Semana Santa

Fiéis participam da Missa do Crisma, em Olinda, depois de dois anos sem público presencial

Também chamada de Missa dos Santos Óleos, a cerimônia é conhecida pela entrega de óleos para paróquias

Missa dos Santos Óleos, celebrada nesta Quinta-Feira Santa na catedral de Olinda. - Arthur Mota/Folha de Pernambuco

Após dois anos sem a presença do público, a Missa do Crisma, realizada pela Arquidiocese de Olinda e Recife, ocorreu na manhã desta Quinta-Feira Santa (14),  na igreja catedral, localizada no Alto da Sé, em Olinda. Os fiéis marcaram presença pela primeira vez desde o início da pandemia. Cerca de 150 sacerdotes, mais de 200 padres e outros religiosos como bispos, padres e diáconos também estavam presentes. 

Também chamada de Missa dos Santos Óleos, a cerimônia é conhecida pela entrega de óleos para padres das duas cidades, que usam em crismas, batismos e unção de enfermos nas paróquias.

O fluxo de fiéis foi intenso. Atenta à missa, a agente administrativa Rosália Silva Costa estava do lado de fora da catedral e conta que veio do Maranhão em uma excursão para Olinda. "A igreja está muito cheia e não tem como a gente entrar. É a primeira vez que eu estou vindo aqui e pretendo vim outras vezes, estou amando".

O arcebispo de Olinda e Recife, dom Fernando Saburido, que preside as cerimônias na igreja catedral, fala sobre a felicidade de receber novamente o público na Semana Santa: "Depois de dois anos sem a oportunidade de celebrar mais amplamente, esse ano nós voltamos com muito alegria co muito entusiasmo para celebrar a ressurreição".

Ainda nesta quinta-feira (14), haverá a segunda celebração, que inclui o rito do Lava-Pés, realizado durante celebração às 16h, na capela do Colégio Damas, na avenida Rui Barbosa, no bairro das Graças, na Zona Norte do Recife, com a presença da comunidade educativa e de diretores das escolas membros da Associação Nacional de Educação Católica do Brasil (Anec) localizadas no território da Arquidiocese. 

Programação

 

Leia na íntegra a Homilia da missa

Amados irmãos e irmãs:


Passados mais de dois anos do início da pandemia e tendo diante dos olhos a triste recordação de tantos irmão e irmãs que se foram, inclusive ministros ordenados, pessoas consagradas e seminaristas, sofremos ainda hoje as consequências. Infelizmente, diante dessa realidade, vislumbramos muito mais o mistério da cruz do que os sinais de ressurreição e vida que a Páscoa nos anuncia. Sobretudo, nesses últimos meses, quando junta-se à cruz da pandemia a tragédia da guerra. Sobre esse assunto o Papa Francisco não tem se cansado de falar. No Angelus do domingo 20 de março o mesmo declarou tratar-se de “agressão violenta e guerra repugnante e sacrílega. Como foi emocionante a celebração penitencial dirigida pelo bispo de Roma no último dia 25 de março, Solenidade da Anunciação do Senhor. O Papa Francisco rezou pela paz, em unidade com as Igrejas espalhadas por todo o mundo. Nessa ocasião, consagrou o mundo inteiro e, especialmente, a Rússia e a Ucrânia ao Imaculado Coração de Maria. Diante de tudo isso, é consolador estarmos aqui em nossa Catedral, como presbitério de Olinda e Recife, juntamente a representantes dos movimentos leigos, para esta Missa do Crisma, celebrando a unidade de nossa Igreja Particular, e rezando pelas vítimas da pandemia e da violência, assim como por seus familiares.

Neste dia em que celebramos a Instituição da Eucaristia e do sacerdócio ministerial, somos convidados a nos colocar diante de Deus e rever a maneira como estamos vivendo a imensa graça do ministério que recebemos, apesar de nossa indignidade. Sem dúvida, a graça mais sublime do sacerdócio ministerial é celebrar a Eucaristia “In persona Christi”. Neste ano de 2022 nossa arquidiocese tem, pela segunda vez, o privilégio de sediar mais um Congresso Eucarístico Nacional. Enquanto presbitério arquidiocesano, chamo a atenção para nossa responsabilidade. Estamos na reta final de sua preparação e precisamos nos envolver com alegria, afetiva e efetiva, porque depende do nosso esforço, seu bom exito espiritual e pastoral.  Com o tema “Pão em todas as mesas” e o lema “Repartiam o pão com alegria e não havia necessitados entre eles” (cf. At 2,46), busquemos crescer na consciência de nossa compreensão da Eucaristia como Pão Partilhado, espiritual e materialmente. É lamentável constatar que, em pleno século XXI ainda exista um percentual tão alto de pessoas, no Brasil e no mundo, que vivam na miséria, sem direito à moradia, escola, emprego e, sobretudo, alimentação. 


Conforme um dos mais recentes relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre segurança alimentar, em 2021, na América Latina, a fome alcançou um patamar que não se via há décadas. De acordo com a ONU, a América Latina foi a região na qual mais cresceu o número de pessoas em situação de insegurança alimentar. Também números divulgados, esses dias, no boletim “Desigualdade de Metrópoles” apontam que a região Metropolitana do Recife é uma das áreas metropolitanas do Brasil com o maior percentual de pessoas vivendo com ¼ do salário mínimo (cf. JC dia 9/4/22 – artigo de Cássio Oliveira). Isso confirma a necessidade da instalação da “Casa do Pão”, no coração da cidade do Recife, como marco do Congresso, com o objetivo de não somente oferecer o pão, mas ensinar os pobres a providenciá-lo.


