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Um libertário à frente do Twitter? Posts de Musk são evasivos sobre sua ideologia

Em sua última investida, Musk criticou nesta segunda-feira o Conselho de Administração do Twitter depois que a empresa de mídia social adotou uma "pílula de veneno"

Elon Musk - Patrick Pleul / POOL / AFP

As opiniões surgiram, em 280 caracteres por vez, sobre se era bom ou ruim Elon Musk ter se oferecido para comprar todas as ações do Twitter por mais de US$ 40 bilhões e torná-lo uma empresa de capital fechado.

Musk atualmente tem uma participação de 9,1%  – o que fez dele o maior acionista da empresa e a ser indicado ao Conselho de Administração da rede social. Musk, no entanto, recusou o convite.

O perfil político de cada pessoa normalmente ditava como se sentiam sobre a questão. Conservadores aplaudiram como uma vitória da liberdade de expressão.

Os liberais temiam que a desinformação se espalharia desenfreadamente caso Musk seguisse com seu plano de desmantelar a forma como a rede social monitora seu conteúdo atualmente.

Mas o que ninguém parecia ser capaz de dizer com certeza era em que tipo de filosofia política o enigmático bilionário dono da Tesla e da SpaceX acredita.

Isso porque Musk, de 50 anos, que nasceu na África do Sul e só se tornou cidadão americano em 2002, expressa opiniões que não se encaixam perfeitamente na estrutura política binária esquerda-direita dos Estados Unidos.

Ele é frequentemente descrito como libertário, embora esse rótulo não consiga capturar o quão paradoxal e aleatória sua ação política pode ser.

Não lhe faltam opiniões sobre as questões mais pertinentes e controversas do dia-a-dia, desde os lockdowns decretados para combater a Covid-19 (“fascistas”, ele os chamou) a restrições na imigração (“discordo muito”, disse ele).
 

Não há muita consistência na miscelânea de suas declarações públicas ou em seus profusos comentários no Twitter – exceto que muitas vezes se alinham com seus interesses comerciais.

E, apesar da intensa reação política à sua oferta de comprar o Twitter, sua ideologia opaca torna difícil dizer se a euforia e o medo sobre como ele administraria a empresa são justificados.

Musk já criticou os subsídios federais, mas suas empresas se beneficiaram de bilhões de dólares em incentivos fiscais e outros tipos de apoio financeiro dos governos federal e locais nos EUA.

Ele se opôs veementemente à sindicalização, criticando o governo Biden por propor um crédito fiscal para veículos elétricos produzidos por trabalhadores sindicalizados.

Cofundador da Tesla, fabricante de carros elétricos, Musk abandonou os conselhos empresariais do ex-presidente Donald Trump depois que o governo desistiu do acordo climático de Paris.

Mas ele recentemente entrou em conflito com ambientalistas por pedir um aumento imediato na produção doméstica de petróleo e gás, embora isso não fosse útil para seus próprios negócios de carros elétricos e energia solar.

É um entusiasta declarado da Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que assegura o direito de expressão e a liberdade de imprensa. No entanto, tentou forçar um jornalista a testemunhar em um processo de difamação contra ele, e muitas vezes teve reações exageradas às críticas da imprensa.

Quatro anos atrás, Musk aventou a ideia de criar um site para avaliar a credibilidade de repórteres, chamando-o de Pravda, em uma estranha alusão à publicação de propaganda da União Soviética. Nada saiu do papel.

Um investidor de capital de risco escreveu longamente sobre Musk ter cancelado sua encomenda de um novo Tesla depois de ele ter reclamento de um evento da companhia do bilionário.

O homem mais rico do mundo já disse que era um independente registrado quando morava na Califórnia, o estado liberal que ele trocou pelo conservador Texas dizendo que o ambiente de negócios no berço do Vale do Silício se tornara inóspito.

Musk se descreveu como “politicamente moderado”, mas acrescentou: “Não significa que sou moderado em todos os assuntos”. Procurado pelo New York Times, não respondeu.

As preocupações manifestadas por Musk recentemente sobre como o Twitter atualmente censura conteúdos ecoam as de ativistas e políticos conservadores que argumentam que as empresas de mídia social não são bons árbitros do que é verdade e não deveriam se envolver em policiar o discurso.

Uma pessoa que trabalhou próxima ao empresário disse que uma crença firmemente arraigada de Musk é a de que, em uma democracia funcional, é direito de qualquer um dizer “qualquer coisa estúpida que queira”.

Essa pessoa, que falou anonimamente para não violar a confiança de Musk, acrescentou secamente: “O que ele ocasionalmente faz”.

Caso se torne o dono do Twitter, Musk promete abandonar o atual programa de monitoramento e censura de conteúdo. Os conservadores ficaram eufóricos.

— Elon Musk parece ser nossa última esperança — declarou Tucker Carlson, integrante da conservadora rede de TV Fox News.

Normalmente, as inclinações políticas de figuras públicas tão francas e ricas são fáceis de identificar nas doações para o financiamento de campanha. Mas as de Musk são insignificantes comparadas às de outros bilionários como Charles Koch e Peter Thiel, cujas doações apoiaram amplamente os republicanos conservadores, e George Soros, que doou centenas de milhões de dólares para causas liberais nos últimos anos.

Suas doações são distribuídas de maneira bastante equilibrada entre candidatos democratas e republicanos. Ele doou para figurões do Partido Democrata, incluindo Hillary Clinton e o ex-presidente Barack Obama, mas também assinou cheques para Kevin McCarthy, o líder republicano da Câmara, e para o Comitê Nacional Republicano.

Aqui, também, suas ações parecem refletir os movimentos de alguém que não está pensando ideologicamente, mas pragmaticamente.

Muitas de suas doações foram canalizadas para políticos em estados onde a Tesla tem operações de fabricação, como Texas e Califórnia. Ele deu tanto para o governador Greg Abbott, um republicano, quanto ao governador Gavin Newsom, um democrata.

Nesta segunda-feira, em sua última investida, Musk criticou o Conselho de Administração do Twitter depois que a empresa de mídia social adotou uma "pílula de veneno",  a fim de limitar a capacidade do dono da Tesla e da SpaceX de ampliar sua fatia na rede social.

Esta semana, o homem mais rico do mundo fez uma oferta de US$ 43 bilhões pela empresa.

“O salário do conselho será de US$ 0 se meu lance for bem-sucedido, então são US$ 3 milhões/ano economizados ali mesmo”, tuittou Musk em resposta à postagem de um usuário criticando o conselho.

Musk, um autoproclamado "absolutista da liberdade de expressão" que tem criticado as políticas do Twitter, não deu mais detalhes sobre o tuíte. Procurado pela agência Reuters, o Twitter não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.