Luto

Paulo Diniz: mesmo distante dos palcos, pernambucano continuava compondo

Velório e enterro do cantor e compositor serão realizados nesta quinta-feira (23)

Paulo Diniz, cantor e compositor - Max Levay/Divulgação

A distância dos holofotes nas últimas décadas não apagou a relevância musical de Paulo Diniz, que faleceu na última quarta-feira (22), no Recife, aos 82 anos. Do samba-rock ao soul, passeando entre canções de protesto e letras românticas, o cantor e compositor pernambucano deixa sua marca em canções de sucesso como “Pingos de Amor”, de 1971, regravada na voz de Paula Toller, da banda Kid Abelha, em 2000.

Para o jornalista José Teles, que planejava escrever a biografia do músico, Diniz era um artista a ser redescoberto pelas novas gerações. “Depois que ele voltou a viver no Recife e adoeceu, foi sumindo do eixo Rio-São Paulo. Ele acabou ficando com a obra escondida. Tanto que a maioria dos seus discos está fora de catálogo”, aponta.

Nos últimos anos, Diniz vivia recluso em seu apartamento, no bairro de Boa Viagem. Segundo Saulo Aleixo, que administrava as redes sociais do artista, ele saia de casa apenas para as sessões de hemodiálise, que realizava três vezes por semana. “A gente se encontrava pouco, por causa da Covid, mas trocávamos muitas ideias", contou o produtor musical. O músico faleceu em sua residência, por volta das 7h, por causas naturais. Restritos aos familiares e amigos, o velório e o sepultamento ocorrem nesta quinta-feira (23).
 

Natural de Pesqueira, no Agreste de Pernambuco, Paulo Diniz iniciou a carreira como locutor de rádio. Em 1966, vivendo no Rio de Janeiro, gravou sua primeira canção, o iê-iê-iê “O Chorão”, que surfou na onda da Jovem Guarda.

O sucesso nacional veio mesmo em 1970, quando lançou “Quero Voltar pra Bahia”, composta com o baiano Odibar - parceiro também em “Pingos de Amor”. A canção se tornou um símbolo contra a ditadura militar, já que era inspirada nos textos publicados por Caetano Veloso no jornal “O Pasquim” durante o seu exílio em Londres.

Gravado por nomes como Clara Nunes, Emílio Santiago e Simone, Diniz emplacou ainda outros sucessos nos anos 1970, como "Canoeiro", "Vou-me Embora" e "Um Chope Para Distrair". Ele também é conhecido por ter musicado poemas de autores famosos, como “Vou-me Embora pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira, e “José”, de Carlos Drummond de Andrade. As complicações de saúde causadas pela esquistossomose, no entanto, foram afastando o artista gradativamente dos palcos.  

Apesar da carreira em pausa, o interesse pela obra de Diniz não deixou de existir. O pernambucano chegou aos 80 anos, em 2020, com uma série de projetos em sua homenagem, que acabaram sendo interrompidos em função da pandemia. Um deles é o documentário “Paulo Diniz: No Oco do Mundo”, dirigido por Max Levay, que busca financiamento para ser finalizado.  

O filme começou a ser desenvolvido em 2019, quando o cineasta entrevistou o músico e outros artistas ligados a ele, como Zeca Baleiro e Caetano. No mesmo ano, Max conseguiu levar Diniz a um estúdio, para gravar a inédita “A Música da Minha Vida”, em parceria com Jam da Silva. “Mesmo debilitado, Paulo estava em pleno processo criativo. Com mais de 80 anos, ele seguia compondo sempre. Nunca o ouvi falar de frustrações, somente de alegrias”, compartilha.

A cantora Cristina Amaral também desejava homenagear ainda em vida o ídolo com um disco de regravações. Conseguiu que ele acompanhasse, pelo menos, o lançamento de sua versão de “Pingos de Amor”, lançada com videoclipe no final de maio. “O público nunca esqueceu dele. Quando canto essa música, as pessoas enlouquecem. A doença o afastou dos palcos, mas na vida e nas histórias de tanta gente ele continuou presente", defende.

O petrolinense Zé Manoel também prestaria o seu tributo a Diniz com um show em São Paulo, que acabou adiado em função da pandemia. “A obra dele é extremamente conhecida, mas muita gente não reconhece o seu nome. Infelizmente, é mais um dos artistas pretos brasileiros que não tiveram o devido reconhecimento em vida”, lamenta.