"Yes, nós temos Coca-Cola", de Frederico Toscano, trata do encontro cultural e gastrô entre EUA e PE
Obra de Frederico Toscano foi lançada pela Cepe e aborda o entrelaçamento das culturas estadunidense e pernambucana
Para além de canapés, cachorros-quentes e coquetéis, a cultura alimentar americana é farta em vender bem o seu próprio "peixe" e popularizar sua abundância de ideias, conceitos e sabores. Como diria o escritor, gastrônomo e historiador pernambucano Frederico Toscano, o Brasil foi (é) "(...) bombardeado agressivamente por essa cultura americana industrializada".
Fartura ou escassez?
Não à toa, a recebemos de braços (e paladares) abertos no contraponto da escassez que se avizinhava pelas bandas de cá, do Recife, inclusive, a partir da década de 1930 até os anos de 1960.
E foi esse o recorte de Toscano para lançar "Yes, nós temos Coca-Cola A fartura dos Estados Unidos e a guerra contra a fome no Nordeste", livro da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), que traz narrativa histórica mesclada aos conhecimentos culinários do autor mestre e doutor em História e bacharel em Gastronomia, títulos que impulsionaram seu desejo de escrever sobre aspectos culturais em meio à sua percepção sobre alimentação.
"Muito cedo descobri que não queria ser chef, queria contar história e fui fazer o curso para juntar tudo", ressaltou ele em conversa com a Folha de Pernambuco. Ocasião em que falou sobre o processo de construção do livro que sucedeu a "À Francesa: a belle époque do comer e do beber no Recife" (Cepe, 2014), cujo mote era trazer à tona a influência cultural da França do início do século XX na capital pernambucana.
Industrialização agressiva
"Somos um povo colonizado culturalmente, mas isso é uma questão histórica, complexa. Na Semana de Arte em 1922, em São Paulo, foi feito um primeiro grande esforço para que a produção cultural se voltasse para cá, com fontes emocionais próprias, numa tentativa de reconhecer a cultura local. Mas a industrialização americana é forte e agressiva, cria produtos atraentes. Acabamos adotando e naturalizando a cultura postiça (da entrada dos EUA nos costumes brasileiros)", descreve o autor, que enveredou por fontes diversas para dar robustez à pesquisa.
"Jornais e revistas, do Brasil, dos EUA e do Recife. Poesias, fotos, livros, teses de doutorado e artigos científicos também fizeram parte, além de seis meses pesquisando in loco, quando peguei muita coisa, como relatórios da Segunda Guerra. A música foi outra fonte de importância, com letras de Luiz Gonzaga e dos Novos Baianos, por exemplo", conta ele.
Coca-Cola: um fetiche
A ideia de assistir ao faroeste dos longas americanos ao invés de "curtir" um filme nacional, também é assunto tratado por Toscano no livro, sob o reforço da qualidade da indústria americana em detrimento ao que era produzido no Brasil. Assim como o encantamento pela Coca-Cola ingerida por soldados norte-americanos direto do gargalo da garrafa, bebida predileta dos nascidos 'from Brazil' até os dias atuais.
"A Coca-Cola está também nos países socialistas, nós somos só mais um País a consumir", enaltece ele que também robustece o livro com a repercussão social dos costumes dos bufês à moda americana em que cada um se serve.
"Comecei a pesquisa com uma visão estreita e limitada a fast-foods, batatas fritas, hambúrgueres e eles nem entram no livro, já que vai até a década de 1960. Ao longo da produção, fui mudando porque os EUA são continentais como o Brasil, com culinária própria de cada região, estado, cidade, vilarejo. O sul dos Estados Unidos é meio Nordeste, com comida de 'sustância'. As pessoas lá comem tripa de porco e pratos que se assemelham à dobradinha, à feijoada. Eu quis contar sobre a introdução de novos hábitos, mas também sobre a comida de alma que faz parte da gastronomia americana".
Serviço
"Yes, nós temos Coca-Cola - A fartura dos Estados Unidos e a guerra contra a fome no Nordeste"
Autor: Frederico Toscano
Editora: Cepe
Preço: R$ 70 (impresso) e R$ 28 (e-book)