Saiba os critérios da Funai para conceder medalha do Mérito Indigenista a Bolsonaro
Sugestão de homenagem ao presidente e outras autoridades foi aceita por unanimidade
Ao sugerir a entrega da Medalha do Mérito Indigenista ao presidente Jair Bolsonaro, diretores da Fundação Nacional do Índio (Funai) listaram como justificativas a atuação do governo junto aos indígenas durante a pandemia de Covid-19 e o incentivo do chefe do Executivo federal à produção dentro de terras indígenas, dois aspectos pelos quais o titular do Palácio do Planalto foi criticado por defensores das causas indígenas.
A honraria foi concedida no mês passado pelo Ministério da Justiça, pasta à qual a Funai está vinculada, a Bolsonaro e a dez ministros do governo, além de outras autoridades e de indígenas, totalizando 26 pessoas. Criada em 1972, a condecoração é um "reconhecimento pelos serviços relevantes em caráter altruísticos, relacionados com o bem-estar, a proteção e a defesa das comunidades indígenas".
A indicação dos agraciados é feita pela Funai. De acordo com documentos obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), a lista dos homenageados foi definida durante três reuniões da diretoria colegiada da fundação, realizadas entre fevereiro e março. Todas as indicações foram aprovadas por unanimidade.
O nome de Bolsonaro e dos ministros foi apresentado em uma reunião no dia 25 de fevereiro. A ata da reunião não identifica quem apresentou cada indicação. Estavam presentes o presidente do órgão, Marcelo Xavier, o diretor de Administração e Gestão, Rodrigo de Sousa Alves; o diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável, Fernando Fantazzini Moreira; e o diretor de Proteção Territorial, César Augusto Martinez.
Barreiras sanitárias e cestas básicas
De acordo com o documento, a indicação de Bolsonaro se dá, entre outras razões, pela "implementação de barreiras sanitárias, com o objetivo de proteger as terras indígenas contra a disseminação da Covid-19". Também foi citada a distribuição de "1 milhão de cestas básicas e 190 mil kits de proteção para as famílias indígenas".
A atuação do governo junto à população indígena durante a pandemia foi investigada pela CPI da Covid no Senado. Entre os pontos que entraram na mira dos senadores estava a suspeitas de distribuição em aldeias de remédios comprovadamente ineficazes por tratamento da doença, os chamados "kit Covid".
Já a instalação de barreiras sanitárias ocorreu apenas após uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), referendada depois por toda a Corte. Além disso, em julho de 2020, Bolsonaro sancionou um projeto que tratava de medidas de proteção a povos indígenas durante a pandemia, mas vetou a obrigatoriedade do governo de fornecer acesso a água potável, materiais de higiene e limpeza, instalação de internet e cestas básicas para as aldeias.
No ano passado, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) apresentou uma denúncia ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, acusando o presidente de genocídio, por sua suposta omissão na pandemia. Denúncia semelhante já havia sido apresentada pelo cacique caiapó Raoni Metuktire, também ao TPI.
Entrega de 40 tratores
A ata da reunião da Funai também afirma que a atuação de Bolsonaro na infraestrutura foi "fundamental", pois "beneficiou famílias indígenas com a entrega de 40 tratores agrícolas e demais equipamentos para as comunidades indígenas de diferentes regiões do Brasil". Essas ações teriam o objetivo de "propiciar autossuficiência alimentar e econômica às comunidades, ou seja, o tão sonhado protagonismo indígena".
Outro motivo citado foi o "incentivo à produção sustentável", descrito como "pauta relevante para o presidente da República, focando no direito dos indígenas de produzirem e buscarem melhores condições de vida". No mês passado, ao receber a medalha, Bolsonaro fez referência ao projeto de lei que visa liberar mineração em terras indígenas, tratado como prioridade pelo governo, ao dizer querer que os indígenas "façam em suas terras exatamente o que nós fazemos na nossa".