Um mergulho na fritura: confira informações gastronômicas e nutricionais dessa técnica culinária
A editoria Sabores convidou especialistas em gastronomia e nutrição para colaborar com informações importantes sobre o assunto
Presente nas diversas culturas gastronômicas dos quatro cantos do planeta, dos tempuras japoneses às batatas fritas, a fritura exige muita técnica culinária para atingir aquela crocância sequinha que todo mundo adora. Apesar de ter seu consumo desaconselhado por nutricionistas e profissionais de saúde, existem caminhos para a redução de danos como a escolha do óleo ou a complementação nutricional com alimentos antioxidantes. A editoria Sabores convidou especialistas em gastronomia e nutrição para colaborar com informações importantes sobre o assunto.
Existem dois tipos básicos de fritura, a chamadas frituras rasas ou superficiais - feitas com uma pequena quantidade de óleo ou gordura em uma frigideira - e as frituras por imersão, que consistem em mergulhar o alimento em uma grande quantidade de óleo em alta temperatura. Em ambas as técnicas é preciso estar atento a diversos fatores, como ponto de fumaça, temperatura, técnicas de empanamento, entre outros. Um dos objetivos que a fritura pretende atingir é aquela cor dourada do alimento, que surge graças a um fenômeno chamado de reação de Maillard, que também acontece em assados ou mesmo na feitura de um caramelo ou na torra do grão do café. É quando um aminoácido ou proteína e um carboidrato redutor reagem dando sabor, odor e o aspecto dourado aos alimentos.
Ponto de fumaça
É a temperatura a partir da qual o óleo passa a oxidar, se decompor em ácidos graxos livres, trazendo malefícios à saúde. “Ponto de fumaça é quando o óleo começa a queimar, formar fumaça e ele começa a se degradar. É nessa degradação quando ele altera drasticamente a sua estrutura molecular com a elevação da temperatura. Nessa alteração, o óleo gera compostos carcinogênicos que podem trazer doenças”, explica o professor de Gastronomia Robson Lustosa. Alguns outros fatores podem acelerar o ponto de fumaça, como o desprendimento de pedaços do empanamento na hora da imersão, por isso é indicado sempre filtrar o óleo e trocá-lo com frequência, pois ele escurece com o tempo. (Confira o ponto de fumaça de diversos tipos de óleos e gorduras, no infográfico abaixo).
Quando esse ponto de fumaça é ultrapassado, acontece a transformação de algumas substâncias boas que têm nos óleos em substâncias ruins, por exemplo, o aparecimento da acroleína que é uma substância tóxica e cancerígena. A nutricionista Mari Domicio sugere que o consumo desses alimentos seja acompanhados de outros grupos de alimentos. “ É fritinho, gostosinho, crocante, mas contém substâncias que oxidam o nosso corpo. Então precisamos colocar uma alimentação antioxidante para metabolizar essa gordura. Eu indico sempre um chá de boldo, uma alcachofra, que vai auxiliar no aumento da bile, a substancia que auxilia na digestão de gordura”, orienta.
Empanamento e temperatura ideal
Algumas dicas valiosas usadas por chefs de cozinha podem garantir uma fritura mais crocante e sequinha. O chef Renan Yamashita, especializado em gastronomia oriental, por exemplo, indica a farinha panko em substituição à nossa farinha de rosca. Após empanar, ele também sugere que seja respeitado um descanso de pelo menos meia hora, para evitar que o empanado se desmanche.
Além disso, a temperatura do óleo é de fundamental importância para uma boa fritura, tanto para atingir maior crocância quanto para evitar o ponto de fumaça. Para isso, Renan orienta a aquisição de um termômetro culinário, que pode ser obtido com baixo custo no comércio. É importante que a ponta desse termômetro não toque o fundo da panela e fique no interior do líquido, para evitar uma aferição errada da temperatura. Em geral, a temperatura geralmente utilizada é entre 175º e 180º, mas esse valor vai depender do óleo utilizado e do tipo de alimento e fritura que está sendo feita.
“A temperatura de fritura depende do tipo de alimento que se está fritando. A temperatura média é 180º, mas existem temperaturas distintas, que podem variar. Quanto maior a temperatura, menos o tempo de cozimento. A crocância do alimento tem relação direta com a quantidade de água do alimento e quanto dessa água ele consegue perder durante o cozimento. É um processo de desidratação”, explica Lustosa.
Tipos de óleo e de fritura
O óleo mais utilizado em frituras nos restaurantes é o óleo de palma. Entre as suas vantagens está o custo mais baixo e o maior ponto de fumaça. Contudo, adverte a nutricionista, esse tipo de óleo também tem muita gordura saturada e pode aumenta o colesterol, por isso, é bom evitar consumi-lo em excesso. “Já o óleo de coco tem muita gordura saturada, que é a gordura ruim, mas ele também tem o Triglicerídeo de Cadeia Média (TCM), que é uma gordura fantástica que não passa pelo metabolismo do fígado e vai direto ser adsorvida nas células do intestino”, sugere Mari Domicio, que desaconselha o consumo de outros óleos como girassol, canola e soja.
Hoje, a tecnologia permite que a fritura seja feita com pouca ou nenhuma quantidade de óleo. Um bom exemplo disso é a Air Fry, utensílio que se popularizou nos últimos anos. O professor Robson Lustosa não vê problemas no uso do equipamento. “A tendência é que possamos evoluir. Se não fosse assim, a gente condenaria o espremedor e continuaríamos amassando batata com o garfo e não aceitaríamos mais o triturador de alimentos ou o mixer. Claro, cada equipamento desse vai depender do tipo de alimento utilizado e para cada um desses alimentos trará resultados diferentes”, pondera.
Confitar x fritar
Apesar de serem duas técnicas culinárias que utilizam óleo, a confitagem (ou confit) e a fritura buscam resultados diferentes. Na primeira, o alimento imerso no azeite cozinha a baixa temperatura. A água dentro do alimento fica isolada, pois não mistura com o azeite, e isso provoca o processo de cozimento lento. Já na fritura, há um grande choque térmico que provoca uma reação bioquímica brusca.
“Quando a gente joga o alimento em um óleo de fritura, que estava na temperatura ambiente de 24, 25º C, em um óleo a 180º C, isso é violentíssimo. Ele abre fissuras no alimento. Por isso que batata frita e muitos alimentos absorvem óleo, pois criam essas microfissuras. Do mesmo jeito que o óleo penetra, a água se desprende e isso altera a capacidade de fritura do óleo, pois ele começa a cozinhar. Nesses casos, o óleo fica ‘espumificando’, ele faz espuma. Que é diferente da espuma ligeira e rápida que aparece quando jogamos o alimento e logo desaparecem”, explica Robson Lustosa.
Crocância x Transição vítrea
Você já deve ter percebido que com o tempo a crocância dos alimentos fritos se esvai. A explicação para isso está em um fenômeno chamado transição vítrea. “A fritura não vai ficar eternamente crocante, porque a crocância depende da temperatura e da umidade externa do ambiente. Um alimento que eu faço crocante em Recife pode não ser macio do mesmo jeito, se eu mandar esse alimento para a Amazônia ou para Brasília e São Paulo. Existe uma relação importantíssima entre a composição de água do alimento e da umidade, temperatura da gordura e também do ambiente externo”, detalha o professor de gastronomia.