Polícia mira suposto "Golpista do Tinder" brasileiro
Inquéritos no Rio e em São Paulo apuram se o mineiro de 33 anos agia contra homens que conhecia pormeio de aplicativo de relacionamento; no perfil, ele ostenta roupas de grife e viagens de primeira classe
Em dezembro de 2021, o empresário paraibano X., de 38 anos, conheceu, em um aplicativo de relacionamento, o mineiro Rafael Correa de Paula, de 33. Afirmando ser herdeiro e administrador das fazendas da família na cidade de Frutal, ele exibia fotos nas redes sociais ostentando roupas e acessórios de grife e viajando de primeira classe para paraísos luxuosos, como Dubai, nos Emirados Árabes Unidos; Grécia, na Europa; e até o Deserto do Saara, na África.
Algumas semanas depois, os dois marcaram o primeiro encontro, em um hotel cinco estrelas na Avenida Vieira Souto, orla de Ipanema, na Zona Sul do Rio. Dali, engataram um romance, e o empresário foi convidado a acompanhá-lo em viagens internacionais, com a promessa de que era possível conseguir bons preços com descontos em milhas aéreas que ele acumulava. De posse de seu cartão de crédito, o rapaz desembolsou cerca de R$ 70 mil em quatro meses com passagens e hospedagens.
Desconfiando ter caído em um golpe, X. decidiu terminar o relacionamento. Mas, a partir de novembro do ano passado, diz ter começado a ser perseguido pelo ex-namorado: além de perfis falsos nas redes sociais, em que passou a publicar informações para prejudicar sua imagem, ele passou a utilizar seus dados pessoais e bancários para fazer compras de altos valores pela internet e ainda solicitou o cancelamento de seus cartões de crédito e o estorno de valores já pagos pelo empresário.
Agora, as polícias civis do Rio e de São Paulo investigam o comportamento de Rafael Correa de Paula — que guarda semelhanças com o “Golpista do Tinder”, série de TV que conta a história de mulheres enganadas pelo israelense Shimon Hayut, que se passava por Simon Leviev, filho do magnata de diamantes Lev Leviev, para cometer fraudes. Nos dois estados, há inquéritos abertos pelos crimes de estelionato, ameaça, difamação, lesão corporal e denunciação caluniosa contra Rafael de Paula.
— No início, ele dizia cuidar da parte financeira das terras em que os pais criavam gado e cultivavam cana-de-açúcar, demonstrava circular na alta sociedade no eixo Rio-São Paulo e apresentava viagens com roteiros exclusivos e hotéis caríssimos. Nesse primeiro momento, a conversa e a companhia eram agradáveis, mas, com o passar do tempo, passei a ter certeza de que era tudo uma farsa, uma mentira completa da qual tinha sido vítima — contou o empresário.
Em dezembro, X. procurou a 14ª DP (Leblon), onde registrou uma ocorrência após Rafael invadir o prédio onde mora, no Arpoador. Já o rapaz foi até a 13ª DP (Ipanema) dizer ter sido vítima de socos e chutes por parte do empresário. Neste inquérito, imagens de câmeras de segurança desmentiram a versão apresentada na delegacia, e ele acabou indiciado por atribuir falsamente um crime ao ex-companheiro.
No 78º DP (Jardins), em São Paulo, Rafael responde a um inquérito por, após terminar o relacionamento de dois anos e meio com um arquiteto, impedi-lo de deixar seu apartamento, segurando seus braços e pescoço. Na distrital, o homem contou ser vítima de violência psicológica, ameaça e constrangimento.
Já no 13º DP (Campinas), ele é acusado em um procedimento por lesão corporal por ter supostamente dado um tapa em uma mulher que trabalhava como caixa de um mercado, após ela dizer que não teria troco para R$ 100 durante o pagamento de uma compra. Ela entrou com um pedido, no Juizado Especial Cível da cidade, de uma indenização de R$ 14 mil por danos morais.
Na 1ª Vara Cível do Fórum de São Paulo, a proprietária de um apartamento no bairro Jardim Paulista o executou cobrando R$ 4.900 pelo aluguel de um imóvel cujo contrato foi reincidido.
Rafael também é réu em um processo na 2ª Vara Criminal de Ribeirão Preto por ter, utilizando dados de outro homem, contratado três pacotes de viagem no valor de R$ 2.300 de uma agência de turismo, por meio de um financiamento.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, o homem só percebeu ter sido vítima do golpe ao tentar abrir uma conta bancária e ser informado da restrição que havia em seus dados cadastrais devido à dívida.
Na ocasião, ao prestar depoimento no 1º DP (Ribeirão Preto), Rafael contou ter estudado com a vítima por três anos em um colégio particular em Frutal, no interior de Minas Gerais, tendo mantido laços de amizade com ela até brigarem por “motivos banais”.
Ao delegado Udelson Canova Simionato, ele disse que o financiamento foi autorizado pelo rapaz, após ele informá-lo que gostaria de viajar para a Argentina, mas estava com “restrição com o cartão de crédito”.
Na delegacia, Rafael afirmou desconhecer o motivo pelo qual “duas parcelas ficaram em abertas”, mas chegou a mostrar uma comprovação de quitação dos débitos.
Procurado pelo Globo por telefone e redes sociais, Rafael Correa de Paula não retornou os contatos.