Artes Plásticas

Juliana Notari representa a arte brasileira no Parlamento Europeu, na Bélgica

O evento foi criado com o objetivo de trazer a contribuição da arte para a igualdade de direitos

A artista visual Juliana Notari - Divulgação

O trabalho da artista visual recifense Juliana Notari voltou a ganhar destaque mundial, nesta quarta-feira (30), no evento "A arte abraça a política - a perspectiva da arte sobre questões de gênero", realizado pelo Parlamento Europeu na cidade de Bruxelas, na Bélgica. Juntamente com a artista visual polonesa Nespoon, Juliana recebeu o convite para esse encontro, no início do ano, pelo eurodeputado italiano Marco Zullo, que integra o movimento "Renew Europe". Também participam a eurodeputada espanhola Maria Soraya Rodríguez Ramos e Robert Biedroń, da Nova Esquerda da Polônia.

O evento foi criado com o objetivo de trazer a contribuição da arte para a igualdade de direitos. Em sua fala, a artista fez uma intervenção performática e apresentou um recorte de sua produção mais recente, incluindo a intervenção na paisagem Diva - localizada numa colina na Usina de Arte, em Água Preta, no Litoral Sul de Pernambuco - que ganhou repercussão nacional e internacional no início do ano passado. Além de apresentar suas obras, a artista também levará aos europarlamentares alguns dados sobre a violência de gênero no Brasil.

 


O papel transformador da arte
Em sua participação no evento, a artista pretende abordar a força do fazer artístico e político para promover mudanças sociais. "A arte e a política têm o poder de transformar o modo como a gente vive na sociedade e de causar rupturas. Um deputado ou um presidente, por exemplo, quando fazem uma Lei, causam uma ruptura na sociedade e a arte também pode causar essa ruptura", avalia a artista. 

"São questões que mexem com a sensibilidade, com a afetividade e com a maneira de estar no mundo e é a partir daí que a arte pode abrir novas possibilidades políticas através dos afetos, da sensibilidade. A arte tem essa força". Em sua participação, Juliana pretende debater a relação da arte com a política dentro do contexo do Brasil e do universo feminista e refletir como o seu trabalho dialoga com essas questões. 

O corpo da mulher
A política e o feminismo sempre permeou a obra da artista e um símbolo tem acompanhado sua trajetória artística: a ferida vulva. Essa imagem aparece em diversas linguagens como desenho, intervenção, vídeo e performance. Há mais de 20 anos, a artista encontrou, na sede da Trapeiros de Emaús - associação que vende objetos usados no bairro de Água Fria, no Recife - 22 espéculos de metal (instrumentos médicos para manter as cavidades femininas abertas para que fossem vistas, acessadas e tratadas). Todas essas peças tinham gravadas as incrições "dra. Diva", indicando o nome da médica ginecologista que as usava.

A partir dessa descoberta, a artista começou a fazer a performance "dra. Diva", abrindo cavidades em paredes de museus no Brasil e no exterior. A ideia era macular aquelas paredes e causar essa reflexão sobre a violação do corpo feminino. "Porque a arte a gente sabe que pretende ser aquele cubo branquinho e limpinho, mas na realidade eu vou lá e maculo com essa ferida vulva e trago essa violência, tentando trazer isso justamente em relação ao corpo da mulher. E ali estou simbolizando que essa violência é institucional também", explica. 

Arte, empoderamento e rebelião
Apesar do receio de ser rotulada na prateleira da arte feminista, pois também se interessa em falar sobre outros temas, como, por exemplo, a morte da linguagem, as questões de gênero são marcantes no universo da artista. "A partir do momento que eu faço Diva, que é aquela obra que é uma vulva grande em uma montanha, aquilo ali traz um empoderamento das mulheres", opina.

"É por isso que eu estou aqui no Parlamento Europeu. Porque é milenar esse medo da vagina, da mulher e da potência do desconhecido, do prazer do gerar, do sangue. Tudo isso amedronta porque é muito potente. Então, há essa agressão, essa misoginia, esse sexismo - e 'Diva' é um bom exemplo disso - em forma de ódio, em forma de apagamento, de inferiorização e de deslegitimação da mulher, querendo dizer que não é obra de arte, para manter a estrutura como está. (...) Acho importante que Diva, enquanto arte, pode dialogar e até contrapor certas narrativas que estamos vivendo no Brasil que são completamente obsoletas, fascistas e conservadoras", aponta.