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Fed, o banco central dos EUA, deve elevar juros hoje; veja como isso afeta o planeta e o Brasil

Na chamada "super quarta", BC do Brasil também deve elevar a Selic, mas analistas avaliam que não será suficiente para evitar perda de capitais para mercado americano

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O Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, deve dar, nesta quarta-feira, um passo que vai mexer não só com a maior economia do planeta, mas com a da maioria dos outros países.

O Fed deve elevar em 0,5 ponto percentual a taxa de juros americana. Será a segunda elevação desde 2018. Em março, o Fed já elevou as taxas no país em 0,25 ponto percentual em março, provocando repercussões financeiras globais. 

Nesta, que é chamada pelos investidores de "super quarta", o Banco Central do Brasil também decide a elevação da taxa básica de juros (Selic). O país é um dos mais afetados pela alta dos juros nos EUA, e os efeitos já são sentidos na Bolsa de São Paulo, a B3. Para analistas, será difícil evitar a perda de capitais para os EUA.

Em abril, pela primeira vez no ano, o fluxo de investimentos estrangeiros para a Bolsa brasileira ficou negativo, indicando a fuga de capitais do país com destino aos EUA, onde os títulos públicos americanos (chamados Treasuries), considerados os mais seguros do mundo, estão rendendo mais com a alta dos juros.

Para analistas, a intensidade do aperto monetário nos EUA deve ser o fator decisivo sobre a direção e a intensidade dos investimentos estrangeiros no Brasil, uma economia em desenvolvimento. 
 

Geralmente a alta dos juros nos EUA drena capitais que estão em países em desenvolvimento. O apetite ao risco cai diante de maior perspectiva de ganhos nos EUA. Soma-se a isso as crescentes incertezas na China, que enfrenta novos surtos de Covid com impacto na atividade econômica. 

— Os Treasuries de dez anos estão indo para patamares altos e ela tem o poder de refazer essas alocações globais de portfólio. O dólar fortalecendo lá fora e esse componente de dúvida sobre o crescimento global da China deixa as moedas emergentes mais suscetíveis a sofrer – observa o economista e sócio da Monte Bravo Investimentos Luciano Costa.

Nessa semana, o rendimento do título americano de dez anos, observado de perto pelos agentes de mercado, chegou próximo ao patamar de 3% ao ano, algo que não ocorria desde 2018. A maior procura pelos ativos de renda fixa americanos, que são mais seguros, indicam busca por proteção por parte dos investidores. 

— O mercado está muito sensível aos juros americanos. O risco é de ter uma reprecificação das curvas americanas, que leve a Treasuires a patamares muito acima de 3% — diz Costa.

Os Estados Unidos não são o único país do mundo com juros em alta para controlar a inflação. No Brasil, por exemplo, o mercado espera que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decida hoje elevar a Selic dos atuais 11,75% para 12,75%. 

O alvo é a inflação também em dois dígitos, mas o impacto certamente será sentido na atividade econômica, como nos investimentos, dificultando a retomada do crescimento da economia. 

Para Maurício Pedrosa, gestor da Arena Investimentos, os bancos centrais de todo o mundo estão em uma encruzilhada devido ao cenário global de inflação alta, mas crescimento desacelerando.

— Se eles apertarem a política monetária, podem contratar uma recessão. E se afrouxarem, podem alongar o ciclo de inflação, o que também traz problemas para a economia.

Diante desse cenário externo mais desafiador e um segundo semestre que promete instabilidade devido ao já conturbado processo eleitoral, a perspectiva é de ainda mais volatilidade no mercado financeiro do Brasil.

O gestor de ações da ARX Investimentos Alexandre Sant'Anna ressalta que nem mesmo o fato de o Brasil estar à frente em seu processo de alta dos juros para enfrentar a inflação (o que torna títulos brasileiros mais atraentes para investidores estrangeiros) é suficiente para blindar os ativos domésticos, por meio do diferencial de juros.

— O BC do Brasil tem indicado que está no fim do processo, mas o efeito financeiro dos Estados Unidos é muito grande — diz ele.

Para Maurício Pedrosa, da Arena, os problemas internos, que ficaram à margem do mercado nos primeiros meses do ano devem influenciar cada vez mais no mercado até as eleições. Ele ressalta o cenário fiscal ainda negativo e de inflação alta.

— O que vamos ver daqui para frente é uma tentativa para colocar mais luz na política econômica de cada candidato. Nós temos uma agenda robusta de reformas que precisará ser implementada e ainda está muito vago. Pelos próximos meses, vai subir ao palco a conduta da política econômica pelos possíveis presidentes da República. Está contratado volatilidade para frente pela discussão de temas e da dinâmica da nossa situação fiscal, que inspira cuidados — diz o analista.

Sobre a reunião do Fed nesta quarta-feira, o economista e sócio da Monte Bravo Investimentos Luciano Costa diz que o mercado ficará atento a sinalizações sobre o ritmo de alta dos juros, uma vez que o cronograma de redução do balanço do banco já está mais claro após a divulgação da ata do último encontro.

O Fed vai subir os juros como uma forma de retirar estímulos à recuperação da economia após a pandemia que provocaram uma onda inflacionária nos EUA. Para Costa, ainda é cedo dizer até que patamar o Fed levará os juros e se as taxas poderão ultrapassar o nível neutro, que hoje está na casa dos 2,5%, em termos nominais. 

Um aperto monetário realizado em um cenário econômico de bastante incerteza global, como o atual, deixa mais turva a linha que separa a taxa neutra daquela que já promove restrições à economia. 

Nesse contexto, os analistas acreditam que a autoridade monetária deve pesar os impactos de uma alta agressiva dos juros para a economia dos EUA (e consequentemente para as de outros países). Se exagerar na dose, pode prejudicar muito a atividade econômica. Até porque já há bancos e analistas que alertam para uma recessão na economia americana nos próximos anos.

— Ele (o Fed) sabe que tem que ir para o neutro, pois se não for, ele não gera a contração que precisa para desacelerar a economia. Não significa que não possa ter uma recessão, mas uma recessão por causa de política monetária não costuma ser tão profunda — diz Costa.