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Acesso ao aborto, direito frágil e desigual no mundo

Nos últimos 25 anos, mais de 50 países modificaram suas legislações para facilitar o acesso ao aborto

Protesto a favor do aborto nos EUA - Allison Dinner/Getty Images/AFP

Totalmente proibido em uma minoria de países, autorizado em outros com mais ou menos restrições, o acesso ao aborto segue sendo um direito muito desigual e frágil no mundo. 

Segundo a publicação digital Politico, os juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos se preparam para anular uma sentença histórica que reconhece há quase meio século o direito à interrupção voluntária da gravidez. 

Caso se confirme, os Estados Unidos voltariam à situação prévia a 1973, quando cada estado era livre para proibir ou autorizar esta prática.

Considerando as divisões sobre esta questão, uma metade dos estados, especialmente no sul e no centro mais conservadores e religiosos, podem ilegalizá-lo rapidamente. 

Acesso muito desigual
Nos últimos 25 anos, mais de 50 países modificaram suas legislações para facilitar o acesso ao aborto, reconhecendo seu rol essencial para a proteção da vida, da saúde e dos direitos fundamentais das mulheres, segundo a Anistia Internacional. 

No entanto, a prática segue proibida em quase 20 países, especialmente na África e na América Latina. 

El Salvador adotou em 1998 uma lei draconiana que proíbe a interrupção da gravidez em todas as circunstâncias, mesmo em casos de perigo para a saúde da mãe ou do feto e prevê penas de até cinco anos de prisão. As acusações também costumam incluir o delito de "homicídio agravado", que pode levar a até 50 anos de prisão. 

Na Europa, a ilegalização total é uma exceção: existe em Malta, com penas que vão de 18 meses a três anos de prisão e nos microestados de Andorra e do Vaticano. 

Em outros países, o aborto está submetido a condições extremamente restritivas. 

O procedimento é acessível unicamente em caso de perigo para a vida da mãe nos seguintes países: Costa do Marfim; Líbia; Uganda; Sudão do Sul; Iraque; Líbano; Afeganistão; Iêmen; Mianmar; Sri Lanka; Guatemala; Paraguai e Venezuela. 

No Brasil, o procedimento é muito limitado. Apenas em casos de estupro; risco para a mãe ou grave mal-formação do feto. 

Um direito por vezes recente
Em geral, são as mulheres da Europa, América do Norte e Oceania as que gozam de legislações mais liberais, muitas vezes, aprovadas muito recentemente. 

Na Irlanda, o aborto é legal somente desde 2018 após um referendo histórico que revogou a proibição constitucional da interrupção da gravidez. Também foi liberado em 2019 na Irlanda do Norte, a única parte do Reino Unido onde estava proibido, mas acessar o procedimento ainda é difícil. 

A Nova Zelândia não despenalizou o aborto até 2020. E na Austrália, Nova Gales do Sul foi o último estado do país a despenalizar o aborto em 2019, abolindo uma lei de 119 anos. 

Na Tailândia, a interrupção da gravidez foi descriminalizada em fevereiro de 2021 e agora pode ser praticada até a duodécima semana de ausência de menstruação. 

E também na Ásia, o mais alto tribunal da Coreia do Sul ordenou em 2019 a abolição da proibição de abortar ao considerá-la inconstitucional. 

Na África, o Benin se converteu em outubro de 2021 em um dos raros países a autorizar esta prática. 

Na América Latina, o direito ao aborto continua ganhando terreno. 

A Colômbia o legalizou até as 24 semanas de gestação sem importar o motivo. Pouco depois, o Chile decidiu, em 16 de março, integrar a despenalização do aborto no projeto da nova constituição. 

No México, em setembro de 2021, uma sentença histórica da Suprema Corte declarou inconstitucional a proibição do aborto.

Marcha ré
Porém, em outros lugares, este direito dá passos para trás. 

Honduras, que proibia está prática mesmo nos casos de estupro, incesto, mal-formação grave do feto e perigo vital para a mãe, aprovou em janeiro de 2021 uma reforma constitucional que endurece mais a legislação. 

O artigo 67 da Constituição revisado estabelece que toda interrupção de gravidez "pela mãe ou por terceiro" é considerada "proibida e ilegal", e acrescenta que esta cláusula "somente poderá ser reformada por um maioria de 75% dos membros do Congresso Nacional".

Na Polônia, o Tribunal Constitucional, respaldado pelo governo populista de ultra direita, baniu, em outubro de 2020, a interrupção voluntária da gravidez em caso de mal-formação grave do feto. Agora apenas é permitida em caso de estupro, incesto ou se a vida da mãe estiver em perigo.