Em nosso país, depois de vários anos em que tínhamos conseguido amenizar essa tragédia, o Brasil voltou ao mapa da fome. A fome chega a ameaçar mais de 20 milhões de brasileiros (cf. Folha de São Paulo, 23/ 01/ 2022). Essa realidade não é consequência direta da crise que se abateu sobre o mundo com a pandemia. A pandemia a agravou, mas ela já vinha de antes e tem mais a ver com decisões políticas que fizeram mais do que duplicar a desigualdade social em nosso país. 


Como seria bom se, a partir do XVIII Congresso Eucarístico Nacional, irmãos no ministério e grupos cristãos, indiferentes a essa realidade, pudessem acolher o que nos ensina o servo de Deus, Dom Helder Camara: “Não podemos adorar o corpo do Cristo na Eucaristia se somos indiferentes ou coniventes com os mecanismos sociais que jogam o mesmo Corpo de Cristo que são os pobres nas sarjetas do mundo. Nas horas de maior glorificação do Santíssimo Sacramento, peçamos a Cristo a graça de nos unir a todas as pessoas de boa vontade para lutar, de modo pacífico, mas corajoso, pela libertação dos oprimidos do mundo inteiro, ou melhor pela libertação do Cristo, esmagado no íntimo dos sem-vez e dos sem-voz” (Camara, 1977 - p. 770).  


O Concílio Vaticano II nos convidou a retomar essa unidade entre o pão da Eucaristia e a comunidade fraterna. Ainda no século IV, Santo Agostinho insistia: “Queres compreender o que é o Corpo de Cristo? Escuta o apóstolo dizer aos fiéis: “Vós sois o Corpo de Cristo e seus membros”. Se, portanto, sois o Corpo do Cristo e seus membros, é o próprio símbolo do que sois vós que repousa sobre a mesa do Senhor. É o próprio símbolo da vossa vida que recebeis. Respondeis ‘Amém’ ao que vós mesmos sois. Escutas: ‘Corpo de Cristo’ e respondes: ‘Amém’. Então, sê um membro do corpo do Cristo para que o teu amém seja verdadeiro” (Sermão 272).


O Evangelho de Lucas que acabamos de ouvir nos recorda o início da missão de Jesus que, na sinagoga de Nazaré, sua terra natal, afirma: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para anunciar a Boa-nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação dos cativos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar o ano da graça do Senhor”. Jesus se identifica com as palavras do profeta Isaías e as assume como seu projeto messiânico. O programa de Jesus prevê a libertação dos marginalizados, sua plena reintegração na sociedade, com a recuperação plena de tudo aquilo de que foi expropriado. A Boa Nova de Jesus consiste numa prática que leve as pessoas marginalizadas à posse da vida plena. Percebemos que as preocupações de Jesus, continuam muito atuais e justificam nossas preocupações. O projeto libertador do Mestre deve modelar o programa de vida dos discípulos. Todavia, não conseguiremos tornar nosso este caminho, se abrirmos mão do nosso compromisso com as obras do alto, dando espaço para as limitadas propostas que o mundo nos oferece.


O texto do Apocalipse recorda-nos que Deus fez de nós um reino, sacerdotes para seu Deus e Pai. A comunidade cristã é a força positiva que, junto com o Cordeiro, vence os poderes opressores que se instalam na história. Ele fez de nós sacerdotes para Deus, seu Pai. Os cristãos participam do único sacerdócio de Cristo, que consiste em instaurar o Reino de Deus na história. Não importam nossos limites e infidelidades, importa sim, a disposição de nos levantarmos e recomeçar, contando com a força de Deus. 


Que nosso SIM às respostas da renovação das promessas sacerdotais que faremos em seguida não seja vazia, mas parta do mais íntimo dos nossos corações e nos recorde o momento solene em que, na nossa ordenação, fomos questionados pelo bispo e respondemos, com convicção e alegria PROMETO. Em tempo tão difícil, somos chamados a viver a experiência da dor na solidariedade sem nunca perder a profecia e o propósito de anunciar a esperança. 


O conceito de sacerdócio implica o de consagração, cujo sinal exterior é a unção com o óleo santo. Por isso, a Igreja continua a consagrar o óleo que servirá para assinalar a fronte dos seus filhos e filhas. Conforme a tradição, nesta Missa, consagraremos o Santo Crisma para significar o dom do Espírito Santo no Batismo, na Confirmação e na Ordem. Abençoaremos também o óleo para os Catecúmenos e os Enfermos, sinais da força que liberta do mal e sustenta na provação da doença. Estes santos óleos, distribuídos para todas as nossas paróquias e comunidades, utilizados até a Páscoa do próximo ano, seja apresentado à comunidade paroquial na Celebração da Ceia do Senhor, conforme o rito proposto, como sinal de unidade e fonte de bênçãos, para todos os que com eles forem ungidos.


Participemos agora, do rito de renovação das promessas sacerdotais. Junte-se, especialmente, a mim todos os nossos irmãos bispos e presbíteros. Também nossos diáconos, religiosos/as, e o povo de Deus, aqui presente ou sintonizado conosco. Na condição de ministros ordenados e povo sacerdotal, expressemos nosso propósito de unidade e disposição de continuar firmes na fé e no anúncio do Evangelho.


Concluo, desejo desde já, a todos/as, frutuosas celebrações pascais, em suas respectivas paróquias e comunidades. Celebrações estas que terão como ponto culminante a proclamação da Páscoa do Senhor. Que a Ressurreição de Jesus, Sua vitória sobre a morte, nos sirva de sinal de esperança, na certeza de que dias melhores virão.


Parabéns aos nossos presbíteros pelo dia do padre e, para todos/as, uma feliz Páscoa.


Amém!


Dom Antônio Fernando Saburido, OSB
Arcebispo de Olinda e Recife.