ministro?
Tem. Eu já conversei com um presidente e já está definido o nome: Paulo Alvim, nosso secretário de empreendedorismo e inovação aqui do ministério. Ele tem todas as qualidades, mais de 40 anos de experiência no mercado de empreendedorismo. Ele conhece muito bem todos os projetos que a gente desenvolve. No final, na soma de tudo, é o ideal para que haja a menor movimentação. Então a gente chegou à conclusão, com o presidente (Bolsonaro), que o Paulo Alvim seria o ideal para fazer isso.
O senhor deu uma declaração de que, se fosse um nome do centrão, até falando da senadora Daniella Ribeiro (PP-PB), o senhor desistiria da candidatura. Isso gerou algum desgaste?
Não, porque isso já era sabido quando eu me propus a ser candidato por São Paulo, que eu fosse substituído por alguém técnico. Qualquer outra substituição não faria sentido, era melhor eu ficar aqui em termos de relevância para o país.
Mas, então, não há ruído com o centrão?
Não, não tem desgaste. A gente segue o script aqui, sem qualquer outra coisa, sem emoção envolvida.
Quais são os planos de campanha? E as bandeiras que o senhor pretende defender no Congresso?
A partir da semana que vem, eu vou virar o foco para as eleições, talvez eu esteja até atrasado em relação a procedimentos. Tenho que aprender um bocado e conversar com quem entende. Como ministro, eu percebi como várias propostas relevantes passam pelo Congresso.
Fiquei com especial interesse pela saúde. Notei, por causa da pandemia, como a tecnologia pode ser usada para salvar a vida das pessoas. A gente pode trabalhar no Congresso também de forma a aumentar a capacidade do país nisso. Tenho tendência de trabalhar nesse setor, tudo o que possa ser usado na ciência e tecnologia para melhorar a qualidade de vida das pessoas. Também é natural pela minha formação, tudo o que se trata de aviação, a parte militar também, tudo isso está no meu DNA.
O que acha de o presidente Bolsonaro não ter se vacinado contra a Covid-19?
Essa é uma coisa que eu tenho conversado com ele já algumas vezes e com outros ministros também. Não sei, eu não quero adiantar nada, mas agora nós temos a nossa vacina sendo testada aqui, então eu acho que seria uma ótima coisa ele poder se vacinar com a vacina nacional. Ele é um cara muito patriota, eu acho que seria uma coisa muito bacana. Eu ficaria muito orgulhoso.
É possível prever quando a vacina brasileira estará pronta?
A previsão é de nove meses a partir do início, que foi em janeiro. Então, lá em outubro, novembro, por aí já deve ter essa vacina determinada. Uma fábrica (de vacinas) está sendo construída em Salvador (BA) e já tem outra em São Paulo. Com isso, o Brasil vai ser capaz de produzir vacina para qualquer coisa. Eu costumo resumir assim: se o mundo não quiser vender vacina para a gente, a gente vende vacina para o mundo.
O senhor é conhecido como um nome técnico. Desde que assumiu a pasta, como é lidar com a pressão política para tomar certas decisões, especialmente durante a pandemia?
Eu faço, simplesmente. Essa é uma coisa que o presidente me deu liberdade para fazer e falou assim: 'olha, você decide lá no ministério, tanto em termos de quem você vai trazer quanto no que você vai fazer'. Eu continuo a tocar o trem. Acho que o pessoal já se acostumou comigo. Eu não sou muito de ficar no Twitter, eu só costumo colocar o que o ministério está fazendo. O cientista não é um tipo de pessoa que gosta de aparecer. Ele ou ela faz o trabalho e vai tocando assim. Eu só faço o que tem que ser feito.
O senhor levou esses argumentos da importância do investimento no setor ao Paulo Guedes (ministro da Economia)?
Sim, e deu resultado. O nosso orçamento melhorou. Esse ano, de uma forma interessante, acho que melhorou a arrecadação. A Economia usa um sistema para ir liberando gradualmente o dinheiro aos ministérios baseando-se na expectativa de arrecadação. No ano passado a gente trabalhou com 1/18 avos (do orçamento previsto) por mês, então fica tudo apertado.
Quais foram as consequências de as Comunicações terem saído do escopo da pasta para virar um ministério próprio?
Foi complicado naquele momento. Então, o ministério aqui sangrou bastante, a gente perdeu muito cargo, teve que reestruturar o ministério inteiro. Não foi fácil, mas a gente conseguiu fazer. Tudo isso são adaptações que você tem que fazer.
Quais os principais desafios do ministério hoje?
O pessoal geralmente fala de orçamento, mas isso já está equacionado. O problema complexo do ministério, que eu já falei desde 2019, é pessoal.
Por quê?
A gente não tem concurso público. E os centros de pesquisa precisam de concurso para repor os pesquisadores. Eu estou trabalhando com 50% da necessidade das unidades de pesquisa. O pessoal fala que sou muito sincero, mas eu tenho que falar o que está acontecendo.