Política

Câmara rejeita requerimento de urgência para análise do PL das Fake News

Deputados decidiram pela tramitação mais longa do texto, que passará por comissões da Casa

Plenário da Câmara dos Deputados - Antonio Cruz/Agência Brasil

Após a mobilização do presidente Jair Bolsonaro contra o Projeto de Lei das Fake News, a Câmara dos Deputados rejeitou nesta quarta-feira (6) um requerimento que acelerava a tramitação do texto. Por 249 votos a favor e 207 contrários, um pedido de urgência foi rejeitado. Eram necessários 257 votos, apenas oito a mais, para aprová-lo e levar a proposta diretamente ao plenário.

Isso significa que os parlamentares optaram pela tramitação mais longa do texto, com análise por outras comissões — a proposta foi elaborada por um grupo de trabalho. O projeto relatado por Orlando Silva (PCdoB-SP) institui novas regras de atuação para plataformas digitais e provedores de internet, além de criar mecanismos para coibir a disseminação de notícias falsas.

Apesar da derrota, o relator disse que tentaria dialogar com os parlamentares e debater alterações do mérito para pautar novo requerimento de urgência — o que é possível regimentalmente.

"Nós procuramos, no texto, encontrar um caminho para identificar quem é o autor da fake news que se espalhou por aí. Todos os deputados aqui já devem ter vivido momento de ser vítima de fake news e nós não vamos construir um caminho para produzir provas, para aprofundar a investigação e quem for responsável por disseminar fake news ser punido? Nós temos obrigação de fixar regras na lei", discursou Orlando Silva em plenário.

Antes da sessão, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e a bancada do PL foram orientados por Bolsonaro a se posicionar de forma contrária ao texto. Partidos da base, como Republicanos e PP, porém, não aderiram ao chamado. O Republicanos orientou de forma contrário e o PP, a pedido de Lira, liberou a bancada.

Ao lado do governo ainda ficaram PTB, cuja orientação ficou a cargo do bolsonarista Daniel Silveira (RJ), Cidadania e Novo.

Pela manhã, Arthur Lira esteve com Bolsonaro, quando omunicou o presidente sobre a votação do tema. Ele explicou, segundo interlocutores, que era preciso estabelecer um regramento sobre o assunto, antes que o Judiciário pudesse editar normas sobre a propagação de fake news.

Antes do início da sessão, em reunião com o relator, parlamentares governistas e o líder do PL, Altineu Côrtes, comunicaram que iriam se posicionar contra o projeto. Na conversa, Côrtes afirmou que a sua opinião era “a opinião do governo”.

Durante a votação, partidos que se posicionaram a favor da urgência também tiveram grande dissidência, como MDB e União Brasil.

Em plenário, Ricardo Barros também se posicionou de forma contrária, mas afirmou que, com mais tempo, negociaria para que haja alterações.

"Precisamos avançar no entendimento do texto. Acho que podemos chegar a um bom termo para regulamentar a internet. Cabe ao parlamento fazer, antes que o Judiciário faça", disse Barros.

As plataformas de mensagem, como WhatsApp e Telegram, terão que limitar a distribuição massiva de conteúdo. Listas de transmissão, por exemplo, só poderão ser encaminhadas e recebidas por pessoas que estejam identificadas, simultaneamente, nas listas de contatos dos remetentes e destinatários. O texto também prevê prisão de um a três anos a quem promover ou financiar disseminação em massa de mensagens, por meios automatizados, que contenham fato que sabe inverídico "capaz de comprometer a higidez do processo eleitoral ou que possa causar dano à integridade física".

As plataformas com mais de 10 milhões de usuários no país terão que contar com uma representação jurídica no Brasil, capaz de responder a decisões de esferas administrativa e judicial, inclusive a eventuais penalizações, como multas. A proposta ampliou as exigências para essa representação, após o caso do Telegram, que até o mês passado não contava com representante no país e não respondia a decisões da Justiça brasileira.

O PL equipara as plataformas digitais aos meios de comunicação social no que se refere à utilização indevida dos serviços nas eleições. A redação é inspirada em uma tese fixada pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado, que entenderam que o “uso de aplicações digitais de mensagens instantâneas visando promover disparos em massa contendo desinformação e inverdades em prejuízo de adversários e em benefício de candidato" pode configurar abuso de poder econômico. Com a medida, será possível pedir investigação contra candidatos e partidos pelo uso indevido das plataformas.

As plataformas terão que elaborar e publicar relatórios de transparência semestrais com informações sobre a moderação de conteúdo. Nos relatórios, as redes terão que apresentar, por exemplo, informações como o número de usuários no Brasil, dados sobre medidas aplicadas a contas e conteúdos por descumprir regras, pedidos de revisão e sanções revertidas. Metodologias detalhadas sobre as ferramentas automatizadas usadas na moderação poderão ser requeridas pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

O projeto prevê estender a imunidade parlamentar para as redes sociais. Especialistas avaliam que a medida pode dificultar a moderação de conteúdo, seja a retirada de postagens que descumpram regras, a redução de seu alcance ou o uso de rótulos para indicar desinformação, e criar uma "blindagem" a políticos, diante do risco de judicialização sobre as medidas adotadas pelas plataformas. Já seus defensores alegam que o texto apenas reproduz o que já está previsto na Constituição. O projeto também estabelece obrigações a contas de detentores de cargos públicos, que ficam suscetíveis a mecanismos de transparência e não poderão bloquear usuários.

Conteúdos jornalísticos utilizados pelos provedores serão remunerados. A proposta é, com a medida,  valorizar a informação produzida pelo jornalismo profissional como forma de combater a desinformação. Serão contempladas empresas constituídas há pelo menos um ano da publicação da lei, que produzam conteúdo jornalístico original de forma regular, organizada, profissionalmente e que mantenham endereço físico e editor responsável no Brasil. Os critérios serão regulamentados posteriormente.