Viúva de miliciano Adriano da Nóbrega tem segurança do estado
Companheira do ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, que foi morto na Bahia, conta com proteção de seis agentes da tropa de elite da Polícia Civil
Viúva do ex-capitão do Bope e miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega, Júlia Emília Mello Lotufo tem segurança 24 horas. O serviço não é prestado apenas por vigilantes da empresa privada do condomínio de luxo à beira-mar da Avenida Lúcio Costa, na Barra da Tijuca, onde ela mora.
Desde junho do ano passado, três equipes de policiais civis da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), grupo de elite da Polícia Civil, se revezam em carros da corporação que montam guarda na garagem do prédio de Júlia. A mulher de Adriano é ré em processo por lavagem de dinheiro e organização criminosa, que teria Adriano como chefe do bando, antes de ele ser morto na Bahia, em fevereiro de 2020.
Há dez meses, Júlia procurou a Polícia Civil, oferecendo-se para colaborar com as investigações de homicídios praticados por um grupo de matadores de aluguel ligado à contravenção, bando inclusive integrado por Adriano. Partiu da delegada Ana Paula da Costa Marques de Faria, chefe da Coordenadoria de Investigação de Agentes com Foro (Ciaf), cujo gabinete funciona no Ministério Público do Rio (MPRJ), levar a viúva do miliciano ao procurador-geral de Justiça, Luciano Mattos, a fim de fazer um acordo de colaboração premiada.
O reforço na segurança dela foi uma decisão da Secretaria Estadual de Polícia Civil, devido ao risco, à época, de algum atentado por conta da delação. Ela havia se comprometido a testemunhar sobre os crimes de que tomara conhecimento durante sua união estável com Adriano, apontado pelo MPRJ como chefe do Escritório do Crime, um grupo de matadores de aluguel.
A remuneração de um policial da Core, em valor bruto, é de cerca de R$ 10 mil, além de uma gratificação especial de R$ 1,5 mil, por ser uma tropa altamente especializada. Pelo menos seis policiais fazem a segurança por dia da viúva de Adriano, sem contar o custo diário com o combustível no deslocamento do carro da corporação, da sede na Cidade da Polícia, no Jacaré, até a Barra da Tijuca. O agente da Core é preparado para atuar no patrulhamento em favelas, fazer buscas em ambientes de confinamento, ser especializado em tiro tático, identificar artefatos explosivos, promover a segurança de autoridades e resgatar policiais em situação de risco. São apelidados de “falcões”, símbolo do grupo especial.
O acordo de delação premiada de Júlia começou a ser alinhavado, em junho, com as promotoras Simone Sibílio e Leticia Emile, que estavam à frente das investigações dos assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, em 14 de março de 2018. Em troca de informações sobre o mandante da morte da parlamentar e motivação do crime, Júlia pleiteava sair do país. A negociação provocou uma crise interna no Ministério Público, culminando com a saída das promotoras do caso, que alegaram “interferências externas”.
O promotor Luís Augusto Soares, que atuava na 1ª Vara Criminal Especializada, onde Júlia respondia por seus crimes, tentou intermediar a colaboração. No entanto, como ela apontou uma pessoa que tinha foro privilegiado em seu depoimento à promotoria, os anexos da delação foram enviados para a Procuradoria Geral da República (PGR), em Brasília. Já havia um processo contra o alvo indicado por ela lá, pelo mesmo fato. Por isso, a delação voltou para o MPRJ.
Desta vez, o caso foi para o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, coordenado pelo promotor Bruno Gangoni, substituto de Sibílio. Ao perceber que os dados fornecidos na colaboração da viúva do miliciano eram inconsistentes, sem provas e, em alguns casos, não eram sequer novidade para os promotores, a delação foi rejeitada.
Além disso, em sua pretensa colaboração, segundo o MPRJ, Júlia não assumia que passou a comandar os negócios ilícitos da quadrilha após a morte de Adriano, justamente em crimes a que ela responde na 1ª Vara Criminal Especializada da Capital.
A defesa de Júlia, ao desconfiar que o acordo não iria acontecer, ingressou em dezembro do ano passado com um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve a decisão anterior de prisão domiciliar, com o uso de tornozeleira eletrônica, como está até os dias atuais. Os advogados pediam não só a liberdade da ré, como a autorização para que ela fosse morar em Portugal.
Ao ser perguntada pelo GLOBO por que motivo mantinha a segurança da viúva, uma vez que a Justiça não prevê reforço na segurança da ré, a assessoria da Secretaria de Polícia Civil informou, por meio de nota, que, “como ela prestou depoimentos que denunciam o crime organizado, colocou a própria vida em risco”.
A corporação informou que “espera decisão judicial para definir se mantém a escolta, que, por enquanto, está mantida por precaução para que não seja cometido nenhum atentado”. No entanto, a secretaria “vai solicitar uma avaliação de risco para decidir sobre a manutenção ou não da escolta”.
O jornal Extra tentou contato com a defesa de Júlia, mas não houve retorno. O nome de Adriano ganhou notoriedade durante a Operação Intocáveis, do MPRJ, em janeiro de 2019, quando veio à tona que o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) havia empregado Raimunda Veras Magalhães e Danielle Mendonça da Costa, respectivamente mãe e a ex-mulher do miliciano, em seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Procurado, o senador não quis se manifestar.